Juliana Reigosa, Luisa Oliveira e Mariana Bispo - aplicativo - Do Portal
10/07/2015O impasse em torno da tragédia econômica da Grécia – materializada na taxa de desemprego de 25,6%, a maior entre os países na zona do euro, e na dívida pública de € 23 bilhões (o equivalente a R$ 1,12 trilhão) – revela-se mais do que um capítulo previsível da novela iniciada com a crise global de 2008, desdobrada na queda de braço entre a receita de austeridade pregada pelo capital financeiro do bloco e a resistência de uma esquerda personificada pelo primeiro-ministro Alexis Tsipras. Em meio ao colapso que atinge em cheio, por exemplo, os aposentados, que só têm permissão para sacarem o equivalente a R$ 214 por dia, a vitória do "não" no referendo popular de domingo passado embaralhou ainda mais o jogo político em torno de um acordo entre os credores e o governo grego. Diante da possibilidade de saída do país da zona do euro e do risco de contaminação econômica na região, o Fundo Monetário, o Banco Central Europeu, os 28 integrantes da União Europeia e Tsipras tentam equacionar uma saída. O turbilhão de incertezas carrega implicações geopolíticas e ecomômicas difíceis de precisar. Na avaliação da economista Cristina Helena Pinto de Mello, professora da PUC-SP e da ESPM, "a saída da Grécia da União Europeia aumentaria a chance de contágio, exposição política e um severo abalo no projeto de integração".
Para o também economista Róridan Duarte, integrante do Conselho Federal de Economia (Cofecon), o principal problema da Grécia e dos demais países periféricos do euro está na assimetria entre as economias dos integrantes desse bloco. “A união monetária veio agravar essas distorções entre economias com forte perfil industrial e exportador versus economias com perfil de serviços e déficits estruturais de balança”, argumenta. Outro ponto central, ainda na avialiação do especialista, remete à "magnitude da dívida", incompatível com “a capacidade de geração de divisas em momento de crise”:
– A consequência política foi a perda das eleições pelo governo que negociava com os credores e a ascensão de um governo que propunha exatamente a rejeição daquele receituário. Faltou à Troika (negociadores europeus e o Fundo Monetário Internacional) captar esse movimento e oferecer um acordo mais aceitável ao povo grego, em vez de aprofundar os pesados sacrifícios já rechaçados pelas urnas – analisa Duarte.
O professor de Relações Internacionais da PUC-Rio Marcello Cappucci destaca que a vitória do “não” no referendo mostra um “cansaço” da população grega frente à realidade e às alternativas que lhe foram impostas desde o estopim da crise:
– Os gregos vêm em um processo de concessões bastante longo, sendo difícil fazer uma opção por mais austeridade quando já se abriu mão de tanta coisa. O governo de Tsipras foi eleito com a promessa de não se fazer mais essas concessões e o próprio Estado fez campanha para que as pessoas votassem pelo “não”. Inclusive, o ministro da economia disse que renunciaria caso o “sim” vencesse. Porém, a vitória de 61,31% não foi esmagadora, sendo um indicativo de que a população está cansada.
Segundo Cristina Helena, “cresce internamente a convicção de que as políticas de austeridade piorariam as condições de pagamento da dívida em lugar de melhorar”:
– O “não” grego fortalece o atual primeiro-ministro, mas não elimina a dívida. Pior, fecha as portas para um diálogo que permita socorro aos bancos gregos pelo Banco Central Europeu (BCE). Até pode resultar em ganhos a longo prazo, porém não elimina a necessidade de se definir uma forma de pagamento da dívida. Além disso, os custos são elevados no curto prazo, com escassez de produtos, de moeda e volatilidade dos mercados.
O economista Gilberto Braga, professor de finanças do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec-Rio), avalia a vitória do “não” como “um forte simbolismo político, muito mais do que o efeito econômico”:
– Abre a possibilidade para uma negociação mais ampla e menos financeira, que considera todas as possíveis consequências para a zona do euro e para o resto do mundo.
