Por tradição, o carnaval é a festa em que tudo é permitido. Nos últimos anos, porém, a folia carioca tem passado por um choque de ordem cada vez mais rigoroso, especialmente com quem faz xixi em via pública. Em 2012, o bloco dos mijões é o principal alvo da Secretaria Especial de Ordem Pública (Seop). Estarão nas ruas mais de 2 mil agentes preparados para abordar os cidadãos e encaminhar para a delegacia quem for pego em flagrante. Urinar em público é um atentado ao pudor, penalidade prevista no Código Penal. No ano passado, 777 pessoas foram detidas, gente que daria para formar um cordão dos mais animados. As rondas pelos blocos começaram no dia 20 de janeiro, e vão até o domingo seguinte ao carnaval, dia 26 de fevereiro. No último fim de semana, houve blitz nos desfiles do Cordão da Bola Preta e do Simpatia é Quase Amor.
– O carnaval de rua do Rio é uma grande festa popular gratuita. Diferentemente do carnaval da Bahia, em que há os cordões, aqui é só chegar e brincar. Por isso, tem que ser uma bagunça com ordem – justifica o secretário de Ordem Pública, Alex Costa, que estará pessoalmente participando das rondas.
Para os foliões não serem pegos de calças na mão, a Prefeitura do Rio vai instalar pela cidade um total de 15 mil banheiros químicos. O secretário admite que a quantidade de banheiros pode não ser suficiente para um megaevento do porte do carnaval carioca, que, além do público local, atrai gente do mundo inteiro – 850 mil turistas este ano, estima a Riotur. Mas lembra que o número de casinhas vem crescendo exponencialmente.
Vice-presidente da Sebastiana (Associação Independente dos Blocos de Carnaval de Rua da Zona Sul, Santa Teresa e Centro da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro), Jorge Sapia, do Meu Bem Volto Já, acredita que esta preocupação deve ultrapassar a época do Momo:
– O carnaval de rua tem mostrado que a cidade precisa de investimentos maiores em equipamentos urbanos que atendam à população o ano inteiro, dando conforto para quem se desloca.
Enquanto a cidade não ganha instalações definitivas, a solução têm sido a instação temporária de banheiros químicos portáteis ou contêineres:
– Já usei banheiro químico. Reconheço que não é como o da nossa casa, mas é o banheiro público possível – defende o secretário.
Alex Costa destaca que a principal tarefa da Secretaria de Ordem Pública não é realizar prisões por atentado ao pudor ou depredação de patrimônio público, mas sim estimular a reeducação dos foliões e o respeito aos moradores e à cidade. Ele lembra que uma das maiores reclamações dos cariocas é contra o mau cheiro depois da passagem dos blocos. E pede a colaboração da população, inclusive para se “programar e não beber tanto quanto gostaria”:
– Dá para se divertir sem depredar, sujar a cidade.
Autor de Carnavais, malandros e heróis, em que analisa a sociedade brasileira a partir das principais festas da cultura nacional, o antropólogo Roberto DaMatta, professor do Departamento de Sociologia da PUC-Rio, lembra que fazer xixi na rua é tão antigo quanto a própria festa, mas observa:
Artur Romeu" alt="Artur Romeu" class="popup">– Sempre se fez xixi na rua na hora do aperto, e era proibido: quem era pego pagava multa. A diferença, agora, é que temos mais condições de ter banheiros públicos e, mesmo assim, algumas pessoas fazem na rua. Por isso, nos importamos mais.
Para DaMatta, o fato de o ato ser praticado principalmente por homens é uma questão cultural:
– O xixi na rua é mais masculino. Homem é que tem essa coisa de pôr para fora e mostrar para todo mundo.
Os números da Seop comprovam: das 777 pessoas conduzidas à delegacia no carnaval passado, apenas 26 eram mulheres. E no de 2010, entre 360 detidos, 13 eram mulheres.
Para os foliões aflitos demais para esperar uma vaga no banheiro químico, uma alternativa é usar o “banheiro descartável”, saquinho com substância química que, em contato com a urina, vira gel e promete eliminar 98% do odor. A invenção é encontrada nas farmácias. O preço médio é de R$ 3,50 a unidade, equivalente ao de uma cerveja.