O amor por um time de futebol é, em grande parte dos casos, passado de pai para filho e seguido como lei. Com a universitária Suzane Werdt foi diferente. Ela virou torcedora do Bangu há cinco anos, por causa de uma promessa: “Se o meu avô saísse do hospital, seguiria a tradição familiar e me tornaria banguense”, conta. O avô melhorou e Suzane adotou na sua vida o vice-campeão brasileiro de 1985 e atual líder do segundo turno do Campeonato Carioca (com 9 pontos, está à frente de Vasco e Fluminense, no grupo B).
– Como isso não foi imposto, acabei criando amor pelo time e agora o sentimento é também de euforia, já que somos líderes – comemora – O Bangu antes era o chão para outros vencerem, agora voltamos a brigar (pela classificação às finais).
Nem tudo é alegria. Embora a liderança na Taça Rio possa lembrar os momentos gloriosos de uma história iniciada há mais de um século, como a conquista estadual de 1966, o risco de rebaixamento no Carioca ainda assombra a quipe e os torcedores. Como o time não pontuou no primeiro turno, a fuga da degola revela-se mais importante do que a classificalção para as semifinais. "O foco agora é não cair", reconhece o meia Tiano. "Mas, o clima é bom, a torcida nos apóia muito, mesmo com todas as dificuldades. Somos motivo de orgulho aqui. Agora que estamos mais na mídia, vemos crianças, por exemplo, querendo ter só o Bangu como time", orgulha-se o jogador.
O "aqui" a que se refere Tiano é o bairro que deu nome ao clube. Ali sobrevive, embora com menos pujança, o diálogo entre um time de futebol e os moradores da respectiva região. Uma relação construída também por Olaria, São Cristóvão, Bonsucesso, Madureira, mas desgastada ao longo da últimas décadas. "No carnaval, os jogadores se travestiam de mulheres e iam de Moça Bonita (estádio banguense) até Madureira. Era uma atração", recorda Jorge Barcellos, meia do Bangu nos anos 1970.
Para o jornalista Sidney Rezende, professor de Comunicação da PUC-Rio e banguense legítimo, a decadência tanto da qualidade em campo quanto da relação entre o subúrbio carioca e seus times tradicionais é causada por uma série de fatores – desde o “conformismo” dos torcedores que se contentam com pouco e da perda de identificação com times trocados integralmente a cada ano até a imposição de interesses alheios ao esporte.
– A realidade é que o futebol se transformou muito nos últimos anos. Os dirigentes têm muitos interesses que nem sempre são os da torcida. Para eles, o interessante é tudo que envolva dinheiro, como troca e venda de jogadores. Esses times marginalizados da competição acabam se tornado escravos de dirigentes e, infelizmente, no mundo inteiro, alguns são usados para lavagem de dinheiro. – avalia Sidney.
Como torcedor, Sidney lamenta a irregularidade na formação de um time "confiável". Ou daqueles cuja escalação era sabida por qualquer criança:
– Você nunca sabe que equipe vai encontrar. Tem uma temporada com um time muito bom, outra com um mais ou menos, ou com um muito ruim. A instabilidade se deve a uma razão: no fim [da temporada] o time é todo desmontado e na temporada seguinte tem que se começar tudo de novo.
Ausente de uma final importante desde os anos 1980 (em 1985, perdeu nos pênaltis o título de campeão brasileiro para o Curitiba; em 1987, conquistou da Taça Rio), o time de Moça Bonita luta para reencontrar o caminho das decisões e a popularidade. Quando Sidney conta que torce para o Bangu, boa parte das pessoas acha que ele está de brincadeira. Já Suzane tem dificuldade para encontrar a camisa do clube nas lojas.
– Já procurei em todos os lugares. Nem na loja do clube consegui. Sem uma memória visual, fica difícil captar novos torcedores – alerta .
Saiba mais sobre o clube: O Bangu foi fundado em 17 de abril de 1904, dentro da fábrica de mesmo nome, quando técnicos ingleses falaram sobre futebol. Segundo pesquisadores a primeira bola de futebol do Rio foi trazida por um desses estrangeiros. A razão de suas cores serem vermelho e branco tem duas versões: Na primeira, a escolha é atribuída aos técnicos ingleses, uma homenagem a São Jorge, padroeiro do seu país. Na segunda, as cores seriam as mesmas do Southampton F.C, time antigo da Inglaterra O símbolo do time é um castor, criado por Castor de Andrade, dirigente do clube na época, para dar mais "peso" à camisa banguense. Marinho, que já jogou pela seleção brasileira, estava em campo na final do Campeonato brasileiro de 1985. Ele marcou, o que daria a vitória ao Bangu. Mas, o árbitro anulou o gol e o alvirrubro foi vencido pelo Curitiba nos pênaltis |