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Rio de Janeiro, 30 de dezembro de 2024


Cidade

A custo quase zero, bicicleta avança no Rio

Sarah Bazin* - Da sala de aula

21/06/2013

 Jefferson Barcellos

Cada vez mais pessoas escolhem a bicicleta como meio de transporte diário no Rio. Apesar de o carioca ter uma malha cicloviária de 285 quilômetros em operação, e o município ter a pretensão de se intitular a capital da bicicleta, quem está na bike precisa enfrentar ruas movimentadas de pedestres e carros que dificultam a locomoção. Nada disso parece desmotivar os novos adeptos, nem os movimentos pró-ciclovia que se mobilizam por um trânsito amigável e por uma cidade mais sustentável, como o Respeite: um carro a menos, o Transporte Ativo e o Ciclovia já Laranjeiras e Cosme Velho e o sistema Bike Rio, que supera 1 milhão de viagens por dia.

Esses movimentos pedem mais ciclovias na cidade, que tem um dos planos cicloviários mais antigos do mundo, mas não investiu em sua continuidade. O plano surgiu em 1992, com as ciclovias da orla da Zona Sul, dado que rendeu à cidade o 18º lugar no ranking Copenhagenize, que lista as melhores cidades para se andar de bicicleta no planeta. Mas as ciclovias de Copacabana, Ipanema e Leblon, assim como a que circunda a Lagoa Rodrigo de Freitas, foram todas pensadas para o lazer, e não para o transporte do dia a dia. Os bairros mais turísticos são os que têm a maior malha cicloviária.

Regiões versus ciclovias

A região de Botafogo, que engloba ainda os bairros do Flamengo, Laranjeiras, Cosme Velho, Catete, Glória e Urca, tem uma população de 239.729 habitantes, de acordo com levantamento da Prefeitura em 2010, uma das de maior densidade demográfica da cidade, mas com ciclovias apenas no Aterro do Flamengo, da Praia de Botafogo até a Vermelha e em duas ruas do bairro de Botafogo, interrompidas no meio.

Arquivo Portal  Outras duas regiões com grande densidade demográfica são as da Tijuca e de Vila Isabel, que juntas contam com uma população de 371.120 (181.810 da Tijuca e 189.310 de Vila Isabel). Mas lá a quantidade de ciclovias é quase nula. Se um bairros como Usina, Vila Isabel e Andaraí não existe uma única faixa, na Tijuca só há espaço exclusivo para bicicletas no entorno do estádio do Maracanã. O único bairro que faz parte da região e que tem uma malha cicloviária é o Grajaú. Já a região de Copacabana, a mais turística da cidade, tem a maior malha cicloviária do Rio, além do maior número de bicicletários, embora menor número (161.191) de habitantes.

Aumento da malha cicloviária

Grandes eventos como a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos estão injetando enorme quantidade de dinheiro na economia do Rio, e um dos projetos que fazem parte da reforma pela qual passa a cidade é o Porto Maravilha. Esse projeto prevê um incremento de 17 quilômetros de ciclovias na região do Centro, que também ganhará Veículos Leves Sobre Trilhos (VLTs), trens de superfície com baixo teor de emissão de gás carbônico. Tudo isso está no plano da prefeitura para tornar a cidade um lugar mais sustentável e diminuir o fluxo de veículos pela região e, consequentemente, o trânsito.

Se a prefeitura aprova projetos para novas ciclovias no Centro, a área de Botafogo não recebe a mesma atenção. Maysa Blay, coordenadora do movimento Ciclovia já Laranjeiras e Cosme Velho, reclama que o governo não tem planos para Laranjeiras, bairro onde pesquisas do grupo mostram que quase 3 mil bicicletas transitam diariamente pelas ruas:

– Enviamos para a Câmara dos Vereadores um projeto para ciclovias que está em processo de apreciação, mas a prefeitura não tem nenhum projeto para o bairro, nem para bicicletas, nem para pedestres espremidos em calçadas ridiculamente estreitas, nem para a redução do número de carros.

O respeito

Maysa traz outra questão para discussão: o respeito ao ciclista. Não basta fazer ciclovias ou ciclofaixas, é preciso a conscientização da população para que se tenha uma aceitação por parte de todos; falta se construir uma cultura de respeito ao ciclista. Carros e motos invadem a ciclofaixa, pedestres não respeitam a ciclovia, e a distância de segurança de 1,5m em locais onde não há via para bicicletas não é respeitada.

Para a estudante de cinema da PUC-Rio Stephania Imperial, que faz seu trabalho de conclusão de curso sobre bicicletadas no Rio, a aversão às bicicletas por parte de pedestres e motoristas só vai diminuir com ações por parte do governo:

 – Seria interessante se fossem feitas campanhas como as que feitas na época de implantação do BRT, com panfletos, fiscais explicando o trajeto e o que se pode e o que não se pode fazer, além de mobilizações dentro dos ônibus distribuindo panfletos com o Código de Trânsito Brasileiro. Seriam necessárias palestras para a Guarda Municipal com dicas de como agir diante dessa nova onda de ciclistas que invadem – no bom sentido – a cidade.

