Projeto Comunicar
PUC-Rio

  • Facebook
  • Twitter
  • Instagram

Rio de Janeiro, 21 de dezembro de 2024


Cidade

Metrô de superfície é um dos atalhos para sanear o trânsito

Carina Bacelar - Do Portal

22/09/2010

Mauro Pimentel

Neste Dia Mundial Sem Carro, a Zona Oeste revela-se um emblema da esperança na solução de um problema crônico e crescente do Rio: o trânsito asfixiado pela estrutura viária defasada em relação à multiplicalção de veículos e pela falta de um sistema de transporte público à altura das ambições de sede olímpica. Com o início da abertura do Túnel da Grota Funda, na semana passada, a Zona Oeste começa a transformação num imenso canetiro de obras. Abrigará a maioria das instalações das Olimpíadas 2016 e das reformas dirigidas ao saneamento do tráfego (algumas prometidas para o Pan 2007), como a duplicação da Avenidas Ayrton Sena e da Auto-estrada Lagoa-Barra e a construção dos corredores expressos de ônibus Transcarioca e Transoeste, entre Barra e Santa Cruz.

Embora necessárias, as medidas são insuficientes para assegurar um deslocamento urbano mais saudável, alertam especialistas em geografia urbana e engenharia civil da PUC-Rio. Segundo eles, é preciso desenvolver alternativas ao transporte rodoviário – principal responsável pela emissão de gases estufa no Rio, segundo estudo divulgado em agosto pela Coppe/UFRJ. Sugerem, em especial, o aperfeiçoamento do transporte ferroviário.   

Cerca de 300 mil veículos circulam por dia na capital fluminense, um acréscimo de 40 mil em relação ao ano passado. Despejam na atmosfera 4.391 gigagramas de dióxido de carbôno, cerca de 33% do total na cidade, calculam pesquisas da Coppe. Para neutralizar essa quantidade de CO2, seria necessário o plantio de 25.829.400 árvores por ano.

 Mauro Pimentel O modal ferroviário é, na avaliação dos especialistas, a alternativa de transporte público mais eficaz e menos poluente. Álvaro Ferreira, professor de geografia urbana da PUC-Rio, acredita que nem mesmo a construção da Linha 4 do metrô, ligando a Barra da Tijuca à Gávea, seria opção ideal de integração para a Zona Oeste. A continuidade de uma única linha no metrô carioca tornaria o deslocamento mais longo e limitaria as possibilidades de articulação entre vários pontos da cidade. O tempo de viagem continuaria relativamente alto, argumenta o especialista. (As horas desperdiçadas no trânsito comprometem cerca de 10% do PIB carioca, estima o Plano Diretor de Transporte Urbano da prefeitura.) 

– A Linha 1 [do metrô] é equivocada. O ideal é que haja um entroncamento com várias baldeações. Um problema nesta linha paralisaria todo o metrô – alerta o professor.

Já o especialista em ferrovias do Departamento de Engenharia Civil, Elias Nigri, reconhece que aspectos geológicos e demográficos cariocas impõem algumas dificuldades à expansão da rede ferroviária subterrânea. Entre eles, o solo arenoso e a densidade populacional. No entanto, ele credita a demora dessa expansão ao "esvaziamento político-econômico do estado nas últimas décadas e à carência de um modelo de regulamentação e planejamento resistentes ao tempo e aos governos".

 Mauro Pimentel

Como inspiração, Álvaro Ferreira aponta os investimentos em transporte ferroviário em Barcelona, sede das Olimpíadas de 1992 e em cujo modelo se baseia o projeto carioca para os Jogos de 2016. Na cidade espanhola, o perfil topográfico semelhante não inibiu projetos como o metrô de superfície.

– O metrô de superfície é uma alternativa mais barata e de construção mais rápida que o trem subterrâneo. Apesar de moradores de áreas nobres reclamarem que esse tipo de transporte promoveria desvalorização de imóveis no entorno, em Barcelona isso não ocorreu. O que emperra o desenvolvimento do transporte ferroviário é o fortíssimo lobby rodoviário – opina.

Alargamento de vias gera polêmica

Álvaro teme que o alargamento das vias para a Zona Oeste, voltado ao escoamento do fluxo crescente de carros na cidade, estimule ainda mais o transporte rodoviário individual. O especialista acredita que  motoristas desistiriam de ir de ônibus para chegar ao destino nos próprios automóveis.

