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Rio de Janeiro, 21 de dezembro de 2024


Cultura

Diretores de fotografia discutem a luz no cinema

Felipe Machado e Gabriela Ferreira - Do Portal

06/11/2007

Cento e dez cinegrafistas de 15 países  trocaram os bastidores das filmagens e apareceram diante das câmeras para falar sobre como os novos recursos tecnológicos afetaram seu trabalho. Eles estão no documentário “Cinematographer Style”, do diretor Jon Fauer, que foi exibido no Rio de Janeiro por iniciativa do curso de Cinema da PUC-Rio. O maior depoimento de um cinegrafista no filme é o do italiano Vitório Storaro, que faz uma reflexão sobre a luz. Storaro, fotógrafo do clássico de Bernardo Bertolucci “O Último Tango em Paris”, explica o uso da luz de maneira bem simples, na cena mais bonita do longa. O ambiente está todo escuro, ele acende uma lâmpada e a coloca atrás de si, na frente, de um lado e do outro, mostrando os efeitos que a iluminação causa.

O professor de Direção de Fotografia na PUC-Rio e organizador da exibição do filme no Cine Odeon e na PUC-Rio, Marcelo Taranto, diz que hoje se usa muito a intermediação digital. Segundo ele, alguns diretores são contra filmar em tecnologia digital, alegando que assim o diretor de fotografia perde o domínio sobre o filme. “Isso é uma questão pessoal de como o processo é levado e como o diretor está comprometido com o filme. Pode ser muito bom ou muito ruim, depende de cada um”, afirma. Mas lembra: “A película ainda tem melhor qualidade de captação”.

“Quando o cinema nasceu, era uma nova tecnologia”, ressalta o diretor de fotografia Walter Carvalho, para quem o digital é apenas um novo processo. “Vai ter sempre uma nova tecnologia, alguma coisa que se possa produzir com imagem que vai ser um elemento novo”, diz. “Hoje, para quem está estudando cinema, nunca as ferramentas foram tão boas, tão baratas e tão poderosas”, argumenta Stefan Hess, professor de Fotografia Digital para Cinema da PUC-Rio. Stefan explica que, quando se filma digitalmente, gasta-se mais para alugar uma câmera em HD (High Definition) do que no processamento de película. No processo digital o uso da película só é necessário no fim da pós-produção, para eventual transformação do conteúdo digital em filme. Ainda assim, a relação custo-benefício, segundo ele, é melhor do que filmar em película.

Outro assunto bastante comentado no documentário é a questão da autoria do diretor de fotografia, de acordo com o estilo, em contrapartida com a do diretor, em uma produção. Marcelo Taranto fala que o diretor é quem tem o comando, entretanto, ele deve ter a mente aberta a opiniões de outros profissionais envolvidos. “Tenho meu lado como fotógrafo e como diretor e a melhor maneira é aglutinar energias para o filme. Cinema é um trabalho de equipe”, diz. Walter Carvalho concorda que o cinema é uma arte coletiva e fala de uma co-autoria. “A co-autoria do fotógrafo na criação do filme é muito maior do que podemos imaginar. As decisões, a contribuição e a cumplicidade entre o fotógrafo e o diretor é muito grande no filme”, diz.

Roberto Faissal, especialista em filmagem submarina, fala que debaixo d’água, na verdade, acaba contando a história um pouco do jeito dele. “Esse é um grande prazer e algo diferente na minha especialidade”, conta o diretor da Associação Brasileira de Cinematografia (ABC), parceira do evento ao lado da PUC-Rio e do grupo Estação.

Para Edgar Moura, diretor de fotografia, a verdadeira autoria é do roteirista, a não ser em filme de produtor. “Aí o produtor é muito mais autor que qualquer outra pessoa. Como, em geral, os diretores escrevem suas histórias, podemos considerar que o autor é o diretor. Os outros, na verdade, são colaboradores”, diz Edgar. Ele explica que a função do diretor de arte e do fotógrafo é traduzir em imagens para o diretor elementos que estão no roteiro, envolvendo cenário, cores, lentes, figurino.