De acordo com o economista Thomas Conti, mestre em História Econômica e doutorando em Desenvolvimento Econômico pelo Instituto de Economia da Unicamp, “a vitória do 'não' mostra que a população está farta das imposições da tecnocracia econômica e está disposta a buscar alternativas”.
Um dia depois da consulta popular, o ministro das Finanças da Grécia, Yanis Varoufakis, renunciou ao cargo e alegou, em seu blog, que "havia certos participantes do Eurogrupo preferiam a sua ausência destas reuniões, uma ideia que o primeiro-ministro considerou potencialmente útil". A saída de Varoufakis surpreendeu o país, justamente pela vitória do “não” aos novos acordos propostos pelos credores. Para Conti, Varaoufakis cultivada um conduta combativa nas negociações, mas tal característica não garantia a resolução de dificuldades associadas a uma possível saída do euro:
– Em menos de um ano, Varaoufakis conseguiu se tornar uma importante figura pública para a esquerda grega e virou, inclusive, referência internacional, divulgando artigos e opiniões próprias diretamente em seu site, sem a mediação da imprensa oficial. Parece pouco, mas isso foi muito importante durante as negociações da dívida grega, nas quais a posição do comitê financeiro grego estava sob ataque da mídia internacional.
Apesar da posição combativa nesse xadrez político, observa Conti, Varaoufakis reconhecia que a Grécia não tinha capacidades técnicas nem fundos financeiros adequados para enfrentar os desafios de uma saída do Euro exigiria:
– Varaoufakis deixa o cargo a pedido do primeiro-ministro Tsipras, sob alegação de que sua presença nas próximas negociações dificultaria a posição da Grécia. Contudo, com o novo ministro das Finanças, Euclid Tsakalotos, é possível que a Grécia tenha alguém ainda mais radical no poder. Desde 1998, Tsakalotos vem se posicionando como um cético sobre a viabilidade do euro e contra a entrada da Grécia na Eurozona.
Analista: crise grega lembra década de 1980 brasileira
Na visão de Cristina Helena, há certo paralelismo entre as condições políticas internas da Grécia e as do Brasil na década de 1980, quando houve a dívida externa foi rolada. “Assinávamos acordos punitivos que diminuíam nossa capacidade de enfrentamento e esgarçavam os arranjos políticos internos, provocando o crescimento das vozes de oposição e do custo político”, analisa.
– Uma famosa frase de Trancredo Neves foi: “não pagaremos a dívida com o sangue do povo”. Claro que há enormes diferenças, mas o atual primeiro-ministro Alexis Tsipras elegeu-se prometendo negociar com credores condições mais favoráveis.
Cappucci lembrou que o Brasil também passou por apreensões semelhantes quando o ex-presidente Fernando Collor de Mello congelou as finanças, causando “grande desconforto”, principalmente nos idosos que tiveram as poupanças confiscadas. Já Duarte distingue a resposta da Europa à crise das posições adotadas por Estados Unidos, China e Reino Unido no começo da turbulência global, em 2008: “O gigante asiático buscou manter um crescimento elevado, ainda que com custos, e os EUA agora começam a colher frutos da política adotada, com sinais consistentes da volta do crescimento econômico ao país”. Ele avalia:
– A resposta da Europa à crise de 2008 foi inadequada. Errou em dar ao BCE os instrumentos adequados para uma política monetária ativa. Falhou, sobretudo, na política fiscal, com um receituário contracionista e de “austeridade”, que impediu que a economia retomasse o crescimento e impondo pesados ônus à população, sobretudo dos países periféricos do bloco, Grécia, Portugal, Irlanda, Espanha e mesmo a Itália. Só agora o continente europeu busca corrigir essa falha.
