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Rio de Janeiro, 30 de dezembro de 2024


Mundo

“Mídia não serve só para ganhar dinheiro”, lembra Bernstein

Lais Botelho - Do Portal

05/05/2010

Mauro Pimentel

A mídia só pensa naquilo... Dinheiro. Precisa reencontrar o caminho da relevância social. O diagnóstico seria mais uma pedra na vidraça da imprensa caso não tivesse a estatura de Carl Bernstein. Com a veemência das denúncias do caso Watergate, o jornalista americano foi taxativo na palestra que reuniu alguns cânones do jornalismo mundial na Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, em homenagem ao Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, na segunda-feira. Jornais, revistas, tevês estão distante do dever social, alertou. Em rápida entrevista ao Portal PUC-Rio Digital, concedida após o seminário, Bernstein apontou caminhos para a renovação da imprensa. 

 - A mensagem transmitida deve ser mais informativa e circular mais livremente. Os limites impostos a ela [imprensa]devem ser mínimos. Desde que não prejudique pessoas e culturas, tudo é possível - acredita o ex-repórter do Washington Post, celebrizado pela série de reportagens culminadas na renúncia do presidente americano Richard Nixon, em 1974.

A mídia foi dominada por fofocas, polêmicas fabricadas, sensacionalismo avalia Bernstein. Para ele, esta "falta de conexão com o contexto real" se deve, em parte, à mudança de foco da imprensa - que "prioriza o dinheiro e o entretenimento em detrimento da informação de qualidade".

No canhão da autocrítica, Bernstein também disparou contra a "maneira apressada e pouco apurada" que se observa em algumas produções supostamente jornalísticas. Sem dicções nostálgicas, o veterano alertou aos jovens repórter: "É preciso saber ouvir, dar o tempo necessário às fontes e não trabalhar com noções pré-concebidas".

À advertência de Bernstein sobre o risco de contaminação da imprensa por interesses econômicos, somou-se a observação de Ricardo Gandour, diretor de conteúdo do Estado de São Paulo e mediador do seminário. Ao levantar para discussão o tema “O cerceamento às liberdades de expressão na América Latina”, Gandour lembrou:

-  O progresso da nação não depende apenas do progresso econômico. Temos que atentar para o fato de que, apesar de vivermos em um país emergente, a economia não é a única que rege o progresso.

 Mauro Pimentel Grandes representantes do jornalismo mundial debateram as dificuldades ainda vividas pela imprensa para exercer plenamente a liberdade de expressão e imprimir o olhar crítico indispensável ao avanço social. Alguns contaram casos de luta contra a censura, como o editor de Opinião do jornal equatoriano El Universo no Equador, Emilio Palácio. 

Emilio (foto) está sendo processado por "ofender" o presidente Rafael Correa. Corre o risco de pegar três anos de prisão e pagar uma indenização de US$ 2 milhões. Segundo o jornalista, Correa "instaurou o medo e reduziu a liberdade no país". Para ele, o Equador estaria tão ameaçado quanto a Argentina e a Venezuela, cujos governos impuseram rencentes sanções a jornais. 

 - Não tenho medo em vir lutar pela liberdade de expressão, mas sei que tudo pode acontecer. Sou um simples jornalista, odiado pelo presidente, mas não deixarei de lutar - bradou Emílio.

 Mauro Pimentel Carlos Zuloaga (foto) representava o pai, o também jornalista Guilhermo Zuloaga, impedido de sair da Venezuela por ter criticado o governo de Hugo Chávez. Segundo Zuloaga, seis em cada dez ataques foram a repórteres.

 - O que considero mais grave é que todas essas formas de controle levam a uma auto-censura - destacou.

O jornalista argentino Hernán (foto), do grupo Clarín, ressaltou a pressão oficial e política contra os veículos de comunicação, e a interrupção de programas para mostrar assuntos oficiais. Ele criticou os efeitos da nova legislação no país:

 Mauro Pimentel

 - Os meios de comunicação sofrem um controle muito forte do governo. As autoridades são donas das empresas e assim só as suas mensagens são veiculadas sem restrições. Essa limitação de produção de conteúdo é uma afronta. Eles falam em garantir mais vozes, mas o que só fazem é calá-las.

Organizado pela EMERJ, a Associação Nacional dos Jornais (ANJ), a Associação Brasileira das Empresas de Rádio e Televisão (Abert) e a Associação Nacional dos Editores de Revista (Aner), o encontro reuniu também o vice-presidente das Organizações Globo, João Roberto Marinho; o desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Fernando Foch; e o ministro do Supremo Carlos Ayres Brito, homenageado por ser o relator da ação judicial que revogou a Lei de Imprensa, instituída pela ditadura militar. 

 Mauro Pimentel

- Acabou a censura prévia no Brasil e isso nos coloca na linha de frente dos países que fazem com que a liberdade de imprensa caminhe junto com a democracia - disse o ministro, no discurso de agradecimento.