Monique Rangel - Do Portal
28/02/2013Parece que foi ontem, mas já faz quase uma década que o Brasil não concorre ao Oscar na categoria melhor filme estrangeiro. A última vez foi em 2004, com Cidade de Deus, de Fernando Meirelles. Na época fazia quatro meses que o jovem Daniel Dreifuss, recém-formado em publicidade na PUC-Rio, tinha chegado aos Estados Unidos com um objetivo: contar histórias na telona. Hoje produtor independente
O longa chileno No narra a campanha que, em 1988, decidiria o futuro do país, em um plebiscito realizado para a população votar si ou no quanto à manutenção do ditador Augusto Pinochet no poder. Daniel conheceu o projeto em um pitching (apresentação de ideias e negócios).
– Decidi produzi-lo por dois motivos: pela proximidade com minha experiência pessoal e da América Latina e pela atualidade do tema com o momento em que vivemos.
Filho do sociólogo uruguaio-brasileiro René Dreifuss, autor de 1964: A conquista do Estado, morto em 2003, o jovem de 34 anos cresceu em um ambiente politizado e se lembra bem do movimento pelas Diretas Já, do primeiro voto da mãe e das histórias de professores que foram presos durante o regime militar. “Quando fui para os Estados Unidos, fiquei na casa de uma amiga da minha mãe, que era viúva da ditadura chilena”, recorda.
Para Daniel, No é um filme atual porque aborda a capacidade de mobilização:
– Logo no começo do projeto estourou a Primavera Árabe. Pensei em como poderia servir de inspiração mostrar o que os chilenos fizeram pela liberdade de expressão e por uma mudança social sem a rapidez da internet. Hoje, as pessoas podem fazer mais com o uso da tecnologia e das mídias sociais.
A trajetória de sucesso do longa, protagonizado por Gael García Bernal, começou na Quinzena dos Realizadores de Cannes, onde venceu o Prêmio da Confederação Internacional dos Cinemas de Arte (Cicae), passou pela 36ª Mostra de São Paulo, pelo Festival de Cinema Independente de Sundance e terminará no Oscar. “A gente vai para a festa sem o peso do favoritismo. O prêmio seria ótimo porque mais gente iria assistir ao filme e conhecer a história”. E é por causa deste desejo de contar histórias que Dreifuss foi para os Estados Unidos depois que se formou em publicidade na PUC-Rio:
– Na época ainda não havia o curso de cinema na PUC. Quando terminei, me mudei para os Estados Unidos e fiz mestrado para produção na AFI (American Filme Institute) e cursos na Ucla (Universidade da Califórnia). Meus planos eram trabalhar com distribuição e marketing, até que percebi que queria mesmo era viver de contar histórias.
Para quem o imagina com toda a pompa e status com que um produtor de Hollywood é idealizado, Dreifuss esclarece: “O dia a dia não é nada glamouroso. Tem, sim, os momentos de festas e badalações, mas são muito poucos”. Segundo ele, a realidade é trabalhar em um “ritmo louco, até sábado e domingo”, passar o dia no telefone e ler muitos roteiros e livros.
– Trabalho no desenvolvimento dos roteiros e passo o dia lendo frase por frase. Quando estão prontos, já posso levá-los às reuniões. Sou quem consegue o financiamento, mas ele só vem pela qualidade do projeto.
Na infância, o mineiro Daniel Dreifuss costumava fazer de véspera a sua lista de premiados no Oscar e gravava em VHS as edições da premiação. “Eu cresci obcecado com o Oscar. É claro que a gente sonha em estar lá, e imaginei muitas vezes como seria”, conta. Na lista desta 85ª edição ele acertou os palpites:
– O melhor longa deverá ser Argo; o destino do filme foi traçado quando a Academia não indicou Ben Afleck como melhor diretor. Acredito que Daniel Day-Lewis será o melhor ator por Lincoln. E eu queria que a atriz de Amor (Emannuele Riva) ganhasse, mas o prêmio deve ir para Jennifer Lawrence (O lado bom da vida).
Daniel torcia, porém, para que No desbancasse o favorito Amor, drama francês dirigido por Michael Haneke, que também concorria na categoria Melhor Filme. Quando seu filme foi confirmado como um dos indicados, Daniel cumpriu a promessa que havia feito aos amigos: escrever a palavra "Oscar" na testa e passar o dia circulando assim por Los Angeles (foto).
Dedicação e foco: dicas aos iniciantes
Aos aspirantes a produtores, o produtor adverte: é preciso dedicação, trabalho e uma ideia clara do que você quer fazer e do tipo de história que quer filmar, pois a indústria é incerta e a lista dos tipos filmes desejados pelo público muda constantemente. Já inserido neste mercado, Daniel Dreifuss tem vários projetos em andamento nos Estados Unidos e especialmente no Brasil, onde quer realizar duas coproduções e um filme nacional. Ele, que costuma vir ao país mas nunca mais voltou aos pilotis, pretende retornar da próxima vez para matar as saudades: “Beijos e abraços a todos!”.