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Rio de Janeiro, 26 de dezembro de 2024


Crítica de Cinema

"Pina": Wenders encanta com união entre dança e cinema

Miguel Pereira * - Do Portal

03/04/2012

Divulgação

Uma feliz união entre dança e cinema é o que Win Wenders nos proporciona em seu último trabalho, realizado em homenagem a Pina Bausch, a revolucionária coreógrafa alemã, falecida em 30 de junho de 2009, de câncer. O cuidado estético é a principal preocupação deste inventor de imagens incomuns. Win Wenders utilizou, de modo esplêndido, os recursos do cinema contemporâneo, que, na maioria das vezes, são apenas efeitos especiais e não elementos da proposta narrativa. A sua relação com essas tecnologias é de construção estética e não de uso meramente espetacular.

Os recortes da imagem funcionam como uma visão privilegiada da cena e uma aproximação que pulsa no coração do espectador. Entramos no movimento e na emoção vivida pelos bailarinos que interpretam seus papeis à perfeição. Cada passo e cada gesto são expressão do sentimento humano em ato presente. A pedagogia de Pina Bausch é mostrada como um método especial que consegue imprimir segurança, beleza e ritmo corporal aos seus bailarinos. Algumas falas, em som off, dão um clima evocativo de um relacionamento à distância, proporcionado pela ausência da mestra e as lembranças que recompõem o clima vivido.

A integração entre os espaços cênicos, a música, os ambientes naturais e a presença da dança e do movimento compõe um conjunto do equilíbrio que se espera de uma obra de arte, independente das técnicas utilizadas. As cenas exteriores da cidade de Wuppertal, onde fica o Tanztheatre de Pina Bausch, realizam uma perfeita integração de espírito entre a vida cotidiana e a observação apurada da beleza que nos circunda quando a ela estamos atentos.

Do menor gesto pode vir a poesia, como já nos disseram tantos poetas, como Adélia Prado, por exemplo. Se um filme é puro movimento, e essa é a sua essência, o cinema de Win Wenders, mostrado em Pina, nos acrescenta outras dimensões que fixam o sentido das imagens. A imagem transformada em ponto fixo, pelo flash da máquina fotográfica, ou o sentimento expresso nos primeiros planos também fixos dos bailarinos que em voz off relembram os momentos vividos com Pina, são uma espécie de contraponto ao movimento que atravessa toda a narrativa de Wenders. Não apenas os números memoráveis das coreografias de Pina Bausch, como "A Sagração da Primavera", de Igor Stravinsky, mas performances individuais dos bailarinos e seus pas de deux, incluindo aí os números especialmente feitos para a câmera de Win Wenders, dão ao filme momentos de um inesquecível espetáculo que faz do ballet, puro cinema.

Sem deixar de ser o que cada arte é, a ilusão da imagem amplia o sentido do movimento e nos coloca no centro da ação representada pela dança. Foi por isso que Wins Wenders fez uso da técnica do 3D, aqui aplicada de forma a estender e alargar o espaço e o tempo, aomesmo tempo em que nos insere numa experiência sensorial nova. "Pina" é, assim, um filme de homenagem a uma grande criadora e ao mesmo tempo um delírio para os nossos olhos e ouvidos. É uma experiência inesquecível.

* Miguel Pereira é professor da PUC-Rio e crítico de cinema.