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Rio de Janeiro, 22 de dezembro de 2024


País

Craques do direito também buscam título internacional

Caio Lima - Do Portal

09/06/2011

Arte: Carolina Bastos

Longe da badalação dos gramados e da convocação para a Copa América, um grupo de estudantes vive expectativa semelhante para a disputa de um torneio internacional. Eles não correm, não marcam gols, tampouco ouvem os gritos da galera, mas, como os craques da bola, também sonham com o título de campeão do mundo. Enquanto Neymar e companhia começam a afinar as jogadas para o Mundial do Brasil, em 2014, alunos da PUC-Rio iniciam a igualmente dura preparação para o  Willen C. Vis International Commercial Arbitration Moot, a mais importante competição na área de arbitragem e comércio internacional. Disputada anualmente em Viena, reúne estudantes de mais de 250 universidades e 60 países.

Em fase de seleção, o time é conhecido como Geadici (Grupo de Estudos em Arbitragem e Direito do Comércio Internacional da PUC-Rio). Até oito vagas estão disponíveis, mas o grupo reserva o direito de não preenchê-las todas, neste início de preparação. Uma prevenção para o caso de os candidatos não corresponderem às exigências. Outra tática é a pluralidade: formar uma equipe com integrantes de diferentes perfis, cujas competências se completariam e possibilitariam um melhor rendimento. (Seria diferente no futebol?)

– Somos um grupo de elite. Então, estamos atrás de gente boa. Estudantes de períodos e histórias de vida diferentes, que já estagiam ou não, para manter uma pluralidade – explica o coordenador-acadêmico do Geadici, Bruno Barreto –  Queremos, sobretudo, alunos com potencial para raciocinar juridicamente.

A meta do "técnico" Barreto e sua turma é superar o desempenho da edição passada do torneio, na qual a equipe da PUC-Rio ficou entre as 64 melhores. Não é pouco. Embora o grito de campeão tivesse ficado para depois, o Geadici desbancou insitituições renomadas em direito.

Essa Copa do Mundo da arbitragem e do comércio internacional chega à 19ª edição. É composta, basicamente, de duas etapas: escrita e oral. A primeira começa em outubro, quando a organização do torneio (membros da Universidade de Pace, nos Estados Unidos) libera um caso fictício (sempre envolvendo as convenções das Nações Unidas para contratos de compra e venda em Direito Internacional). Cada universidade elabora memorandos – espécie de alegações finais – divididos em duas partes, uma pelo lado do autor e outra pelo lado do réu. Em dezembro, cada grupo recebe um memorando do autor do processo, elaborado por outra universidade. Cada instituição tem cerca de um mês para sustentar uma resposta como réu e enviá-la para a comissão organizadora.

– A fase escrita é muito trabalhosa, pois essas peças devem ser longas, em inglês, têm uma formatação muito específica e devem conter diversas citações de jurisprudências e doutrinas internacionais – explica Fábio Werneck, um dos craques do grupo.

A partir de janeiro, quando termina a fase escrita da competição, as equipes têm cerca de três meses para se prepararem para a fase oral do torneio, realizada em Viena diante de uma banca de três árbitros. Cada equipe sustenta suas defesas pelos dois lados: réu e autor. É nessa hora que os dois oradores das equipes ganham grande importância. São os "artilheiros" na hora da decisão.

– A função do orador é passar ao tribunal a argumentação do grupo de maneira mais simples e objetiva. O grande desafio é tentar entender o que determinado árbitro quer ouvir. Às vezes eles querem uma sustentação toda detalhada e com várias citações, outras vezes só ouvem uma argumentação e já ficam satisfeitos, não importa o resto. É preciso estar preparado e saber lidar com as interrupções. Pois, por mais que se tenha o “script” da argumentação, os árbitros podem interromper a qualquer momento e perguntar algo que leva para outro caminho – relata Marina Guerra Villela, oradora do Geadici na edição passada do torneio.

A preparação para um torneio como esse exige um esforço de aproximadamente um ano. Como no mundo dos atletas de ponta, inclui os fins de semana. A partir de julho, o treinamento do Geadici prevê aulas semanais em que se discutem temas relacionados ao assunto. “Funciona como uma pós-graduação. Escolhemos dois alunos para conduzir as discussões, indicando textos e fazendo pesquisas mais aprofundadas. Todos os outros precisam ler os textos antes dessas aulas e fazemos um debate aos sábados. Essa é a primeira fase de preparação. Depois, na fase dos memorandos, escrevemos já sabendo o caso a ser abordado, ou seja, aprofundamos o tema. Na terceira fase de preparação, para a etapa oral do torneio, fazemos um treinamento interno com simulações em escritórios de advocacia. Além disso, fazemos aulas de inglês, de oratória e até teatro para ajudar na atuação diante dos árbitros”, conta Barreto.

– Para complementar também existem os Pré-Moots que são realizados em Curitiba e São Paulo. São competições parecidas com o Moot de Viena com objetivo de preparar os alunos de Direito do Brasil. Estamos organizando o Pré-Moot Rio de Janeiro, numa tentativa de incentivar os alunos mais novos da PUC a participarem do torneio. Acredito que seria bom para todas as universidades brasileiras como um todo – ressalta Werneck.

Apoiar os alunos de diferentes períodos a integrar o Geadici é uma questão de revezamento natural do grupo, para que todos tenham oportunidade de ter contato com pessoas renomadas internacionalmente na área jurídica. “E também necessária no momento, pois a maioria dos integrantes são do oitavo, nono período”, reconhece Werneck.

Na opinião de quem já participa do Moot, a experiência por um torneio desse porte é uma escola de luxo. “Até para outras profissões porque é preciso saber se esforçar, e o mais importante, de uma maneira eficiente. E isso o torneio ensina. Aprendi a argumentar e como ser convincente mesmo em situações complicadas. Ainda precisam ser feitas pesquisas que não existem em cursos de graduação”, destaca Marina.

– Já fui pesquisador e monitor no departmento, também já participei de júris simulados e o Moot foi a maior experiência que eu tive na faculdade. Poucas vezes na vida um estagiário ou aluno de direito vai conseguir pegar um caso do começo ao fim, ou seja, elaborar as peças, sustentar oralmente e ver um resultado no final. Além disso, conheci muita gente boa da área de Arbitragem e Comércio Internacional – ressalta Barreto.

Com a realização da Copa do Mundo e Olimpíadas no Brasil o coordenador do grupo acredita que o mercado de trabalho na área de comércio internacional vai crescer nos próximos anos.

– As perspectivas no setor são enormes. Quanto mais o Brasil cresce, mais vagas aparecem em Direito internacional como um todo. Existem muitos escritórios hoje em dia que já tem áreas especializadas em Arbitragem e em Comércio Internacional. Se o Brasil ratificasse a convenção de compra e venda internacional – o Brasil é signatário e a convenção ainda não está em vigor no sistema jurídico brasileiro – facilitaria ainda mais nossas vidas –, avalia Barreto.