"Cinematographer Style" é um filme que fala da própria arte do cinema. Especialmente de algo difícil de explicar, segundo Taranto, que é a fotografia. “Apesar da luz ter uma função predominante, é complexo formular uma definição única”, diz, ressaltando a importância do documentário em uma época que, no Brasil, se dá cada vez mais atenção ao estudo da sétima arte. Para Walter Carvalho, o documentário esclarece tanto para alunos de cinema quanto para leigos e, até para fotógrafos, determinados aspectos que possam passar despercebidos.
O filme teve duas únicas exibições no Rio de Janeiro em 2007 e não tem previsão de distribuição no país. No primeiro dia foi exibido no cinema Odeon e no outro a exibição ocorreu no auditório do Rio Data Centro, na PUC-Rio, seguido de debate o entre Jon Fauer, Marcelo Taranto, Roberto Faissal e Edgar Moura.

Fauer começou escrevendo manuais

Ex-estudante de medicina, o diretor de fotografia Jon Fauer começou a filmar como um hobby, quando tinha apenas oito anos de idade. Depois disso, fez filmes na universidade e resolveu apostar no seu talento para a cinematografia. Abandonou a faculdade e se mudou para Nova Iorque, onde conseguiu um emprego numa TV, fazendo documentários sobre esportes. “Eu entrei no curso de medicina porque pensava que ninguém conseguia um bom emprego na área cinematográfica, mas eu sentia que aquela não era a faculdade certa”, contou Fauer.
Além disso, o diretor escreveu dez best-sellers em cinematografia, livros técnicos de câmeras, que ensinam o manuseio das câmeras.

Os manuais, que muitas vezes vinham em alemão, eram mal traduzidos para o inglês. Segundo Fauer, o documentário "Cinematographer Style" é direcionado para o público de cinema, pois trata de muitas partes técnicas, como variações de luz e de câmeras, por exemplo, mas também é um excelente filme para todos que queiram saber mais sobre o trabalho cinematográfico e apreciá-lo.

“O documentário conta de que maneira a tecnologia influenciou cada diretor e como a tecnologia foi influenciada pelo estilo de cada diretor. Embora seja uma combinação de fatores, as novas ferramentas sempre acabam nos incentivando a ter um determinado estilo”, disse Fauer. Ver diretores que ficavam apenas atrás da câmera, como Andrew Laszlo, Vittorio Storaro e Jack Cooperman, na frente da tela, descrevendo seus trabalhos, é uma oportunidade inédita no Cinema e filmá-lo foi um desafio para o diretor.

“O desafio de filmar Cinematographer Style começou há três anos. Nós começamos entrevistando dez diretores. Cada ano, nós escolhíamos mais profissionais para falar no filme, em um ano tínhamos 50 e em outro 80, até completar o número que temos hoje. E pedimos mais rolos de filmes para a Kodak e mais rolos para processamento para a Technicolor para todo esse pessoal”, contou Fauer.

Para ele, a conexão perfeita entre diretor e roteiro começa com um excelente roteiro. Em segundo, é necessário um diretor que entenda o roteiro, os atores envolvidos e a atuação. Em terceiro, o filme deve ter um excelente diretor de fotografia. A melhor combinação é quando o diretor dirige os atores e a atuação, e deixa toda a parte visual para o profissional de fotografia. Há diretores que tentam influenciar a fotografia. Às vezes é tanto, que eles ignoram os atores. Então a melhor combinação é o equilíbrio dos três aspectos.

Com as inovações tecnológicas, Fauer comenta sobre o estilo mais livre que as novas câmeras proporcionam: “A tecnologia tem influenciado muito nos trabalhos cinematográficos. As câmeras ficaram menores. Os filmes ficaram mais rápidos. Você pode levar a câmera para lugares variados, que você não podia levar antes pra filmar e a qualidade das imagens também melhorou. Isso quer dizer que a tecnologia nos proporcionou um tipo de “estilo livre”, mais interessante e honesto que jamais tivemos”, concluiu Jon Fauer.