Andressa Pessanha, Juliana Reigosa e Maria Silvia Vieira - aplicativo - Do Portal
09/06/2014Nesta quinta-feira, 12, duas diferentes gerações entraram em campo na torcida pelo Brasil. Enquanto dezenas de crianças assistiram ao jogo Brasil x Croácia em Botafogo, Zona Sul da cidade, os idosos do Lar da Velhice Israelita Religiosa, na Zona Oeste, animavam-se na sala enfeitada com bandeiras e fitas verde-amarelas. A expectativa era a mesma: a vitória do Brasil. O que conta como influência para os idosos, representantes de 16,1% da população do Rio de Janeiro, de acordo com o IBGE, é a oportunidade de presenciar mais uma Copa no Brasil. Já para a criançada, 14,3% da torcida brasileira no Rio, é quase impossível ficar fora do clima do primeiro Mundial de que vão se lembrar vida afora. Em ambos ambientes, o jogo inaugural contou com perspectivas otimistas.
No asilo, apesar de a maioria dos residentes ter assistido ao jogo nos quartos, os 27 idosos presentes na sala de TV comunitária vibravam a cada lance, principalmente nos dois últimos gols da partida, de Neymar e Oscar. Aos 84 anos, a aposentada Lourdes Ferreira estava nervosa, mas confiante. Sob seu olhar experiente em mundiais, o que não poderia acontecer novamente seria o doloroso capítulo de 1998, quando o Brasil perdeu o título para a França nos últimos minutos da partida final, em território francês. A idosa acredita na vitória brasileira e convocou a todos para “botar fé” na seleção, opinião semelhante à do jovem Samuel, de 11 anos.
O 3x1 para o Brasil e abraços calorosos entre uma das enfermeiras e seu paciente. No asilo, a diversão entre amigos só acontece na presença das enfermeiras e ajudantes. Segundo uma das funcionárias que trabalha há 34 anos no local, chamada de Chica pelos residentes, todos se tratam como membros da família, já que a visita dos parentes biológicos é praticamente inexistente.
Em Botafogo, muitas famílias com crianças se juntaram para assistir ao jogo nos bares próximos ao metrô. Júlia, mãe de Clara, de 3 anos, contou que sua filha recebeu o convite da mãe de uma colega de escola. As mães levaram cangas e tintas para deixar as meninas “bem à vontade” na calçada desenhando, enquanto os adultos assistiam ao jogo.
Se Igor Nogueira, de 13 anos, Lucas da Silva, de 11, e Ana Beatriz, de 7, elegeram Neymar como seu jogador favorito, o aposentado Samuel Fajntuch lembrou que o posto de Neymar como ídolo da Seleção já foi de Pelé, Tostão e Rivelino, que citou como jogadores indispensáveis de outros tempos. Já Sônia Birmann, de 94 anos, aposta com a nova geração no atual camisa 10.
Contudo, a Copa no Brasil suscita outras divergências. Eric, pai de Ana Beatriz, é um dos quais demostram a insatisfação com os gastos abusivos que chegaram a RS 28 bilhões, segundo o coordenador do Grupo Executivo da Copa do Mundo (Gecopa).
– Eu adoro Copa do Mundo e futebol, mas politicamente não estou satisfeito. Na década de 70, a ditadura soube aproveitar a seleção para se fortalecer. E, desde então, os governos aprenderam a usar a Copa a seu favor, ou seja, fazer do futebol uma ferramenta política para aproveitar a euforia e o entusiasmo do povo – observou.
Como nascem os torcedores
Para o professor de antropologia da PUC-Rio Bernardo Conde, a entrada do futebol no imaginário infantil se deve ao envolvimento de instituições, que fortalecem o entusiasmo dos pequenos, e a espetacularização é uma forte aliada da indução ao gosto pelo esporte. Na visão de Conde, a influência da Copa nas crianças não chega a ser intencional, mas inevitável, já que o assunto está presente em diversos ambientes frequentados por elas. Ana Beatriz, por exemplo, contou que seus colegas de classe ganharam apitos e bandeiras para torcer, e em muitas escolas houve atividades como “copinhas” e outros campeonatos.
– Sem dúvida o futebol sempre foi produzido como fenômeno e atração a partir dos jogadores. O grande ídolo passa a ser referência, um ideal e modelo principalmente para os pequenos torcedores. Um Neymar influencia até os adultos, pois é um garoto carismático. E isso é tão forte a ponto de atingir também os jovens – relata.
Conde afirma que, por mais que o Brasil seja “a pátria de chuteiras” e o futebol carregue o espírito de brasilidade, há uma confusão, criada ou estimulada pela mídia, em relação a manifestações contra a Copa.
– Há o pensamento de que as pessoas que estão se manifestando não vão torcer na Copa. Não quer dizer que, por ter uma visão crítica, não torcerão pela seleção. É evidente que vão – diz o professor a respeito do assunto.