A cidade precisa ser "reinventada", alertaram os especialistas na palestra “O Rio que queremos: jornalismo e cidadania em pauta”, em 13 de outubro, no auditório da sala 102K. O caminho passa por uma cobertura mais profunda da imprensa, observou o economista André Urani, diretor do Instituto de Estudos do Trabalho e da Sociedade (Iets). Márcio Sternick, coordenador das coberturas especiais de telejornalismo da Rede Globo, rebateu:
– Existe a tendência de atribuir à mídia uma responsabilidade maior do que ela tem. Nosso papel é de cobrar da sociedade e das autoridades públicas. Fazemos isso, mas a sociedade parece não estar estruturada para dar respostas. A gente cobra e nada acontece. O trabalho de debate é lento.
– A necessidade da imprensa de produzir o jornal diário força a mídia a não se aprofundar nas grandes questões. Temas mais aprofundados não permeiam o dia-a-dia jornalístico. Eu entendo o drama do jornalista, que tem uma agenda cheia. Mas precisamos fazer da informação uma arma – criticou Urani.
O economista fez uma avaliação mordaz do Rio. Segundo ele, a cidade está em “fase de putrefação”:
– Faz 25 anos que o PIB da cidade encolhe. O problema é que somos escapistas. O papel da mídia é fundamental para se rediscutir novos rumos para o Rio. A mídia deve se aprofundar mais na repercussão de questões de desenvolvimento humano e econômico.
Para o jornalista Paulo Marqueiro, há 20 anos na editoria Rio do jornal O Globo, a reportagem policial, por exemplo, tem de conciliar a cobertura de acontecimentos importantes com a reflexão sobre a segurança pública; com a repercussão de grandes assuntos:
– Mas a repercussão vai além de nós [da imprensa] – ressalvou Marqueiro – Quando fizemos a série “Ilegal e daí?”, por exemplo, apontamos diversas irregularidades na cidade. Algumas delas foram corrigidas, outras não.
Um dos símbolos das desigualdades cariocas, a favela precisa de uma cobertura jornalística mais abrangente, avaliou Márcio Sternick. Precisa ir "além do tiroteio":
– Precisamos, sem abdicar da segurança, buscar uma cobertura mais completa, que retrate outras expressões, outras realidades além dos confrontos entre traficantes, policiais e milícias.
O jornalista e pesquisador do Ibase Itamar Silva, morador da favela Santa Marta, reforçou a necessidade de um olhar mais amadurecido da imprensa em relação às comunidades carentes:
– A idéia de confronto, predominante na mídia, estimula a segregação. Favela também é cidade.
A desigualdade, destacou o médico Daniel Becker, da organização Rio Como Vamos, se mantém como uma das principais causas dos carência do sistema de saúde. O diagnóstico, segundo ele, passa ao largo da forma como a imprensa retrata os problemas da área:
– Num país em que 76 % das riquezas estão na mão de 10% da população, os problemas são gritantes. Prejudicam a saúde. Enquanto isso a mídia trata o assunto como se fosse uma equação: médico mais remédio igual a saúde. Não é bem assim.
Ele acrescentou que a mobilização social, incentivada pela midia, revela-se importante para a busca de soluções. “Na campanha contra o tabagismo, a sociedade vestou a camisa”, exemplificou.
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