Igor Novello e Vítor Afonso - Do Portal
03/07/2013Baixada a euforia pela conquista verde-amarela da Copa das Confederações, 3 a 0 sobre os poderosos espanhóis, sob 73 mil olhares num renovado Maracanã, cartolas da Fifa e autoridades brasileiras fazem um balanço sobre o torneio-teste para o Mundial do próximo ano. Avaliam que a onda de protestos – parte deles contra o uso de dinheiro público em estádios – não prejudicou o êxito da competição, cuja final, domingo passado, transmitida para mais de 60 países, reuniu o tão esperado confronto entre A Fúria, campeã mundial, e o pentacampeão Brasil. Por outro lado, reconhecem que há vários pontos a melhorar no campo dos serviços, a começar pelo sistema de venda de ingressos, uma bola fora unânime: frustrou consumidores, cronistas e até organizadores. A cidade, que troca os torcedores pelos peregrinos da Jornada Mundial da Juventude, de 23 a 28 deste mês, também é objeto de avaliação, sobretudo em relação à segurança e à mobilidade urbana.
Enquanto especialistas e gestores contabilizam as derrotas e vitórias observadas durante a Copa das Confederações – por exemplo, o uso do metrô por mais de 35 mil dos que foram à decisão no Maraca é considerado posititivo –, o Portal PUC-Rio conversou com estrangeiros que vieram ao Brasil nesse período de futebol e manifestações populares. Faz-se necessária, contudo, uma ressalva: a competição da Fifa, embora tenha enchido os estádios (média de 47,8 mil torcedores por jogo), não impulsionou o turismo. Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Rio de Janeiro (ABIH-RJ), a ocupação hoteleira para esse mês de Copa ficou em cerca de 60%, resultado “abaixo do esperado”. No fim de semana da final, a ocupação chegou a 80%. Além disso, o Ministério do Turismo estima que 38% dos turistas nacionais ou estrangeiros que vieram assistir aos jogos se hospedaram em casa de parentes e amigos.
Mesmo com números pouco animadores, o país viveu a presença estrangeira dentro e fora dos estádios. O mexicano Diego Varela, 21 anos, veio assistir à estreia de sua seleção no torneio, contra a Itália, no Maracanã. Apesar da derrota (2 a 1), ele se diz satisfeito com a organização:
– Achei tranquilas a compra de ingressos e a ida para o Maracanã. Foi positiva também a ajuda que os voluntários deram perto do estádio e no metrô, por exemplo.
O Aeroporto Internacional Tom Jobim revela-se ainda uma barbada no ranking do descontentamento. Levou cartão vermelho de Varela: “velho e sujo”, decreta o visitante mexicano. Já o metrô do Rio, segundo ele, mostra-se “eficiente”:
– O metrô me pareceu moderno e com um preço justo para o serviço oferecido.
Esta também foi a impressão do argentino Manoel Atammer, de 39 anos. Criticado pela cobertura restrita da cidade e pelo preço considerado excessivo por usuários cariocas, o metrô recebeu elogios do argentino. Embora tenha achado cara a passagem, Atammer afirma ser "melhor do que na Argentina":
– O metrô na Argentina custa menos de um real. Porém, o metrô no Brasil atende bem as necessidades e é maior e melhor do que o da Argentina. Além disso, aqui o metrô é menos concorrido, porque lá é muito utilizado, pela baixa tarifa.
A alimentação também passou no teste do hermano. Para ele, os preços cobrados “estão de acordo com o que é oferecido”. Quanto à segurança, Atammer diz que se sentiu protegido. Viu as manifestações só pela TV. Garante que nem os atos de vandalismo, minoritários, o intimidaram a ficar no hotel:
– Não fiquei preocupado em estar aqui nesse momento. Na Argentina, esse tipo de manifestação é muito comum. Estou acostumado.
Também acostumado com manifestações em seu país, o venezuelano Ottnayver Cadena, 36 anos, esteve em Fortaleza e aproveitou para torcer pela seleção espanhola contra a Nigéria. Na avaliação dele, os aeroportos deram conta do recado neste período, mas alerta:
– Acho que o tamanho (dos aeroportos) é pequeno para o fluxo de visitantes previsto para a Copa do Mundo de 2014.
O cartão vermelho foi para o custo de vida. O venezuelano admira a atenção tradicionalmente dedicada ao visitante pelos brasileiros, mas avalia que, por outro lado, o "país está caro, e não é preparado para receber turistas de baixa renda”.
