Gabriel Camargo - aplicativo - Do Portal
23/09/2013Em um dos enormes edifícios construídos no Centro do Rio, no processo de revitalização na região, funciona o Centro de Operações Rio (COR). Imagens das mais de 560 câmeras instaladas em áreas diversas da cidade são expostas em um telão de 80 metros quadrados, que mostra o tráfego em tempo real para fiscais, representantes de 30 órgãos públicos e jornalistas. Um espaço democrático onde o trânsito carioca funciona bem, muito diferente do que acontece nas ruas.
Inaugurado no dia 31 de dezembro de 2010, já funcionando na virada para 2011, o Centro de Operações monitora o tráfego carioca 24 horas e em todos os dias da semana. A partir destas imagens, são passadas informações para a Polícia Militar, os Bombeiros, a Light, por exemplo. “É um sistema de cooperação”, define o gerente de Operações Marcelo Costa. Os cariocas, porém, continuam sofrendo com o trânsito no dia a dia, considerado o segundo pior do país, atrás apenas de São Paulo. De acordo com pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) no início do ano, o carioca perde 42,6 minutos no trajeto entre a casa e o trabalho, enquanto os paulistas levam 42,8 minutos. Os brasileiros superam outras grandes cidades do mundo também analisadas; em nível mundial, só em Xangai, na China, o tempo de deslocamento foi superior.
Alertas no mapa
No painel do centro da sala de controle, no meio dos 60 monitores, tem-se também a visão geral da cidade, via satélite. Nesta tela, quando ocorre algum acidente ou transtorno em determinada área, aparecem registros enviados policiais ou guardas de trânsito: “Existe(m) 2 acidente(s) no bairro Maracanã”. Assim que o alerta aparece na tela, um dos fiscais aperta “Enviar entendido!”, o que pode significar, por exemplo, que um carro da Light já foi enviado, caso um poste estivesse derrubado, ou que um reboque está a caminho.
Sem traumas com o Rock in Rio
Quando há um grande evento na cidade, o COR fica em estado de maior atenção devido ao volume incomum de pessoas, carros, ônibus e movimentação. Na sexta-feira 13 de setembro, dia em que o Portal acompanhou o trabalho no COR, o mapa mostrava especificamente a região ao redor da Cidade do Rock, onde teria início o Rock in Rio. Mas Marcelo não esperava muitos problemas:
– Por ser em uma região específica, fica mais fácil controlar o trânsito, as pessoas normalmente saem do Centro e seguem para a Zona Oeste na parte da tarde e depois só voltam na madrugada, um horário tranquilo para o tráfego. Problema mesmo foi na Jornada Mundial da Juventude, quando mais de 3 milhões de pessoas estavam na cidade, em várias partes e se movimentando praticamente o dia inteiro.
Engarrafamentos na Barra e na Avenida Brasil são classificados de “normais”
Para além dos megaeventos, os grandes problemas do Rio são evidenciados no Centro de Operações. O trânsito crônico nos fins de tarde na Avenida Brasil e na Barra da Tijuca já são tratados pelos técnicos como “normais”. Quando as câmeras mostram trânsito lento nestas vias, ninguém se abala, nenhuma providência é tomada.
– A Avenida Brasil deveria receber mais investimentos, mais pistas, por exemplo. Mas normalmente os investimentos são na Zona Sul e Zona Norte. Só assim para ônibus melhores passarem a circular por lá, ninguém quer tomar prejuízo.
Transporte público nem mesmo para quem o controla
Que os ônibus, trens e metrôs da cidade estão longe do ideal, todos os cariocas sabem muito bem e enfrentam dificuldades todos os dias. Porém, não é de se esperar que um dos funcionários responsáveis pelo controle do trânsito e de alguns transportes públicos também concorde com essa dificuldade.
– Você vem como para o trabalho? De ônibus?
– Eu? Não! Vou de carro mesmo. Transporte público é muito ruim – comentou Marcelo, morador de Vila Valqueire, em tom de brincadeira.
