Gabriel Camargo e Rodrigo Serpellone - Do Portal
17/06/2013Diante dos casos de violência registrados na última semana em manifestações em São Paulo, e da expectativa de novos confrontos nos protestos agendados para esta segunda-feira, 17, em todo o país, o Centro Acadêmico de Direito da PUC-Rio se organizou para garantir os direitos dos manifestantes na passeata da Candelária. O CA foi ao Tribunal de Justiça do Rio para pedir um habeas corpus preventivo coletivo em favor dos manifestantes. O professor João Ricardo W. Dornelles, coordenador-geral do Núcleo de Direitos Humanos da PUC-Rio, é um dos advogados que ofereceram voluntariamente assistência jurídica aos estudantes durante o protesto, a fim de evitar excessos. Ele também é um dos idealizadores de uma lista contendo orientações sobre como proceder em caso de detenção para averiguação, e os limites da conduta policial, divulgada pelo facebook do Centro Acadêmico Eduardo Lustosa (leia abaixo).
– Grupos de advogados estão se articulando para esta espécie de “S.O.S Jurídico de Direitos Humanos”. Não só a Comissão de Direitos Humanos do Rio; são diversos grupos em todo o Brasil. Enviei para diversas partes do Brasil um roteiro de como agir do ponto de vista jurídico e algumas medidas preventivas. A ideia é dar um apoio, uma proteção para quem vai à manifestação. Outros advogados estão de plantão, e também na OAB. Alguns estarão circulando pela manifestação, para, se necessário, tomar alguma decisão jurídica imediatamente – afirmou Dornelles na tarde desta segunda-feira, a caminho da Candelária.
Em 2011, a Marcha da Maconha conseguiu um dos primeiros Habeas Corpus preventivos coletivos do país. O então desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro Luis Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho, que concedeu esta liminar, afirma que este é um caso semelhante, pois "ninguém que esteja manifestando pacificamente pode ser preso em flagrante", desde que não cometa atos de violência.
– Aquelas cenas de violência policial desmedida, sem cabimento, mostraram que a polícia não está preparada para manejar armas. Numa manifestação dessas, seria importante ter o Habeas Corpus antes. No caso da Marcha da Maconha, a PM batia e prendia os manifestantes. Mas depois da liminar, a PM acabou só acompanhando de longe a manifestação. Em determinadas situações, é melhor que a PM nem fique perto.
É o caso de São Paulo, onde o governador Geraldo Alckmim retirou as tropas de choque das ruas durante as passeatas. Neste estado, porém, o Tribunal de Justiça negou o pedido de Habeas Corpus preventivo coletivo criado por estudantes e centros acadêmicos, em uma situação parecida com a do Rio. O desembargador paulista Mário Devienne Ferraz alegou que "os motivos invocados não permitem entrever a presença dos requisitos necessários para o deferimento da liminar requerida". Ele reconhece que os manifestantes pretendem protestar pacificamente, mas afirma que "as autoridades não autorizam e nem incentivam abusos por parte daqueles diretamente encarregados do policiamento preventivo e repressivo".
Vários advogados de direitos humanos aderiram à causa da manifestação e se solidarizaram. Durante todo o dia foram compartilhados números de telefone nas redes sociais, oferecendo atendimento voluntário na passeata. Foi criada no facebook a página Habeas Corpus Movimento Passe Livre Manifestação 17/6, com orientações sobre como proceder e oferecendo advogados para auxiliar os manifestantes.
A Faculdade de Direito da UFRJ, na Praça da República, também anunciou que abriria as portas para abrigar manifestantes em risco. Por ser um prédio federal, é proibida a entrada de qualquer policial militar armado.
Nas redes sociais, além de ensinar a se proteger do gás lacrimogênio (usando um pano embebido com vinagre ou confeccionando uma máscara com garrafa pet), outra dica de segurança foi usar a bandeira nacional em volta do corpo para evitar possíveis ataques da polícia. Eles citam o artigo 44 do decreto-lei nº 898 da Constituição Federal: “destruir ou ultrajar a bandeira, emblemas ou símbolos nacionais, quando expostos em lugar público. Pena: detenção, de 2 a 4 anos”.
Em São Paulo, uma central também vai atender os manifestantes que precisem de ajuda jurídica. Se forem presos, eles devem ligar e passar os dados (nome completo e RG) e para qual delegacia foram levados, a fim de que os advogados voluntários saibam onde devem atuar.
Lista de orientações jurídicas para os manifestantes, enviada pelo professor João Ricardo Dornelles: 1. A polícia pode te deter, por alguns minutos, para “averiguação”. Ou seja, para verificar se você está carregando bombas, armas, drogas, etc. A polícia não pode te prender para averiguação, te jogar em um camburão e te levar para a delegacia; 2. Se você for pego cometendo algum crime (independente das razões para isso), você poderá ser preso. Se você estiver portando drogas, bombas, armas ou estiver depredando o patrimônio público, a polícia pode te prender e te levar para a delegacia; 3. Você tem o direito de permanecer calado diante de qualquer pergunta, de qualquer autoridade. Você também tem direito, na delegacia, de contar com o auxílio de um advogado. Se você for preso, levado para a delegacia e quiserem tomar o seu depoimento, exija um advogado presente. Se não permitirem a presença de um, dê como declaração o seguinte: “Permanecerei em silêncio, porque me foi negado o direito de ter um advogado acompanhando este ato”. Isso tem que ficar documentado no papel. Se o delegado ou o agente da polícia civil se negar a colocar isso no papel, não assine nada. 4. Na delegacia, leia tudo antes de assinar. Se o que estiver escrito não for a realidade, ou se você não disse alguma coisa que está escrita, não assine. 5. Se você for preso, não adianta discutir com o policial. Não reaja. Anote o nome de todos. Grave-os na sua memória. Se você vir alguém sendo preso, filme. E, se souber o nome de quem está sendo preso, colete outros nomes ao redor, com telefone para contato, que poderão no futuro servir de testemunhas. Após, entre em contato com a pessoa que foi presa e repasse as informações. 6. Qualquer revista da polícia, em você ou em mochilas, deve ser feita na presença de todos. A polícia não pode pegar a sua mochila e verificá-la longe dos olhos de todos. 7. Se você estiver machucado, exija atendimento médico imediato, mesmo antes de ir para a delegacia. A sua saúde deve ser mais importante do que a sua prisão. 8. Se alguém foi preso ou está precisando de auxílio de algum advogado, entre em contato pela página “Habeas Corpus Movimento Passe Livre Manifestação 17/6”. Já somos mais de 4 mil dispostos a te ajudar, gratuitamente. 9. E o mais importante: viu alguém sofrendo qualquer tipo de abuso? Filme. A polícia levou a mochila para revistar, sem o acompanhamento de ninguém? Filme. Viu alguém sendo preso por portar coisas legais, como vinagre ou máscaras? Filme. Anote o nome dos policiais que abusarem. Se ele não estiver portando alguma identificação, tire uma foto. Depois buscaremos, com esses dados e com essas provas, a responsabilização do Estado e do policial que cometer os abusos. |