Australiano: o Brasil da mídia é diferente do Brasil real
O australiano Angus Samia, 28 anos, veio pela primeira vez no Brasil. Depois de passar dois dias em São Paulo, chegou ao Rio na terça-feira passada (25). Surpreendeu-se com a “proximidade cultural” entre Brasil e Austrália. Ele acredita que a imagem transmitida do Brasil não corresponde à realidade:
– Reparei que a mídia, de forma geral, apresenta o Brasil e o Rio como lugares mais perigosos e violentos do que realmente são. As manifestações, por exemplo. Vi pela televisão, mas não tive contato direto nem aqui no Rio, nem em São Paulo.
Mesmo familiarizado com belezas naturais, o australiano impressionou-se, ao passear por Copacabana, com os encantos cariocas. Mas também atacou o custo de vida: “o Rio é uma das cidades mais caras do mundo”:
– Ouvia que o Rio era uma cidade muito cara, uma das mais caras do mundo. E pude confirmar isso aqui. Tinha a sensação de que poderia ser mais barato do que diziam. Mas isso não ocorreu. Os serviços, no geral, são muito caros.
O economista Fabio Giambiagi, do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES), admite que o balanço feito por visitantes procede. Para ele, os serviços no país estão caros, e uma viagem para o Brasil "sai a um preço elevado":
– O hotel três estrelas custa mais em dólares aqui do que na Ásia. Os cinco estrelas custam mais aqui que na Europa. Jantar em um bom restaurante é mais caro aqui do que nos Estados Unidos. Além disso, as passagens para viagens internas são muito caras – compara.
Para Samia, o único serviço que se salva, em relação ao custo-benefício, é a alimentação:
– O preço é bom, pelo que é consumido. Nem caro, nem barato. Está de acordo com o que é oferecido.
O argentino Darío Gullart, 33 anos, reforça o time dos descontentes com os preços. Ele até alivia para os alimentos, cujos preços estão “similares aos cobrados na Argentina”, mas reclama que as excursões pela Cidade Maravilhosa encarecem a viagem:
– Achei as excursões muito caras. Paga-se muito pela visita aos pontos turísticos do Rio.
Já em relação ao transporte público, Gullart concorda com o conterrâneo Atammer. Ela ressalva que, apesar de mais caro, o serviço é melhor:
– O serviço de transportes está muito melhor do que na Argentina. É mais limpo, mais novo e tem melhor orientação.
Visitante reforça necessidade de melhorar serviços de Saúde e Educação
Mazin Al-wahaibi, 22 anos, natural do Omã, veio ao Brasil para um intercâmbio na Escola de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro. Aproveitou para assistir à partida entre Espanha e Taiti, no Maracanã (10 a 0 para os campeões mundiais). O jovem, que trabalha em seu país na área da Saúde, reforça algumas das principais cobranças apontadas nas manifestações país afora:
– Vejo que isso (serviços públicos de Saúde) é algo que precisa melhorar muito no Brasil. Há muitas deficiências. Assim como a Educação, que também precisa melhorar, sobretudo, no ensino do inglês.
O omaniano considera razoável, para os estrangeiros, o preço pago pelos serviços no Rio. Mas, na avaliação dele, o custo de vida para os cariocas revela-se elevado. Além disso, Al-wahaibi critica os transportes públicos:
– Os ônibus são velhos e não têm um horário fixo para partir de determinado local. Além disso não tem um transporte que integre bem e facilite o acesso ao aeroporto.
Giambiagi lembra que o aperfeiçoamento dos serviços é, independentemente da Copa, imprescindível para o país atrair mais o visitante estrangeiro e transformar esta procura em maiores ganhos financeiros:
– Precisamos fazer um esforço intensivo na melhora dos serviços. Isso envolve também ampliar consideravelmente a proporção de pessoas que falam inglês, algo terrível hoje. É preciso também melhorar o atendimento aos turistas. E, obviamente, temos que investir na dupla formada pelos hotéis e aeroportos.
Sobre o custo de vida, considerado alto por estrangeiros e moradores, o economista pondera que as razões vão além de fatores cambiais e monetários. Para ele, a "baixa produtividade brasileira" interfere nesse cenário:
– Quando uma empresa produz uma quantidade alta de um produto, o seu custo de produção se divide e o custo por unidade acaba sendo baixo. Quando a produtividade é baixa, não há muitos produtos pelos quais distribuir o custo e esse valor unitário é alto – explica.
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