O tráfego daquela área tem aumentado não só pela expansão do mercado imobiliário. A instalação de várias empresas na Barra, à primeira vista uma tentativa absorção da mão de obra qualificada da região, atraiu empregados de outros locais da cidade, cujo deslocamento para o trabalho intensifica o trânsito.

O especialista em planejamento e sustentabilidade do Departamento de Engenharia Civil da PUC-Rio, Carlos Raja Gabaglia, também teme que o alargamento dessas vias seja uma solução paliativa e congestionamentos voltem a ser frequentes. Para ele, os investimentos públicos deveriam se concentrar mais na na ampliação e melhoria da rede de transportes coletivos do que em medidas como a duplicação da Avenida Niemeyer, que liga São Conrado ao Leblon. Gabaglia é categórico: “Sou totalmente contra”.

– Trata-se de um cartão-postal da cidade, que pode ser comprometida por essas obras. A avenida fica em um costão rochoso, uma área instável e suscetível a danos ambientais. Acho até que a duplicação da Lagoa-Barra pode ser feita. Mas essas são medidas paliativas. Logo as ruas serão tomadas por mais automóveis – projeta.

Para não atropelar o meio ambiente

O corredor expresso de ônibus ligando o aeroporto internacional à Zona Oeste, uma das grandes apostas do governo na área de transportes, é considerado discutível pelo especialista em geografia urbana. Apesar de considerar a opção pelo ônibus expresso melhor do que o ônibus comum, Ferreira reforça a necessidade do aprimoramento do transporte ferroviário, inclusive pelo benefício ambiental. Ele observa que mesmo os ônibus movidos a biodísel poluem o meio ambiente.

– O biodísel é, sim, poluidor, pois a porcentagem de diesel no combustível ainda é grande. Por outro lado, um metrô com várias linhas, além de mais veloz e capaz de atingir a cidade toda, permite ao passageiro fazer inúmeras viagens com uma passagem. O ônibus pode até ser uma opção barata, mas o metrô de superfície também é relativamente barato e suporta mais passageiros.

 Mauro Pimentel

Já Elias Nigri destaca a complementaridade entre os ônibus expressos e o metrô de superfície:

– Eles não são excludentes. O que não se pode é projetar transporte de massa sobre ônibus. Na escala do custo de implantação, o metrô é o mais caro, depois vem o trem ou metrô de superfície e o corredor de ônibus, o mais barato. Mas se considerarmos a eficiência energética e o impacto ambiental, aí a escala se inverte.

Para o especialista, apesar dos menores custos de implantação e realização do metrô na superfície, o modal exige a desapropriação de certas áreas, nem sempre algo possível. Nesses casos, quando a topografia da região atravessada inviabilizasse o transporte sobre trilhos, o ônibus seria a opção.

– O prioritário é reduzir a perda de tempo e energia hoje despendidos pela população no transporte, sem falar no peso que representa na renda familiar. Para cada demanda e região, deveríamos ter um modelo mais adequado. Na situação de emergência em que nos encontramos, devemos contemplar todos – sugere Nigri.

Para especialista, obras retratam desigualdades

Na avaliação de Álvaro Ferreira, a concentração das obras na Zona Oeste, em especial na Barra, ilustra a prioridade de investimentos públicos em áreas onde o mercado imobiliário para as classes mais abastadas está em expansão. Esse tipo de avanço desencadeou a ocupação de Copacabana, por exemplo.

– Os investimentos para melhorar o deslocamento do cidadão, seja em estrutura viária, seja em sistema de transporte público, deve beneficiar a cidade como um todo, não só determinadas áreas – critica.

Transoeste começa a sair do papel

Algumas das obras prometidas há mais de uma década começaram a sair do papel. A perfuração do túnel da Grota Funda, parte principal do projeto da Transoeste, começou no dia 15, em cerimônia que reuniu o prefeito Eduardo Paes, o presidente do Comitê para a Olimpíada 2016, Carlos Arthur Nuzman, e o presidente da CBF, Ricardo Teixeira. A promessa é de reduzir à metade o tempo do trajeto entre Barra e Santa Cruz, hoje em torno de duas horas e meia. A prefeitura admite que dificilmente a construção da Transcarioca começará este ano. O Comitê Olímpico Internacional ainda está analisando a execução das obras de duplicação da Avenida Niemeyer.