Thais Albuquerque - aplicativo - Do Portal
27/10/2015Denunciar, sensibilizar, criticar e valorizar são palavras que definem os papéis do fotojornalismo. Morador do Complexo do Alemão desde os 4 anos de idade, o fotojornalista Bruno Itan destaca as belezas das periferias em suas fotos, com o objetivo de quebrar o estereótipo da favela associada a violência, tráfico e pobreza.
Bruno considera que cada foto deve ter um sentimento embutido: “O fotojornalismo ajuda a mostrar os sentimentos e ao mesmo tempo contribui na hora de fazer denúncias sobre os problemas urbanos. Se não houver sentimento e foco naquilo que está sendo retratado, você não cumpriu seu papel de fotógrafo”, afirmou Bruno, que compartilhou com os alunos de Comunicação a forma como reinventa o cotidiano nas favelas cariocas através de suas lentes, em palestra mediada pelo professor Leonel Aguiar e pela jornalista e pesquisadora Alice Baroni na PUC-Rio, na terça, 20 de outubro. Ele administra o projeto “Foto Clube Alemão”, que já inseriu mais de 100 pessoas no meio da fotografia. Um dos fotógrafos oficiais do governador Luiz Fernando Pezão, Bruno garante que nunca vai deixar o fotojornalismo nas favelas. Diz que fotografar periferias é complicado, principalmente para quem não conhece: “O Foto Clube Alemão recebe pessoas de todos os lugares, Leblon, Gávea, Madureira, Penha, e eu percebo a diferença entre as fotografias de quem mora e quem não mora na favela. Quem não mora procura retratar mais as pessoas, e não enxerga a possibilidade de fazer uma foto bonita de paisagem, por exemplo, como eu faço”.
Assista na íntegra à palestra com Bruno Itan
Alice, que pesquisa a imagem das favelas pela ótica do fotojornalismo em seu pós-doutorado no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da PUC-Rio e trabalha no portal Viva Favela, do Viva Rio, vê o projeto Foto Clube como uma forma de reconstruir a perspectiva de futuro desses jovens:
– A fotografia, a música e a arte trabalham a compreensão do jovem, a compreensão de si mesmo, um olhar para si e um olhar sobre o lugar onde se vive. É importante repensar sobre esse processo de marginalização que as comunidades do Rio vêm enfrentando há mais de um século.
Veja mais: Palestra com Alice Baroni
O fotojornalista e professor da PUC-Rio Paulo Rubens Fonseca destaca o envolvimento de Bruno no tema que aborda, lembrando o fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado – premiado, na semana passada, pela série: “Ianomâmi: a guerra de um povo entre a vida e a morte, uma saga amazônica”, publicada no jornal O Globo.
– Se existe uma tribo no meio da África que está sendo dizimada e ninguém vai noticiar isso, é lá que Sebastião vai exercer seu trabalho de fotógrafo, de modo a identificar essas pessoas invisíveis para o resto do mundo. Ele passa cinco meses com aquela população, migrando, andando no meio da mata com eles e comendo o que eles comem. É de uma grandeza humana até difícil de acreditar que alguém faça. E este rapaz, o Bruno Itan, comove por esse lado: ele se envolve de uma forma que ninguém é capaz de se envolver.
Também professor de fotojornalismo da PUC-Rio, Weiler Finamore ressalta o papel do fotojornalismo como instrumento de denúncia, e lembra que o olhar – e a fotografia – dão conta não da realidade como um todo, mas de um aspecto dela, lembrando as origens da fotografia:
– A fotografia tem o papel de retratar, de alguma forma, a verdade. A imagem é irrefutável principalmente quando ela surge. As linguagens da fotografia que surgem ao longo do século XX (publicitárias, poéticas, abstratas e jornalísticas) em um primeiro momento, estiveram muito distintas. No início deste século, o fotojornalismo incorporou todas essas linguagens anteriores. Como se ele se tornasse a representação máxima da fotografia já que, ao retratar a realidade, esses acessórios do foto-repórter fazem da fotografia quase uma formadora de opiniões críticas e contundentes. Críticas no sentido de promover outros olhares, já que é possível existirem vários aspectos de uma mesma realidade, e contundentes no sentido de falar uma verdade.
Alice acredita que os fotógrafos populares têm o papel fundamental de mostrar a fotografia como uma “ética do cuidado” capaz de reconhecer a dignidade e a integridade dos grupos marginalizados de forma mais humanizada: “O que a gente vê nas fotografias desde o estabelecimento do Morro da Providência, depois da Guerra de Canudos, constrói um discurso muito negativo que identifica a favela como um exclusivo espaço de violência além de uma associação tênue entre o morador da favela e os criminosos.” Ela acredita que projetos sociais como o “Foto Clube Alemão”, que Bruno criou para desviar jovens do tráfico, e já levou um dos integrantes a Madri para expor suas fotos, são fundamentais para ressignificar as periferias.
O olhar fotográfico e a capacidade de emocionar são dois outros aspectos indispensáveis em um fotojornalista, acrescenta Weiler: “Tirar uma foto que contenha um sentimento e uma história embutida capaz de unir, de forma universal, a maior quantidade de pessoas possível vale mais do que qualquer texto”. Como exemplo, o fotógrafo lembra a foto que chocou o mundo: a imagem do corpo de Aylan Kurdi, o menino sírio refugiado da guerra em seu país, na beira da praia na região de Bodrum. Weiler considera que, apesar de a imagem ser forte, o fotógrafo cumpriu o objetivo de todo fotojornalista: unir o mundo em um mesmo sentimento, independente de religião, cultura ou nacionalidade.
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