Cappucci ressalta que as medidas de austeridade foram tomadas devido à dívida soberana alta, sendo necessário a ação de corte de gastos públicos:
– Os EUA resolveram a crise por políticas de renda e de estímulo à demanda para poder fazer a economia voltar a crescer, mas ela só se recuperou quase sete anos depois, em 2015. A economia europeia também foi abalada e os países responderam com austeridade fiscal, principalmente por conta da situação que estavam naquele momento, com uma dívida soberana alta. Então, no momento em que vem a crise, essa situação se agrava, sendo necessário cortar gastos públicos e aumentar impostos para tentar segurá-la. Há países que conseguiram segurar isso muito bem e reduziram bastante o seu déficit público. No entanto, as taxas de desemprego, por exemplo, continuam elevadas. Em alguns lugares da Espanha, por exemplo, esses índices chegam a 40% entre a população jovem. Algumas pessoas acham que a crise europeia só vai ser completamente curada em 2018. No caso da Grécia, temos um quadro muito mais grave.
Em meados dos anos 2000, o país maquiou as contas públicas com o objetivo de entrar na União Europeia. A escolha culminou, entretanto, em graves consequências. Não só na economia, mas também nas políticas sociais. Cappucci acredita que a crise global de 2008 agravou toda a situação da Grécia e responsabiliza os próprios gregos:
– Na verdade, os gregos não são inocentes. São culpados. Desde 2000, a Grécia tentou maquiar as contas pra poder participar da zona euro, foram publicados relatórios para conseguir a entrada e os ajustes não foram feitos. Assim, o governo gastou mais do que podia e devia, o funcionalismo público grego consome um percentual de arrecadação muito alto. A crise de 2008 agravou toda essa situação, e o que poderia ter sido administrado de outra forma, foi agravado por ela. Mas não foi só isso. As próprias Olimpíadas em Atenas não funcionaram e isso foi um fator que aumentou o déficit publico grego, eles esperavam um investimento que não aconteceu, um público que não aconteceu. Veio tudo na mesma hora.
O colapso na aposentadoria, cuja resolução é uma das condições impostas pelo BCE e o FMI para liberar a outra parcela de ajuda financeira, é insustentável, afirma Cappucci. O governo grego gasta 10% do orçamento em aposentadorias, enquanto a Alemanha, cujo sistema previdenciário alemão é superior, gasta 2,5%. “São questões que indicam como os gregos não têm responsabilidade sobre o que está acontecendo”, reitera o professor.
Negociações são necessárias para tirar Grécia da crise, reafirmam especialistas
De acordo com Braga, mantém-se a impressão de que a Grécia foi admitida na UE muito mais pelo passado. “Uma espécie de concessão aos filósofos Aristóteles, Platão e Sócrates, e em tributo a Zeus e a todos os outros deuses”, ironiza. Os mercados internacionais, observa o analista, “receberam mal” a vitória do “não”, com a queda nas bolsas, apesar de o impacto financeiro não ter sido surpresa. No entanto, para a União Europeia, “trata-se de um teste duro porque ambos os lados deverão ceder, à medida em que querem sair vitoriosos do embate”.
– Trata-se de montar um mosaico. A questão é cada vez menos financeira. Por isso, outros componentes deverão ser considerados. O risco de uma desintegração do euro como moeda comum não está descartado, embora não seja provável. O episódio pode ter um efeito dominó para outras nações da União Europeia com dificuldades em sua economia – alerta.
Cristina Helena sinaliza para duas possibilidades: a saída da Grécia da zona do euro ou o avanço das negociações, fortalecendo a União Europeia. “Entre os custos envolvidos estão a disposição política dos europeus em se comprometer uns com os outros em torno de um projeto político de união e a possibilidade de contaminação, entre outros fatores. Por isso, acredito que a UE permanecerá com o atual contorno, isto é, com uma moeda mais fraca, porém politicamente fortalecida”, projeta.
