A explosão de aparelhos móveis com acesso às redes sociais e à internet aqueceu o mercado de eletrônicos. Recente pesquisa divulgada pela empresa de análise de mercado Canalsys constatou que, no ano passado, foram comercializados cerca de 487,7 milhões de smartphones no mundo, o que representa um aumento de 62,7% em relação a 2010. Se a maior conectividade derruba barreiras e facilita a comunicação, especialistas alertam que, em excesso, pode comprometer relações sociais e causar dependência. A necessidade de se desconectar também é sentida pelos usuários, como indica a brincadeira de bar phone stacking, que virou moda nos Estados Unidos e já tem adeptos no Brasil. Uma espécie de prova de resistência, na qual os amigos devem colocar os celulares no centro da mesa virados para baixo durante o encontro. Quem não se controlar pagará a conta.
As ex-alunas de Economia na PUC Giuliana Lopes e Izabel Leal decidiram tentar. Com mais quatro amigas, as jovens se encontraram em um restaurante no Leblon e, por sugestão de Giuliana, todas colocaram o telefone no centro da mesa e não puderam pegá-los até o fim do jantar. A jovem avalia a experiência como positiva:
– Vi esse jogo no Facebook e sugeri brincarmos. Gostei muito, pois conseguimos dar mais atenção umas às outras. Todos os telefones vibraram ao receber mensagens. O meu foi o único que tocou e me deixou desesperada de vontade de atender – admite – Depois vi que a ligação era "apenas" o meu pai querendo saber se estava tudo bem.
Izabel garante que resistiu com "tranquilidade". Achou graça das colegas aflitas com a abstinência:
– Estava com todas as pendências no trabalho resolvidas e avisei ao meu namorado que ia chegar tarde. Então, sabia que não receberia nenhuma ligação importante – conta a estudante – O mais divertido foi ver as expressões de desespero das meninas por não poderem olhar o telefone.
A iniciativa aponta para um esgotamento dessa tentativa de se estar conectado a diversos estímulos ao mesmo tempo, avalia o professor de antropologia cultural da PUC-Rio Bernardo Conde:
– Hoje temos acesso a uma quantidade de informações maior do que somos capazes de absorver, o que gera angústia. Para escapar dela, nos mantemos conectados a múltiplos estímulos o tempo todo. Essa atitude acaba gerando o efeito inverso, pois no fundo não estamos ligados a nada por inteiro.
O professor ainda ressalta que a brincadeira pode ser vista como um exercício de tolerância:
– Nos acostumamos a fugir do desprazer. Se uma aula ou um filme não te agradam nos primeiros cinco minutos, procuramos outra fonte de satisfação imediato. Viver as experiências por inteiro, sejam elas boas ou ruins, gera saciamento e plenitude. Quando vamos ao bar com os amigos e nos concentramos naquilo, o prazer é muito maior.
Na tentativa de se concentrar melhor nas aulas, a estudante Eduarda Sisto decidiu desligar seu celular e por na mochila. A jovem faz curso pré-vestibular para Medicina e vê o aparelho como uma barreira para se concentrar:
– Quando estava no colégio, o telefone ficava em cima da mesa. Toda vez que tocava, eu perdia a atenção na aula. Sei que quero uma faculdade difícil, por isso decidi mantê-lo desligado enquanto estudo. Não está sendo fácil, mas já sinto diferença no aprendizado.
Assim como Eduarda, muitas pessoas têm dificuldade para distinguir as horas em que se pode usar os smartphones. A psicóloga e pesquisadora da PUC-Rio Mariana Matos acredita que esse discernimento será atingido aos poucos e que a brincadeira de empilhar telefones pode ajudar no processo:
– O aparecimento de novas tecnologias cria a necessidade de estabelecer limites para seu uso. Também foi assim quando surgiu o celular, atendíamos em todos os lugares sem discrição – explica a psicóloga – Está sendo criada uma etiqueta de uso dos smartphones, o que é uma consequência natural do uso excessivo.
A estudante de comunicação da PUC-Rio Isabella Bastos admite usar seu blackberry a todo momento:
– Não consigo ficar sem checar o celular por muito tempo, virou um hábito. E na maioria das vezes não recebo nada de urgente ou importante. – admite a jovem – Sei que preciso diminuir o uso, mas não sei como fazer.
O vício em aparelhos eletrônicos não é um problema que atinge somente Isabella. Pensando nisso, a Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro abriu um ambulatório para tratar usuários com esse tipo de compulsão. O psiquiatra Gabriel Bronstein explica melhor o projeto:
– O ambulatório foi criado em 2010 e, só no ano passado, atendeu a 120 jovens. Deles, apenas 20 foram diagnosticados como viciados – completa – O método de tratamento consiste em uma consulta com um psiquiatra que vai avaliar se o usuário preenche os critérios para ser considerado dependente eletrônico. Caso positivo, o paciente será medicado e terá acompanhamento de um grupo terapêutico.
Diagnóstico do usuário viciado De acordo com o psiquiatra Gabriel Bronstein, para ser considerado dependente eletrônico, é preciso que o usuário admita utilizar aparelhos eletrônicos por mais tempo do que gostaria e deixe de fazer outras atividades, como ir à faculdade e sair com os amigos, para ficar na internet. Não há um número de horas ideal para se utilizar aparelhos eletrônicos, varia em cada caso. Dicas para se desconectar Para aqueles que querem utilizar menos o smartphone, o psiquiatra recomenda: |