Caio Cidrini - Do Portal
28/09/2012Um pernambucano que cantava o sertão pelo Brasil inteiro; outro, carioca do morro de São Carlos que se tornou um dos ícones para a juventude dos anos 1970 e 1980. Gonzaga, de pai para filho, de Breno Silveira, que abriu o Festival do Rio , quinta-feira à noite, em exibição de gala no Odeon, revela os encontros e desencontros pelos quais passaram o Rei do Baião, Luiz Gonzaga, e seu filho Gonzaguinha. O quarto longa do diretor brasiliense, novamente com roteiro de Patrícia Andrade – a jornalista fez o roteiro de todos os filmes de Silveira, traz como Gonzagão, entre 27 e 50 anos, o sanfoneiro paulista Chambinho do Acordeon. Ele cumpre a sempre dfifícil tarefa de incorporar um mito com eficiência, decorrente, em parte, de deveres de casa como as aulas de história e de dança. "Este filme é uma vitória não só do cinema, mas da música popular brasileira", orgulha-se Chambinho. O versátil Júlio Andrade também reproduz, com competência e sutileza, a figura não menos carismática de Gonzaguinha. Nestas atuações dedicadas mora boa parte do mérito do filme, assistido pela equipe do Portal PUC-Rio na sessão para imprensa. Última esperança de uma produção nacional amealhar grande bilheteria em 2012, Gonzaga, de pai para filho estreia nos cinemas em 26 de outubro.
Silveira leva mais uma vez a música popular brasileira às telas. Depois do bem-sucedido Dois filhos de Francisco (2005) – cinebiografia da dupla Zezé di Camargo & Luciano – e do recente À beira da estrada(2012) – inspirado nas músicas de Roberto Carlos –, ele volta a trilhar o caminho de dois bambas da cultura nacional. Ao escutar a gravação das conversas entre pai e filho, gravadas por Gonzaguinha, o cineasta decidiu contar esta história. Além de aproveitar no filme trechos do áudio original, Breno Silveira também se inspiriou no livro Gonzaguinha e Gonzagão – uma história brasileira (Ediouro, 2006), de Regina Echeverria. Do roteiro à edição final, o projeto consumiu R$ 12 milhões, orçamento superior à média das produções nacionais.
O longa começa com a visita de Gonzaguinha ao pai em Exu, no sertão de Pernambuco, cidade natal de Luiz Gonzaga do Nascimento, no fim dos anos 1970. A aproximação decorria da dificuldade financeira pela qual passava Gonzagão. Apesar da relação conflituosa, eles se dispõem a largar o rancor de outrora e buscam a compreensão para finalmente se conhecerem. A narrativa, construída em cima destes diálogos gravados, intercala os diálogos com períodos que retratam incertezas e glórias, esperanças e desesperanças, desde a infância do Rei do Baião até o sucesso do filho.
A riqueza documental de fotos e vídeos originais – inclusive da única turnê juntos, em 1981 – e a trilha emblemática temperam as passagens e ajudam o espectador a mergulhar mundo tão particular e, ao mesmo tempo, tão universal. As histórias contadas por Luiz Gonzaga revelam a perturbação que a música, a mesma que consagrou os dois, causou na vida de ambos. O pai deixa o menino no morro para ser criado pelos padrinhos para tocar pelo Brasil e "integrar as regiões". Enquanto era amado por milhões de brasileiros, Gonzaga pagava a fatura de uma dura relação com o filho, que vivia seu deserto afetivo à espera de uma convivência mais estável com o pai.
Fiel às referências históricas e musicais, o novo filme de Breno Silveira serve, é claro, um repertório musical panorâmico dos dois virtuoses seperados pela vida e pelos estilos. Mas, para saboreá-lo, não é necessário ser um fã fervoroso de um ou de outro. Até porque o diretor mostra-se igualmente fiel a uma partitura que lhe rendeu prestígio e audiência em obras anteriores, marcada, sobretudo, pela emoção regada a brasilidade. No entanto, Silveira parece ter deixado de lado aspectos sociais, como a batalha para melhorar a vida de Dois filhos de Francisco e a relação de amor princesa-plebeu de Era uma vez (2008), para mergulhar em questões mais íntimas. Em Gonzaga – de pai para filho, ele investe na toada dos conflitos e reencontros de pai e filho separados e unidos pela mesma paixão: a música.
"Chico – Artista brasileiro": um filme pleno e encantador
Quartinho dos fundos sob um olhar crítico e bem-humorado
'Jia Zhangke': um documentário original e afetuoso
Irmã Dulce: drama exemplar de uma vida santa, reta e generosa