Segundo Conti, a UE sofre “um duro golpe”, pois a mensagem para outros países fragilizados, como Portugal, Espanha e Itália, indica uma margem de negociação com o BCE baixa:
– Nos últimos anos cresceu muito entre os acadêmicos a visão de que o euro está fadado a fracassar com o tempo. O Produto Interno Bruto da Grécia (PIB, a soma das riquezas produzidas) já caiu mais de 20% desde 2008, a despeito de diversos cortes em direitos trabalhistas e de aposentadoria e nem assim há uma flexibilização da posição da Alemanha nas negociações. O futuro da União Europeia parece sombrio. Se não para todos os países, para as economias mais frágeis com certeza.
Quanto aos reflexos da crise na economia mundial, Cristina Helena considera “bem menores”. “Os mercados precificaram essa possibilidade e puderam se ajustar”, afirma.
Por outro lado, Duarte ressalta que, em um cenário pessimista, pode-se ter um “agravamento sério via fuga de capitais para o dólar e para os títulos norte-americanos”:
– Dessa forma, haveria um acirramento da crise da dívida nos demais países do euro, dificultando a rolagem daqueles países e mesmo contaminando o sistema financeiro europeu, com riscos para grandes bancos do bloco, ainda fortemente dependentes de recursos dos governos e do BCE.
Conti, por sua vez, avalia que o impacto de um colapso total da economia grega para a mundial é “muito pequeno”. Ele ressalta a possibilidade de um contágio no qual os investidores ficariam mais avessos ao risco por medo do sistema bancário de países já fragilizados da zona do euro deterem muitos títulos da dívida pública grega:
– Mesmo um calote total da dívida grega, algo muito difícil de acontecer, não haveria impacto significativo nas contas dos seus principais credores. Quanto ao chamado efeito contágio, pode levar a uma fuga de capitais para investimentos mais seguros, como o dólar. Nesse processo, países como Espanha e Portugal teriam que elevar as taxas de juros para manterem o fluxo de financiamento, fragilizando suas contas públicas e colocando-os próximos de uma situação como a que a Grécia encontra hoje.
Já para Braga, a economia mundial deve entrar numa nova crise. “Se não houver uma saída consensual para a crise grega, a economia mundial deverá sofrer uma nova crise, mas de dimensões menores do que a de 2008”, ressalva.
Impactos geopolíticos e crise do euro em jogo
A incerteza sobre a permanência da Grécia na União Europeia é só um dos aspectos representativos da crise. Para Arraes, os efeitos revelam-se inéditos e imprevisíveis:
– É imponderável medir os efeitos porque é um aspecto novo na história da União Europeia, cada vez mais tecnocrática e, desta forma, menos democrática. A desvinculação entre os anseios da população grega e os da burocracia de Bruxelas e de Berlim contribuiu para um desfecho surpreendente. Aplica-se na UE a visão do liberalismo clássico, ou seja, o do início do século XIX, no qual o povo somente após muito tempo, via educação e experiência administrativa e política gradativa, poderia entender a complexidade do processo da tomada de decisão – compara.
Cristina Helena considera as questões geopolíticas um aspecto central para a União Europeia. Lembra que a Grécia é porta de entrada para turcos, imigrantes africanos ilegais e "radicais de todos os tipos". O país configura-se, portanto, como uma "peça importante na articulação política da UE”, ressalta a professora.
A tempestade provocada pelas dívidas públicas da Grécia estende instabilidades na zona do euro e entre os países da UE, cujas bolsas de valores oscilam. Um cenário de enfraquecimento do bloco econômico, destaca Cappucci:
– A crise grega não é tão importante assim para comprometer geopoliticamente a União Europeia. Acredito que a crise do euro, sim – pondera – De certa forma, enfraquece a posição da UE no cenário internacional. Uma saída da Grécia debilitaria a posição do bloco, pois levantaria considerações a respeito do futuro do euro e da própria UE, que pode levar a uma série de especulações em torno dela e dos países que a compõem.
