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Rio de Janeiro, 30 de dezembro de 2024


Cidade

"Carros não combinam com cidades inteligentes"

Ingrid Forino - Do Portal

16/08/2013

 Caroline Goes ONU estima que o número de habitantes de cidades irá crescer, até 2050, 64% em países emergentes e 86% em países desenvolvidos. A projeção reforça a necessidade de aperfeiçoar, nos grandes centros, quatro pontos estratégicos: deslocamento, acesso a serviços, qualidade de vida e integração cultural e social. O caminho, lembra o professor da PUC-Rio e da UFSC Eduardo Costa, exige "soluções inteligentes", algumas há muito já adotadas em países desenvolvidos, dirigidas à humanização dos espaços urbanos. "Essa inteligência envolve quatro áreas: economia, meio ambiente, mobilidade e governo. Este (governo inteligente) é considerado o maior desafio", ressaltou Costa, também diretor do Ágoralab, em palestra da Mostra PUC, terça-feira passada, organizada pelo Departamento de Admistração.  

O professor usou a Gávea para sugerir como o conceito de "soluções inteligentes" pode ser aplicado. Duas propostas remetem à mobilidade: uso de carros elétricos dobráveis e de táxis, movidos também a eletricidade, que circulem só no bairro. As sugestões integram o projeto Cidades Inteligentes e Humanas, desenvolvido pelo professor e aplicado, em parte, em Florianópolis. (Veja o box.)

O estudo se baseou em modelos de "inteligência urbana", como Paris. Segundo Costa, a cidade projetada em 1860 e dividida em 20 bairros comprova a capacidade de um grande centro se livrar de congestionamento:

– Paris foi projetada para ser inteligente. Contratado por Napoleão III, o arquiteto Hausseman projetou a cidade logo antes do surgimento do automóvel. Então, ele não foi afetado pelo maior ofensor dessa lógica – recorda, referindo ao carro – Hausseman criou a cidade pensando nas pessoas e não nos automóveis. O conceito era: as pessoas devem morar, trabalhar, se conectar e se divertir no mesmo lugar. Entretanto, nós fomos influenciados pela necessidade do automóvel e fizemos exatamente o oposto: separamos as funções e nos deslocamos de um lugar para o outro de carro. Agora precisamos reverter essa situação. 

 Caroline Goes Na opinião do especialista, engarrafamentos quilométricos tornam-se os principais obstáculos rumo a ambientes urbanos com melhor qualidade de vida:

– Este não é o único sintoma de anomalia, no entanto é o maior inimigo – afirma – Chegamos à beira do caos. São Paulo, por exemplo, emplaca 800 novos veículos por dia. Para anular esse avanço do volume de carros nas ruas, a cidade teria que construir quatro pistas de 400 metros, todo dia, inviável. 

Planejar novas rodovias não é, para o especialista, a trilha mais indicada: "Refletir a mobilidade de pessoas, instalações bem distribuídas, próximas à população, é um caminho mais eficiente e inteligente", aponta. Ele lembra que as soluções urbanas precisam ser pensadas com poder público. Como o Porto Maravilha, observa Costa:

– A Prefeitura do Rio, com o apoio do governo estadual e do Ministério do Turismo, investiu nesse projeto, para requalificar a área portuárea e unir trabalho e serviços no bairro residencial – destaca – Outra medida importante é a mudança de legislação necessária para aplicar esses conceitos de cidade inteligente. O poder público tem como função regular a atividade inteligente e permitir que o setor privado invista. 

Já em relação ao metrô, cujas obras chegaram à Gávea, Costa reconhece a importância para se avançar na qualidade do transporte público, mas pondera: "É necessário estar preparado para o que vem depois. Conjugar o metrô com novas necessidades urbanas e com outras opções de deslocamento".

A mudança para um modelo urbano mais inteligente dificilmente é rápida, admite o pesquisador. Ele diz, no entanto, otimista em relação à capacidade de o Rio "chegar lá" em 20 anos:

– Imagino uma perspectiva positiva, e estou trabalhando para isso. Uma cidade com dois ou três lugares fantásticos para morar, com pouca circulação de carro, que ofereça melhor mobilidade e mais proteção. Vejo o Rio de Janeiro caminhando nesse sentido. 

 

"Gávea precisa incentivar e legalizar a indústria criativa"

Embora reconheça os aspectos aprazíveis da Gávea, Eduardo Costa avalia que o espaço de 2,5 milhões de metros quadrados na Zona Sol carioca, com 500 mil de área verde, precisa de  "muitos ajustes" para se tornar "inteligente". Mobilidade eficiente, indústria criativa, moradores responsáveis, lazer centralizado e cuidados com o meio ambiente são, segundo ele, os cinco pontos de partida básicos. Costa avalia que a Gávea tem uma economia desenvolvida, mas ressalva: para se expandir, precisa de mais apoio:

– A Gávea já tem uma indústria criativa, entretanto é sustentada, em parte, pela informalidade. Deveria haver mais incentivo para legalizar essas atividades.

Outro ponto importante para melhorar a qualidade de vida urbana remete ao que Costa chama de "pessoas inteligentes", tópico central do projeto desenvolvido e aplicado pelo professor em Florianópolis. Na prática, significa criar condições para uma rotina mais inteligente: estudar, trabalhar e se divertir na região onde moram. Para ajustar na Gávea as ações do gênero implantadas na capital catarinense, o pesquisador aponta o custo da moradia como o maior desafio:

 O mercado imobiliário é incoerente: todo mundo acha que seu imóvel vale mais do que realmente vaçe e o preço sobe muito – opina – Mas, com um pouco de criatividade, solucionamos o problema: como a Gávea tem muitas casas grandes fechadas, um dos recursos seria alugar quartos – sugere.

Igualmente estratégica para a "inteligência urbana", a mobilidade exige, ainda de acordo com professor, alternativas para compensar as crônicas deficiências do transforte público. Costa propõe duas soluções criativas: um carrinho elétrico dobrável, que, além de "sustentável", economiza espaço; e um táxi elétrico – modelo que começa, gradualmete, a ser adotado no país – com preço fixo para circular apenas dentro do bairro. "Digamos que a tarifa seja de cinco reais. Com esse valor, você é levado para qualquer lugar no raio que contorna o bairro", exemplifica Costa.

A PUC-Rio se inclui no pacote de sugestões do professor para deixar a Gávea "mais inteligente". Crítico mordaz do automóvel como principal meio de transporte, Costa acredita que parte do estacionamento da universidade deveria ser usada para fins mais proveitosos. "Não faz sentido ter automóvel parado em um local que precisa de mais espaço", argumenta.

Já o projeto de recuperação do Rio Rainha, que corta o campus, representará um avanço para a região, ressalta Costa. Aos que consideram difícil a tranformação de áreas urbanas em espaços mais "inteligentes", o que requer uma coordenação de esforços públicos e privados, o pesquisador lembra o exemplo de Brasília:

 Em dois anos e meio, a capital mudou do Rio para Brasília. Perto disso, fazer um projeto como o de Cidades Inteligentes na Gávea é fácil.