Miguel Pereira* - Do Portal
12/09/2011Seria o homem do futuro diferente do homem do presente, caso pudesse voltar ao passado? É uma indagação que só os delírios da imaginação podem se aventurar a responder. É um pouco desse exercício que Cláudio Torres se atreveu a colocar na forma da imagem em movimento. Desde que o cinema existe, já se contaram muitas histórias que tinham esse eixo como desafio. Algumas se tornaram uma espécie de cults de grande sucesso como De volta para o futuro, de Robert Zemeckis, de 1985. Portanto, a ousadia de Cláudio Torres não é assim uma grande novidade nesse tipo de narrativa. Mas, ela chega dentro de um momento bastante oportuno da cinematografia brasileira. É de produtos assim que a chamada conquista de grande público parece precisar. Uma história romântica, bem conduzida, e com alguma dose de ironia com relação a alguns valores que vigoram atualmente, além de um certo cinismo que se observa na vida social contemporânea do nosso país.
Tipos característicos estão representados no filme de modo a fazerem conexões com a prática cotidiana. Não são propriamente vilões e mocinhos. Mas, nacos de comportamentos que podem estar numa única personalidade. Essa talvez seja a mais curiosa invenção de Cláudio Torres: materializar os vários eus que todos somos. O professor de física, que vive à mingua com os baixos salários de uma universidade particular, é o mesmo gênio que constrói um acelerador de partículas capaz de materializar e desmaterializar o tempo e o espaço. A partir dessa convenção, a sua história pode tudo, sem muita preocupação para convencer o espectador. O sinal já está dado, e, as idas e vindas, assim como os efeitos visuais, tornam-se aceitáveis como fatos de imaginações delirantes. Riquezas e fortunas, conseguidas com uma espécie de mágicas da física do professor João, são subtraídas ou concedidas ao sabor de uma história controlada por leves críticas ao culto do dinheiro, do sucesso, e da corrupção em oposição ao verdadeiro amor. Muitas vezes divertida, esta história acaba levando o espectador a embarcar nela sem perceber algumas de suas sutilezas que vão além do mero divertimento.
É evidente que O homem do futuro é também uma boa ocasião para que seu elenco exiba talento e capacidade histriônica, com óbvio destaque especial para Wagner Moura nos vários papéis que faz do mesmo João. Mas, o conjunto das interpretações merece ser registrado como afinado ao todo e num tom adequado, saudando o retorno à cena de um dos melhores atores brasileiros, Rogério Froes, no mínimo papel de um juiz corrupto.
* O jornalista Miguel Pereira é professor da PUC-Rio e crítico de cinema.
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