Duarte acredita, por outro lado, em caso de saída da Grécia, outros blocos econômicos podem se tornar articulações importantes. Já se o país permanecer, as perspectivas se mostram mais animadoras:
– Se a Grécia permanecer no euro, o que acredito que ocorra, poderá haver a redução substancial da dívida pública, se possível com um bom período de carência para novos desembolsos; foco no crescimento da produção via setores exportadores e outras fontes de divisas para o país, como o turismo; reformulação séria do sistema financeiro, com instrumentos de regulação e busca de retomada da credibilidade no sistema; reestruturação do sistema tributário, direcionando o ônus do ajuste aos mais ricos e, assim, fortalecendo o apoio político interno da população ao governo que liderará os ajustes e a retomada.
Caso a Grécia saia da zona do euro, Duarte prevê uma “renegociação forçada da dívida com os credores, de modo a não perder acesso aos mercados internacionais de crédito, reintrodução do dracma (antiga moeda grega) em bases bem desvalorizadas face ao euro, estimulando a frágil indústria local a torná-la minimamente competitiva face aos vizinhos europeus; garantir a poupança interna, com taxas de conversão que mantenham o poder de compra da população, com política fiscal e creditícia ativas; busca de parcerias estratégicas com outros blocos e atores relevantes – Brics, em especial Rússia e China”.
Ajuda financeira é caminho para Grécia sair da crise, ressalta analista
Na quarta-feira (8), o presidente do Conselho Europeu Donald Tusk pediu, até domingo (12), um acordo dos gregos com os europeus para conseguir ajuda financeira. Na opinião de Cappucci, esse é o caminho para a Grécia sair da crise e recuperar sua economia. “Entendo que os gregos vão ter que ceder e a UE também”, afirma.
– Os dois lados chegaram a um ponto onde não dá mais para não ceder. A Grécia estava até então inflexível, mas sem um respaldo. O referendo serviu como respaldo político. Já a UE precisava, de certa forma, marcar posição porque já fez muitos empréstimos sem que a Grécia cumprisse as metas estabelecidas – justifica.
Cristina Helena diz que é “imprescindível que uma ajuda efetiva seja oferecida à Grécia”. No entanto, ela pondera: “para que isso ocorra, é necessário que os credores aceitem uma redução e um alongamento no prazo da dívida”. Já Conti ressalta que o “perdão e reestruturação da dívida grega para tornar o pagamento viável o quanto antes é o caminho mais viável”.
– Caso não haja uma solução de compromisso com um plano conjunto de reerguer economicamente a Grécia, a economia do país estará comprometida pelo menos pelos próximos dez anos. Já passou do ponto em que apenas a renovação de fluxos de crédito seria suficiente para o país retomar o crescimento. É necessário pensar como será gerado emprego para a enorme massa de jovens desempregados da Grécia atual, que ultrapassa 50% da juventude.
Por meio de uma carta assinada pelo atual ministro das Finanças, Euclid Tsakalotos, a Grécia pediu ajuda, em valor não especificado, por três anos, e se comprometeu a realizar “reformas e medidas amplas a serem implementadas nas áreas de sustentabilidade fiscal, e crescimento de longo prazo”.
No texto, Tsakalotos “propõe implementar imediatamente um conjunto de medidas, a partir das próxima semana, incluindo medidas relacionadas a reforma tributária e medidas relacionadas a pensões”.
Efeitos nas exportações brasileiras
Na visão de Braga, a crise da Grécia é “uma ducha de água fria em relação à recuperação das exportações brasileiras, que estavam mostrando avanço com a ajuda da valorização do dólar”:
– O próprio câmbio deverá ficar pressionado enquanto as incertezas perdurarem. A Grécia fica longe, mas as consequências de sua crise podem frear ainda mais a nossa economia, que já terá um perdido.
De acordo com Duarte, a crise pode respingar no Brasil. Para ele, é possível haver saída de recursos externos da economia brasileira, diante da “maior aversão internacional ao risco”, com a desvalorização do real, “sem o benefício de facilitar as exportações, pois a economia mundial retornaria à fraqueza dos últimos anos”.
