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Rio de Janeiro, 26 de dezembro de 2024


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A herança do anjo pornográfico

Júlia Zaremba - Do Portal

11/09/2012

Eduardo RibeiroComo parte das comemorações do centenário de Nelson Rodrigues, Nelson Rodrigues Filho e Crica Rodrigues, filho e neta do dramaturgo, vieram à universidade nesta segunda-feira, 10, compartilhar com os alunos parte de sua vida e obra. Promovida pela Cátedra da Unesco de Leitura, a conversa foi conduzida pelo professor Ricardo Oiticica. Professor e pesquisador com mestrado na obra rodriguiana, ele iniciou ontem o minicurso “O canalha A4”, sobre o escritor.

A plateia, em sua maioria alunos de letras, ouviu atenta aos entrevistados, que lembraram passagens da vida do autor, como o período da ditadura militar. Anticomunista, o dramaturgo era próximo de militares no poder. Mas Nelsinho revelou que o pai rompeu com o regime ao saber que o filho foi torturado.

– Ele não era da direita, era conservador. Era contra a esquerda da forma que se colocava. Mas, ao descobrir que eu, seu filho, tinha sido preso e torturado, seu mundo caiu, e o apoio a Médici deixou de existir – relatou Nelsinho.

Segundo o diretor teatral, Nelson era ufanista, acreditava que o país precisava conhecer um grande homem que fizesse dele o que merecia ser. Era a favor da liberdade, e foi um dos autores mais censurados do país. As obras do “teatro desagradável”, como ele próprio chamava, eram classificadas por ele como “pestilentas, fétidas, capazes, por si sós, de produzir o tifo e a malária na plateia”. O humor estava sempre presente nelas, caracterizando uma forma muito especial de se comunicar com o público.

Eduardo RibeiroA atriz Crica Rodrigues, que nasceu no mesmo dia em que o avô, no dia 27 de agosto de 1979 (um ano antes da morte de Nelson, em dezembro de 1980), comentou algumas das mais famosas peças de Nelson. Viúva porém honesta, primeira peça em que atuou como ator, foi muito criticada por apresentar temas polêmicos como o aborto. A atuação “canastrona” do escritor também foi bastante recriminada.

– Mas ele acreditava que a graça estava em ser patético e ridículo – defendeu Crica.

Quando questionada se o dramaturgo era namorador, Crica teve que concordar, mas foi Nelsinho quem ressaltou a visão romântica do pai:

– Ele acreditava na força do amor, que era tema recorrente em sua obra.

Dentre suas mais famosas citações sobre o amor, há frases como “Amar é ser fiel a quem nos trai”. Mas não só por belas metáforas sua carreira foi marcada. Uma das mais polêmicas, “Toda mulher gosta de apanhar”, é muito discutida e lembrada até hoje.

Nelsinho observou que “o velho” era uma parabólica, uma esponja de seu tempo. Lembrou das conversas maravilhosas, das vezes em que recebeu a visita do pai na cadeia, quando os outros detentos costumavam ficar em volta dele.

– Consegui, tendo diferenças homéricas com o velho, que o nosso amor fosse crescendo até a morte dele - definiu Nelsinho, que está escrevendo um livro sobre o pai: Nelson Rodrigues: pai e filho.

Nelsinho e Crica organizaram ao longo dos últimos dois anos uma série em comemoração ao centenário. A exposição Nelson Brasil Rodrigues – 100 anos do anjo pornográfico, no Teatro Glauce Rocha, fica em cartaz até o dia 30 de dezembro. O Festival A Gosto de Nelson, realizado pela Funarte, aconteceu do dia 1 ao dia 31 de agosto. Todas as 17 peças do dramaturgo foram montadas, com a participação de 11 estados brasileiros.

O curso do professor Ricardo Oiticica será dividido em quatro aulas. Os temas serão o Tarado: pelo buraco da fechadura; o Fanático: tricolor como eu, doente como eu; o Reacionário: a abominável encarnação da direita; e O Bobo da Corte: as coisas que precisam ser ditas. Será nas segundas-feiras, dias 10, 17 e 24 de setembro e 1 de outubro, das 17h às 20h. Interessados podem se informar ou se inscrever pelos telefones (21)3527-1960 ou (21) 3527-2087. O valor é de R$ 150.