Prefeita reeleita em Campos dos Goytacazes, Norte fluminense, Rosinha Garotinho obteve 69,96% dos votos válidos no primeiro turno, recorde no Estado do Rio. Duas semanas antes, fora enquadrada na Lei da Ficha Limpa, acusada de abuso de poder econômico. Recorreu da decisão e, mesmo com o registro negado, continuou em campanha, mantendo-se à frente nas pesquisas. Em 1º de outubro, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) modificou a decisão e aceitou sua candidatura. O Portal visitou a cidade em busca de ecos da voz das urnas e das razões desta alta popularidade.
– A prefeitura campista é muito rica, por causa dos royalties, o que permite que ela acene para as classes populares com obras de embelezamento e benefícios como o cheque-cidadão e a construção de casas – analisa o sociólogo Brand Arenari, cidadão campista e professor do campus local da Universidade Candido Mendes.
Para o sociólogo, a força da prefeita reeleita vem principalmente de políticas populares e “assistencialismo para todos os gostos”.
Foram mesmo as obras que garantiram a Rosinha o voto de Adilson Tavares, aposentado de 70 anos. A prefeita tem nele um fã, que votará “sempre que puder”, apesar de dispensado da obrigatoriedade.
– A cidade está bonita e ganhou muito com ela. É só olhar as praças e a recuperação das ruas. Não tem mais nada esburacado ou quebrado. Essa história de candidatura proibida não existe. A verdade é que todo mundo quer se dar bem na prefeitura, o importante é fazer alguma coisa – defende Tavares.
Em setembro, a cidade ganhou cores em postes e semáforos pintados de rosa. Oposição e parte dos moradores revoltaram-se, manifestando-se principalmente nas redes sociais. O médico Thiago Amoyr é autor de alguns destes registros que circularam na internet. Junto à foto, um texto classifica a medida como um “desatino”: “A população faz fila nas calçadas para conseguir um lugar no hospital e a educação ocupa o último lugar no ranking do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica)”, completa.
A política de embelezamento da prefeita irritou também a neta de seu Adilson, a estudante Bruna Tavares, de 19 anos.
– É preciso enxergar que shows e praças não resolvem nada. A cidade precisa de mudanças profundas, e ela não faz nada com relação a isso. Acabo sempre discutindo com meu avô por isso – inflama-se.
A Justiça determinou que a Prefeitura tirasse o rosa do mobiliário urbano em até 24 horas, entendendo que se tratava de campanha irregular. Os responsáveis se defenderam alegando que a cor era na verdade “roxo-paixão”, e sua escolha não implicava em propaganda. Mas acatou à ordem. Foi mantida apenas a iluminação da Ponte Rosinha (foto ao alto) e do Asilo da Lapa (foto ao lado).
O cientista político Antônio Carlos Alkmim, professor da PUC-Rio, pondera que obras e políticas superficiais não são suficientes para dar a Rosinha uma vitória tão expressiva, com quase 70% dos votos:
– Os eleitores não são burros. Superficialidade não ganha de forma tão esmagadora. Ela ganhou porque seu governo agradou e mudou a vida da maioria.
Sobre a Lei da Ficha Limpa, Alckmin acredita que a regra ainda está em fase de ajustes:
– Não é para ser trabalho do eleitor levar em consideração os processos dos candidatos. Quando a lei estiver em pleno funcionamento, o ficha-suja não poderá nem se candidatar.
Na visão de Arenari, o embelezamento e os benefícios realizados em áreas de baixa renda não são o único fator que garante a manutenção do poder em Campos. Para o sociólogo, o assistencialismo atinge todas as classes:
– É assistencialismo para todos os gostos. Campos tem um número alto de servidores públicos (atualmente são 20.365 pessoas na prefeitura), que votam no candidato que irá manter seus cargos.
Em Campos, o poder da família Garotinho é passado de mão em mão desde a década de 1980. Até então, Campos tinha sua economia apoiada na cana-de-açúcar. Com a ascensão de São Paulo nesse mercado, as usinas campistas perderam fôlego e quebraram. Com a recessão, a população migrou do campo para a cidade. Anthony Garotinho, marido de Rosinha, foi eleito deputado federal em 1986, prefeito em 1988 e 1996, e governador do Estado do Rio em 1998. Para Arenari, beneficiou da carência desta parcela da população que não tinha mais nada:
– Garotinho foi o primeiro a fazer política popular aqui. Os concorrentes continuaram falando para a elite, os antigos donos de usina. Desse modo, ele conquistou a maioria e se elegeu. Mesmo seus atuais rivais são criados por ele, são dissidentes da sua política.
Além de Campos, Petrópolis, na região serrana, também elegeu um candidato cuja candidatura ficou ameaçada pela Lei da Ficha Limpa. Rubens Bomtempo (PSB) só obteve autorização para concorrer 10 dias antes da ida às urnas. Mas saiu vitorioso apenas no segundo turno, com 56,05% dos votos válidos, contra 43,95% do adversário, Bernardo Rossi (PMDB). Ele assumirá a cidade pela terceira vez.
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