– Dessa forma, teríamos dificuldades em viabilizar o novo pacote de concessões, pois os investidores estrangeiros estariam mais cautelosos em trazer recursos para projetos de longo prazo – avalia.
Para Conti, o Brasil já vem com uma posição fragilizada devido à recessão interna, corte de investimentos públicos, queda da importação de bens de capital e aumento da inflação. No entanto, o historiador econômico acha “pouco provável” que a crise grega afete significativamente esse quadro:
– Se o efeito contágio da crise grega se mostrar elevado, aí sim seríamos afetados. Os investidores internacionais, por exemplo, pressionariam por juros mais elevados para aplicar no Brasil e haveria queda das exportações para a Europa.
Na avaliação de Cristina Helena, a crise europeia já afetou o Brasil. “Nosso saldo comercial com a UE é negativo desde 2013”, observa. Um enfraquecimento das economias europeias, tanto quanto do euro, aponta a especialista, “tendem a agravar esse quadro”:
– A piora nas relações comerciais se reflete sobre empresas que atuam em ambos os mercados, repercutindo seu desempenho esperado no mercado de ações.
Cappucci, por sua vez, ressalta que “a crise grega respinga diretamente no Brasil porque a nossa balança comercial com a Grécia não é tão expressiva, além de não sermos credores”. O que pode acontecer, segundo o economista, é causar impactos nos produtos importados e exportados.
– No entanto, indiretamente, vai respingar no sistema financeiro, já que as bolsas de valores começam a reagir – pondera.
O doutor em História e professor do Departamento de História da UnB Virgílio Arraes vai além. Para ele, a crise não chegará ao Brasil porque a “elite política já se encarregou de efetuar a própria crise”.
Entenda a origem da crise A Grécia quebrou, segundo analistas, por problemas como a maquiagem das contas públicas, desequilibradas pelo excesso de despesas do governo com servidores, e pensões elevadas. Na última década, o país não só gastou mais do que arrecadou, como também financiou dívidas por meio de empréstimos. Os gastos, somados à corrupção e à evasão fiscal, provocaram um déficit muito acima do limite imposto a todos os países da zona do euro. Com isso, a crise se intensificou e o país ficou mais suscetível às propostas de reforma da União Europeia. O governo grego tornou-se refém de suas próprias negociações. Em 2009, ano em que a crise global atingiu em cheio o país mediterrâneo, os gastos chegaram a 13,6% do PIB, percentual quatro vezes superior ao permitido pelas regras do Tratado de Maastricht. Amparada pela credibilidade como integrante da zona do euro, a Grécia continuou as negociações financiadas por bancos estrangeiros. Mesmo sem cumprir as regras fiscais, o custo para tomar dinheiro dos bancos continuou a cair. Contas antigas foram revisadas pelo então novo governo e erros contábeis revelaram um déficit ainda maior do que previsto. Ao cortarem notas dos títulos da dívida pública, as agências de rating tiveram que subir os juros para compensar o risco mais elevado. Os gastos financeiros aumentaram e incharam ainda mais as contas públicas. Antes de aderir à moeda única europeia, em 2001, a Grécia já estava desequilibrada economicamente e sofria com gastos desenfreados, dívidas elevadas e inflação. Entre 1999 e 2007, houve um aumento de cerca de 50% com os gastos públicos. Além disso, o governo grego não declarou à zona do euro parte dos empréstimos feitos, o que resultou em um excedente do limite de 60% do PIB como limite de dívida para os países do bloco. A crise global deflagrada em 2008 agravou o cenário, limitando o acesso do país ao crédito. Tornava-se iminente a intervenção de outros países, que temiam o impacto de uma suspensão dos pagamentos. Hoje, a dívida de aproximadamente 320 bilhões de euros (equivalente a R$ 1 trilhão) encontra-se na raiz da crise. Para a economista Cristina Helena, o “excesso de austeridade” pesa consideravelmente na queda acumulada de 25% do PIB, nos 26% de desemprego, no avanço da pobreza e nos mais de 170% de crescimento da relação dívida/PIB. |
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