Uma carga de caneta Bic a cada dia
Três pessoas são responsáveis pela fiscalização dos ônibus em circulação. Conseguem visualizar o trajeto de todas as linhas, para verificar se estão seguindo o itinerário correto e recebem notificações de fiscais em campo sobre os intervalos entre os carros. Ali também são registradas as multas que as empresas recebem. São cerca de 50 multas por dia, anotadas à mão por um dos funcionários, que prefere não se identificar. Ele gasta uma caneta Bic por dia nesta tarefa.
– Aqui nós anotamos todas as multas, depois enviamos para Secretaria Municipal de Transportes, e é lá que as coisas se resolvem – afirmou o responsável pelas multas, com três canetas sem tinta sobre a mesa.
– E as coisas se resolvem? – pergunta o repórter.
– Você quer saber as empresas pagam as multas? Não – responde o funcionário, que será poupado das dores no pulso com a mudança no sistema, a partir de dezembro, quando as multas passarão a ser registradas eletronicamente.
Sem relações com os multados
Hoje o responsável pelas multas está no terceiro andar do prédio, mas originalmente ficava ao lado do representante da Rio Ônibus, sindicato das empresas do transporte:
– Era complicado. Eu ficava lá anotando as linhas que seriam multadas e, do meu lado, o representante da Rio Ônibus; não é uma situação confortável para ninguém. Hoje eu até brinco com ele que vou multá-lo. Mas é melhor ficamos separados, até para não levantar suspeitas: imagina se sai no jornal eu e ele, um do lado do outro?
PM tem imagens exclusivas
Se os fiscais na sala de controle têm acesso às imagens das várias câmeras que monitoram a cidade, o policial militar que atua no COR conta com dois monitores exclusivos, que mostram, além das imagens da CET-Rio, outras, captadas pela própria Polícia Militar:
– Por razões de segurança, só o PM pode ver aqueles dois monitores. É melhor não dar a chance para o azar, até porque muitos dos fiscais são terceirizados – justifica Marcelo.
Luz vermelha
Em outra parede, um pequeno mapa do Rio de Janeiro divide a cidade em quatro partes – Zona Sul, Zona Oeste, Zona Norte e Centro –, cuja cor varia de acordo com o nível de alerta em que a região se encontra: o verde é o estado de vigilância; o amarelo, atenção; e o vermelho significa alerta.
– O verde significa que está tudo normal, dentro do previsto. O amarelo indica que temos que ter mais atenção, ficar ainda mais ligados. E, se chegar ao vermelho, ferrou – traduz Marcelo, lembrando que isso aconteceu nas chuvas em 2011.
Redação no COR
De olho em todos os fiscais e câmeras da sala de operações do COR, os jornalistas, a maioria estagiários de rádios, trocam informações sobre o que o motorista deve fazer para fugir do trânsito e informam aos ouvintes.
– Às vezes aqui é muito parado. Por isso a gente faz uns escândalos, para ficar movimentado – comentou um repórter mais experiente para uma colega que estava começando a trabalhar na cobertura do trânsito.
Cooperação não só na sala de controle
Se o funcionamento do Centro de Operações se dá pela cooperação entre os muitos órgãos públicos, não é diferente na sala de imprensa. Todos se ajudam para descobrir o que estava acontecendo, independentemente da rádio para a qual trabalham.
– Muda a câmera aí e procura por que está tudo parado lá no Alto (da Boavista)! Já vou entrar ao vivo! – comentou um mais desesperado para o que estava mais perto das câmeras a que os repórteres têm acesso.
No primeiro dia de Rock in Rio, os dez jornalistas na sala de imprensa davam informes do trânsito aos locutores de meia em meia hora. Entre uma e outra chamada, dividiam o dinheiro da compra de lanches. Quando tudo parecia mais calmo, um deles desligou batendo o telefone, num desabafo:
– Agora não podemos falar “Rock in Rio”. Não patrocinamos, e agora ninguém vai ao Rock in Rio, só à “Cidade do Rock”.