Uma das muitas conseqüências indesejáveis da globalização é facilitação do crime. A opinião é da advogada Elizabeth Sussekind, ex-Secretária Nacional de Justiça. Segundo ela, enquanto os países eram limitados por suas fronteiras, o Estado tinha o controle sobre a jurisdição. Hoje, a facilidade de comunicação e transportes coopera com o que chama de criminalidade transnacional. “A virtualidade da presença e do serviço facilitou a criminalidade”, explica.
Para Elizabeth, a corrupção no Brasil é endêmica, e está culturalmente infiltrada, vai dos lares às instituições. O presidente da Associação dos Magistrados do estado do Rio de Janeiro (Amerj), Cláudio Dell’Orto, concorda e acrescenta que o excesso de burocracia também facilita o que já se tornou um hábito. Dell’Orto admite que assistiu “Tropa de Elite” (do diretor José Padilha) antes de ser lançado nos cinemas e diz que é um excelente filme por mostrar muito da corrupção e da relação entre policiais e moradores das favelas cariocas, entre eles os traficantes.
Reiner Pungs, coordenador no Brasil e no Cone Sul do Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crime (UNODC, na sigla em inglês), alerta que o custo da corrupção excede qualquer outro custo no país. Para ele, a mudança na intensidade da pena não alteraria o cenário brasileiro.
O sociólogo Ignácio Cano parte para uma explicação etimológica de corrupção, que seria a perda de um estado natural para um estado em decomposição. “No entanto, no Brasil a corrupção definiu-se como um estado natural. Portanto essa etimologia não é condizente com a realidade brasileira”, conclui. No país, segundo ele, as pessoas misturam assuntos pessoais com profissionais e acabam, por vezes, utilizando-se do aparelho do Estado para resolver problemas pessoais, e vice-versa.
Elizabeth chama a atenção para o nepotismo em órgãos públicos. Segundo ela, nesses casos, o que era para funcionar de um jeito acaba perdendo a utilidade, gastando à toa o dinheiro do contribuinte. “A criminalidade bem vestida, bem empacotada, às vezes acaba sendo disfarçada e acabamos nos preocupando mais com a que nos atinge diretamente”, diz.
Para Ignácio, uma conseqüência disso é que o Estado passa a ser inimigo da população, e a delação passa a ser algo errado. Mas ele ressalta que a Polícia Federal tem aparecido como um órgão mais independente, às vezes constrangendo o governo com suas investigações. “O que não é possível é um deputado que vai ser julgado renunciar antes. Isso é inadmissível. Ele tem que ser julgado”, afirma.
“O setor público no Brasil, como a universidade e a escola, virou sinônimo de falta de qualidade, de descrença. Enquanto que devia ser o contrário. É necessário ter compromisso com o público”, concluir Dell’Orto.
Dicas de Ignácio Cano para entender a corrupção no Brasil: No cinema: Cidade de Deus (Brasil, 2002), de Fernando Meirelles, porque representa os mecanismos que vinculam violência à corrupção.
Em livro: Elite da Tropa (Editora Objetiva), de Luis Eduardo Soares, André Batista e Rodrigo Pimentel. O livro representa com muita clareza o vínculo entre a corrupção política, de um lado, e a violência, do outro, tão presente no nosso meio.
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