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Rio de Janeiro, 1 de setembro de 2024


Esporte

Antes do ouro, atletas olímpicos correm atrás de investimento

Cintia Mattos* - Da sala de aula

30/05/2012

 Arquivo pessoal

Com a conquista da sede da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016 pelo Rio de Janeiro, o sonho de viver do esporte parece finalmente se tornar realidade para os atletas cariocas. Os investimentos em infraestrutura envolvem mais de R$ 12 bilhões e o legado para a cidade do Rio neste aspecto fica evidente a cada obra que muda a configuração do trânsito. Mas o desenvolvimento dos atletas brasileiros parece ficar para trás, já que os investimentos neste capital não aumentaram na mesma proporção.

Luciana Kopschitz, 26 anos, é velejadora pré-olímpica na categoria Match Race e deixou a carreira de advogada em março de 2011 para se dedicar ao treinamento com foco nas Olimpíadas de Londres em 2012. Desde os cinco anos de idade, Luciana veleja por influência do pai, Antônio Paulo Kopschitz. Antônio Paulo sempre velejou desde a infância, já que seu pai era vice-almirante da Marinha do Brasil. Carolina e Gabriel, irmãos da atleta, também começaram a velejar ainda crianças, mas a primogênita logo desistiu. Gabriel ainda veleja por lazer. Desde a primeira visita ao apartamento da família a paixão pela vela fica evidente. Só na parede do corredor, há dezessete prêmios de Antônio Paulo. Na sala, a televisão divide espaço com fotos da família e outros troféus. No quarto da velejadora, uma prateleira está repleta de troféus: são 28, que marcam as competições com resultados de primeiro ao terceiro lugar.

 Arquivo pessoal

Em 2011, o aeroporto internacional Tom Jobim, no Rio de Janeiro, foi o ponto de partida de Luciana para cinco dos seis campeonatos que disputou no ano. O aeroporto é o ponto final da Transcarioca. A nova via expressa, de  41 quilômetros de extensão, pretende ligar a Barra da Tijuca – onde estarão a Vila Olímpica e o futuro Parque Olímpico, que hospedará 15 dos 28 modalidades esportivas – ao aeroporto internacional. A obra está entre as principais ações da Empresa Olímpica, entidade municipal que monitora a execução dos projetos de preparação da  cidade para a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos. O investimento feito na construção da Transcarioca impressiona. No total, R$ 1,3 bilhão, quase duas vezes o valor de R$ 805 milhões aportado nas obras dos 56 quilômetros da Transoeste, que vai ligar a Barra da Tijuca aos bairros de Santa Cruz e Campo Grande.

Outra comparação é inevitável para quem acompanha a evolução das novas rodovias enquanto pensa nas contas a pagar. A quantia investida na Transcarioca é mais de dez vezes maior do que os R$ 12 milhões oferecidos pela Prefeitura do Rio em parceria com o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) ao Time Rio, projeto que incentiva o desempenho dos atletas cariocas em Londres, já pensando em aproveitar o potencial em 2016.

Além do Time Rio – única novidade desde as conquistas de Copa do Mundo e Olimpíadas –, outros pacotes de incentivo ao esporte estão à disposição dos atletas cariocas. No Estado do Rio de Janeiro, o Bolsa Atleta estadual oferece 165 bolsas que vão de R$ 250 a R$ 1.250, no total de R$ 85.500 mensais.

Através do Programa de Solidariedade Olímpica, o COB reverte o valor que recebe do Comitê Olímpico Internacional em incentivos do programa Bolsa Atleta Nacional, que oferece ajuda de custo mensal de R$ 300,00 a R$ 2.500,00 aos campeões nacionais de cada modalidade olímpica. A classe em que Luciana compete, Match Race, tem um privilégio que ajuda a jovem a se manter na disputa. Ao invés de apenas uma equipe, como acontece nas outras classes de velejadores, o Programa de Solidariedade Olímpica contempla um time. Por ser uma classe inédita em Olimpíadas, o objetivo do COB é aumentar a competitividade do Brasil frente aos demais países. Seguindo o critério que avalia as condições dos esportistas no ano anterior, Luciana entrou na categoria básica de apoio do COB e recebe cobertura dos custos de passagem e inscrição para os dois principais campeonatos do ano, quatro clínicas de treinamento no centro de alto rendimento do Clube Veleiros do Sul, em Porto Alegre, preparador físico, nutricionista, técnico e psicólogo.

 Arquivo pessoal

Quando decidiu parar de advogar, Luciana sabia das consequências. Mudou sua alimentação radicalmente, segue à risca as recomendações da nutricionista, e tem sido dedicada como nunca aos treinos de musculação. Com uma folga por semana dos treinos de academia e de velejo, as saídas à noite também foram cortadas. “O corpo reclama e o investimento vai por água abaixo se eu não tiver disciplina. Fora o meu dinheiro”, explica.

Longe dos escritórios de advocacia, Luciana só conta com seu pai para compartilhar as despesas: “Ele se divide entre o orgulho de ter uma filha atleta e a dureza de ter uma filha desempregada”. Os gastos da família Kopschitz com o sonho olímpico giram em torno de R$ 1.500 mensais. São suplementos alimentares, roupas especiais, manutenção do barco e academia, além das surpresas que podem aparecer. Qualquer tombo no barco, além de ser fatal para a conquista da vaga nas próximas Olimpíadas, aumenta a conta: “Se eu me machucar, meu plano de saúde cobre o atendimento médico, mas ainda tenho que arcar com as despesas dos remédios”.

Qualificada para o Campeonato Mundial das Classes Olímpicas de Vela, em dezembro de 2011, em Perth, na Austrália, Luciana seguiu pela sexta vez no ano para o embarque no aeroporto internacional em busca do título de um campeonato. Este seria o mais importante: ela e mais oito brasileiras disputaram a primeira etapa classificatória das Olimpíadas de 2012, que define as equipes donas de oito das doze vagas da competição.

Mesmo que volte para casa com o passaporte carimbado para Londres, o esforço financeiro continuará sendo dos Kopschitz, conta a caçula da família: “Em 2011 só podemos cadastrar títulos do ano anterior para requisitar um incentivo que só passará a ser pago em 2012. Ou seja, apesar dos títulos que conquistei, não tenho como receber essa bolsa até 2013”.

* Reportagem produzida para a disciplina Laboratório de Jornalismo Impresso, com a professora Carla Rodrigues.