Quando veio à PUC-Rio para o seminário “Estética: encontro entre TV e cinema nas minisséries da TV Globo”, no ano passado, a autora Glória Perez fez uma provocação bem-humorada aos estudantes: “Soube que vocês terão que adaptar um conto de Machado... Estou com pena de vocês. É muito difícil.” Depois de um ano e meio entre roteiros, filmagens, edições, o desafio ganhou a tela. O curta-metragem “Noites de Almirante”, de Bruno Mello, foi exibido no no Canal Futura e no no Estação Vivo Gávea (Shopping da Gávea), em setembro.
– Mesmo feito por uma equipe de alunos, o filme tem um perfil profissional, que coroa um esforço de um ano inteiro – avalia o professor Marcelo Taranto, produtor executivo do filme.
Parceria entre o Globo Universidade e a PUC-Rio, o curta de 40 minutos foi apresentado em três salas do Estação Vivo estarão disponíveis para apresentar o curta de 40 minutos. Antes da exibição, os convidados conversaram com os responsáveis pelo filme, como o diretor e o produtor Marcelo Taranto, que orientou os 30 alunos desafiados a adaptar um conto de Machado para microssérie de quatro capítulos. Tiveram de escolher entre “Um Apólogo”, “Noite de Almirante”, “O Espelho”, “Contos de Escola” e “O Homem Célebre”.
A difícil e grafiticante tarefa – homenagem ao centenário de morte do escritor – arrematou a disciplina “Estética: encontros entre TV e cinema nas minisséries da TV Globo”, do curso de Cinema. Com a proposta de discutir a convergência entre televisão e cinema, tendo como base as minisséries da TV Globo, 25 palestras reuniram 37 profissionais da área, entre roteiristas, autores, diretores, executivos de produção e de fotografia, cenógrafos, figurinistas e editores. A orientações, por exemplo, de Luis Fernando Carvalho, Alcides Nogueira, Glória Perez e Daniel Filho ajudaram a consumar a ambição de adaptar Machado para a tevê.
Dos 22 roteiros elaborados pelos estudantes, prevaleceu o de Bruno. Foi escolhido por uma banca de especialistas, presidida pelo coordenador do curso de Cinema, Miguel Pereira. Dela participaram Alcides Nogueira e Geraldo Carneiro, autores da TV Globo, o cineasta e professor Walter Lima Jr. e o crítico de cinema e professor Fernando Ferreira.
– Achei a história do conto ("Noite de Alimirante") a melhor, a mais bem definida – justifica Bruno – Quando soube que meu roteiro havia sido escolhido, fiquei nervoso com a responsabilidade de dirigir um filme tão grande. Mas deu tudo certo.
Para Miguel Pereira, coordenador do concurso, Bruno sobressaiu porque captou a contemporaneidade de Machado de Assis:
– A idéia dele foi muito interessante e original. A sutileza Machadiana está no filme. Bruno conseguiu, nas entrelinhas, passar o espírito irônico, a frustração humana e uma certa melancolia do autor. Ao mesmo tempo em que o personagem do filme chega ao êxito, chega a frustração – avalia o professor.
O título no plural (“Noites de Almirante”), em relação ao texto de origem , refere-se às duas tramas entrelaçadas no curta: a do personagem principal do filme, Cláudio, e a do personagem principal do conto, Deolindo. O conto relata a história do marinheiro Deolindo. Três meses antes de viajar, conhece Genoveva. Apaixonados, fazem um juramento de fidelidade. Quando retorna, descobre que ela estava com outro homem. Envergonhado, não conta a nenhum de seus amigos a traição e deixa a entender que teve uma grande “noite de almirante” com a mulher. Já o filme conta a história do diretor Cláudio, que recebe a proposta de adaptar o conto de Machado para um curta-metragem. “É um filme dentro do filme.”, resume o diretor, recém-formado pela PUC-Rio.
O personagem interpretado por Fernando Alves Pinto (de “Terra estrangeira”) encontra dificuldades, mas consegue concluir o curta e ganha até um prêmio. O conto, segundo Bruno, imprime várias mudanças interessantes na vida de Cláudio. "Para descobri-las, só assistindo ao filme", covida o diretor.
Com orçamento de R$ 100 mil, dividido entre a Rede Globo e a PUC-Rio, a produção do curta-metragem ilustrou o espírito acadêmico: criou-se uma nova disciplina para a qual todos os alunos participantes do concurso de roteiros foram convidados. Orientados por Marcelo Taranto professor da PUC-Rio, superaram a inexperiência e transformaram o trabalho num grande aprendizado.
– Os alunos tiveram de lidar com prazos rigorosos e limitações. O filme mudou a vida profissional dos alunos que participaram deste projeto inovador. Agora, se sentem confiantes para fazerem outros filmes. Alguns já trabalham em produtoras – conta Taranto,
As filmagens transcorreram nos primeiros 15 dias de dezembro do ano passado. A maioria das cenas foi gravada em um loft em Santa Teresa, a casa do personagem principal. Outras, no Jardim Botânicona, na Ilha Fiscal e na própria PUC-Rio. O set foi um pouco tumultuado, já que ele se sentiu inexperiente , mas adorou a experiência:
– Foi maravilhoso. Mas reconheço que fiquei nervoso ao tentar controlar e organizar tudo no set. Pesou um pouco a inexperiência – admite Bruno.
A montagem começou logo depois do fim das filmagens e se estendeu até março desse ano, quando foi iniciado o corte final. A parte mais demorada e trabalhosa, lembra o diretor, foi a pós-produção, concluída em agosto. O processo, diz Taranto, representa "um divisor de águas" para o curso de Cinema: "Simboliza um comprmisso em buscar novas formas de melhorar o desempenho e a formação dos alunos."
“Noites de Almirante” não foi a primeira produção de Bruno. Ele já tinha feito “Imerso”, para a disciplina “Projeto de Filme 2”. O curta, de 16 minutos, será exibido no Festival do Rio, na mostra Hors-Concours (curtas).
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