Cada vez mais os conceitos de educação e cultura estão se distanciando, alertou o escritor Alcione Araújo em palestra no auditório do RDC, nesta quarta-fera. O dramaturgo criticou o modelo de educação e apontou as três bombas que produziram aquele afastamento. Uma literal, a bomba atômica de Hiroshima, e duas simbólicas, mas, segundo ele, igualmente devastadoras: o avanço da indústria do entretenimento no Brasil e a formação das metrólopes. O autor ressaltou também a importância de se valorizar o saber como algo para a vida real: “O saber só é útil quando é o saber para a vida”, filosofou.
Parte do ciclo Jornada Educação Século XXI, a palestra Artes, leitura, educação e cultura para um país pensar presente, passado e futuro reuniu cerca de 80 educadores, a maioria da rede pública de ensino. Eles ouviram atentamente Araújo disparar as três bombas que, na opinião dele, modificaram a estrutura educacional brasileira. A primeira revolução, lembrou o escritor, decorreu da explosão da bomba atômica, em Hiroshima, na Segunda Guerra. Um dos efeitos menos visíveis foi, segundo o palestrante, a mudança de referência da matriz educacional brasileira, do modelo europeu para o americano. Voltou-se, principalmente, à formação de profissionais. Houve uma desvalorização das ciências humanas e os alunos passaram a serem "adestrados em vez de estimulados a pensar".
A segunda bomba foi o avanço da indústria do entretenimento no Brasil. A televisão, segundo Araújo, conquistou um lugar hegemônico nos lares brasileiros. As culturas populares estão perdendo espaço para a cultura de massa, observou ele. A cultura está se desligando das práticas, do cotidiano das pessoas. Uma cultura oferecida “sem distinção e respeito”.
– A TV colocou-nos de joelho. Hoje discute-se apenas o que está na mídia, sobretudo o que passa na TV. Fala-se a mesma coisa aqui, no Rio Grande do Sul, no Amazonas. A cultura local se perdeu –explicou.
Já a terceira bomba é um mal que aflige tanto o aluno quanto o professor. A alta concentração populacional das metrópoles fizeram-nos reféns das distâncias e do tempo, observou o escritor. Vamos menos ao teatro, ao cinema, ao museu, e distanciamo-nos cada vez mais da vida cultural. Assim falou Araújo.
Apesar de dissociar artes, leitura, educação e cultura por motivos didáticos, o autor defendeu a ideia de que tais conceitos não existem de forma independente:
– Considerar a existência autônoma das coisas é cair num erro. Eu creio que essas ideias não são estanques. Tudo se interage – argumentou.
Para um país promover a integração plena e cultivar uma elite pensante, observou o escritor, é necessário que educação e cultura sejam conceitos que se assemelhem. Num país onde 62 milhões de pessoas estão inseridas no mundo da educação, é inadmissível que a venda de livros, as visitas a exposições e as idas ao teatro sejam tão “esquálidas”, acrescentou ele.
Para a plateia de educadoras, Araújo destacou também que a arte é "algo muito subjetivo" e, assim, é papel do professor permitir as múltiplas interpretações. Oferecer mecanismos que abram o horizonte do aluno para a percepção é mais importante do que simplesmente dar uma definição singela:
– A ação da arte é subjetiva, radicalmente pessoal. Cada um tem histórias individuais que condicionam a sua interptretação.
Assim como a arte, o exercício da leitura também está no campo do subjetivo. Para o dramaturgo, ler é "dar asas ao sensorial":
– A palavra é como um iceberg. A parte que vemos é a razão, é o comum a todos. Já o que está submerso é o subjetivo. A percepção estética é pessoal e vai depender da experiência acumulada de cada um – explicou.
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