O próprio ciclista também têm deveres durante a locomoção. Os pedestres têm prioridade nas ciclovias compartilhadas, mas o artigo 68 do código diz que “o ciclista desmontado empurrando a bicicleta equipara-se ao pedestre em direitos e deveres”. Isso quer dizer que, em ciclovias não compartilhadas, essas pessoas podem estar na calçada.

Eduardo Ribeiro  Mas parte dos automóveis o maior desrespeito e a ameaça mais grave e perigosa aos ciclistas. Muitos motoristas invadem a ciclofaixa, atravessam o espaço reservado sem cerimônia e em alta velocidade ou não respeitam a distância de 1,5m que devem manter da bicicleta em áreas sem ciclovia. A infração para estacionamento em ciclovias ou faixas é grave, prevê multa e remoção do veículo; transitar em ciclovias é uma infração gravíssima e prevê multa; deixar de guardar a distância (1,5 metro) ao passar ou ultrapassar a bicicleta é infração média, também com multa.

Stephania alerta que o mais importante é a fiscalização.

– Para resolver o problema, só com uma campanha muito forte por parte do estado, só assim as pessoas vão perceber que o respeito realmente é necessário.

Bicicletas elétricas

As bicicletas elétricas são um bom meio para quem precisa percorrer distâncias maiores, porém existe uma polêmica sobre onde elas devem circular, já que a velocidade alcançada chega a 40Km/h, o que já a qualifica como automóvel.

  O debate ganhou visibilidade quando um ciclista em uma bicicleta elétrica foi parado pela Lei Seca, em Copacabana, e recebeu multa por dirigir sem habilitação e capacete. A prefeitura voltou atrás na decisão de multar o cidadão, porém a Procuradoria Regional da República no Rio discorda da decisão.

Os governos municipal e federal discordam em relação a como se deve tratar as bicicletas elétricas. Para a prefeitura, o novo modelo se equipara às bicicletas normais, porém apenas maiores de 16 anos poderiam usá-las. Para o Conselho Nacional de Trânsito (Cotran), as bikes elétricas fazem parte da família dos ciclomotores e por isso o motorista precisa ter habilitação (CNH) e o veículo, ser emplacado e licenciado, sob risco de multa e apreensão.

Maysa Blay acredita que sim, as bicicletas elétricas são diferentes das normais:

– Acho que deve ter habilitação e emplacamento, pois elas potencialmente expõem o condutor e os pedestres a maiores riscos. Mas acho a bicicleta elétrica uma solução intermediária interessante. Preferimos ruas com muitas delas a um engarrafamento de milhões de automóveis com um só passageiro.

As bicicletas do Itaú

Os trâmites legais ainda estão em processo de análise pela Procuradoria Geral da República. Mas uma solução interessante para encobrir longas distâncias sem pegar muito trânsito e fazendo de uma forma saudável foi dada pelo governo municipal.

 Jefferson Barcellos As bicicletas laranjas do Bike Rio ganharam o coração do carioca, seja para o lazer ou para o trabalho. Com bases espalhadas pela cidade e próximas a estações de Metrô, o sistema funciona mediante pagamento de mensalidade (R$ 10), por cartão de crédito.

Um dos problemas é que elas não foram planejadas como um meio de transporte, e sim para o lazer. Assim, as estações não comportam a procura. As reclamações vão desde “não tem bicicleta no terminal” até “quero deixar minha bicicleta, mas o terminal está cheio”.

Mas isso não impede a professora de ioga Camille Serpa de pedalar todos os dias com elas:

– Moro no Grajaú, pego o metrô para o Flamengo e de lá só ando de bicicleta pela Zona Sul. Trabalho também em Copacabana e no Humaitá, e faço todo esse trajeto de bike. Economizo tempo, além de o trânsito ser infernal e estressante. Como não tenho como vir com uma bicicleta pessoal, já que não existe ciclovia unindo Zona Sul e Zona Norte e porque durante a semana não se pode entrar com a bike no metrô, as laranjinhas são a minha salvação.

O recado de Copenhague

Com qualidades para se tornar a capital da bicicleta, o Rio precisa se empenhar para isso. A Copenhagenize deixou um recado para a cidade: “O número de carros nas ruas está subindo e é preciso de ação para que isso pare. O que o Rio fizer para implantar a infraestrutura até a Copa de 2014 e os Jogos de 2016 é o que vai determinar o futuro das bicicletas na cidade. O mundo está de olho Rio. Faça a coisa certa”.

* Reportagem produzida para a disciplina Laboratório de Jornalismo da professora Carla Rodrigues.