Como as novas tecnologias alteram a percepção do espectador sobre a comunicação audiovisual? A professora Andréa França, do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio, busca respostas. Ela participou, de 30 de junho a 2 de julho, do Colóquio Internacional – Cinema, Tecnologia e Percepção: novos diálogos. Em mesa de debate com estudiosos de universidades do Brasil e da França, discutiu a constituição do público de cinema documentário.
Segundo Andréa, este tipo de filme sugere uma aura de objetividade e transparência que nem sempre é real.
- A construção do espectador dessa imagem específica passa, na verdade, pela questão do documento. O documento como esse lugar em que residiria uma verdade, uma certa concepção de realidade – antecipa.
É o próprio universo do cinedocumentário o primeiro a questionar essa representação limitadora. Obras como Santiago, de João Moreira Salles, Jogo de Cena, de Eduardo Coutinho, e Juízo, de Maria Augusta Ramos, propõem a revisão desse papel.
- Esses documentários mais autorais estão apontando para essa questão, que é crucial – garante.
A busca por legitimidade das imagens vai muito além do cinema. Todo o universo do audiovisual divide essa necessidade. Com isso, se abre espaço para que o cidadão comum alcance a grande mídia.
- As novas tecnologias permitem que qualquer um hoje possa enviar uma fotografia. Como a história daquela velhinha que tinha registrado traficantes no Pavãozinho. Aquelas imagens vão para o Jornal Nacional e têm um peso de verdade – explica.
Ao mesmo tempo em que cada cidadão pode se tornar um produtor, cria-se um paradoxo, porque as tecnologias atuais permitem a fácil manipulação dessas imagens. No embate entre crer e duvidar, o consumidor acaba se fiando à credibilidade de cada veículo.
- Estamos totalmente mergulhados em um mundo de imagens o tempo todo e nunca sabemos até que ponto podemos confiar. Então, buscamos não mais a imagem apenas, mas o lugar de onde ela vem – afirma.
Os reality shows tiveram papel fundamental para que o telespectador adquirisse maior consciência da manipulação de imagens. Andréa, porém, não acredita que esse processo possa afetar a credibilidade dos telejornais.
- Não se pode pensar em uma emissora qualquer que seja na televisão como uma unidade. Há milhares de programações, programas de entretenimento, programas de informação, programas de comunicação – diz.
A discussão, no entanto, não é nova. A edição e a montagem já são utilizadas pelo cinema há décadas. Andréa lembra o construtivismo soviético. No início do século passado, nomes como Sergei Eisenstein e Dziga Vertov pesquisavam a sua capacidade de construir ideias.
- De alguma maneira, isso é retomado. Hoje, se tornou mais comum, faz parte do cotidiano, chegou ao grande público. Qualquer um sabe que pode estar sendo manipulado de alguma maneira – acredita.
O desenvolvimento tecnológico não permitiu ao cinema apenas a manipulação de imagens. Andréa destaca o barateamento na produção de filmes.
- Antigamente, você pensava cinema como algo industrial, com equipes grandes e um processo imenso. Hoje, não. Você é capaz de ter a sua câmera, fazer um pequeno filme, editar no seu computador e você mesmo exibir – compara.
Andréa alerta para a necessidade de se ampliar a discussão para todos os meios audiovisuais. O cinema não pode mais ser tratado somente como o ato de ir a uma sala de exibição. Está é apenas uma das possibilidades que ele apresenta atualmente.
- As pessoas têm muito mais acesso ao acervo de cinema mundial do que dez anos atrás. É uma mudança muito rápida. Há softwares que permitem, hoje, baixar filmes. Nem sei se cinco anos atrás eu me lembro de ter ouvido falar nisso – ressalta.
Iniciativas como o colóquio de que participou são boas oportunidades para debater essas questões, que Andréa considera fundamentais, mas não apenas para isso.
- É um momento de intercâmbio, conhecimento, interação com estudantes de outras universidades. Inclusive, para travar relações com os próprios professores – aconselha.