Projeto Comunicar
PUC-Rio

  • Facebook
  • Twitter
  • Instagram

Rio de Janeiro, 26 de abril de 2024


Ciência e Tecnologia

"A robótica móvel está em expansão no Brasil"

Daniel Cavalcanti - Do Portal

22/11/2010

 Isabela Sued

Marco Antônio Meggiolaro é o homem por trás da equipe da PUC-Rio que levou oito troféus na última competição nacional de robôs de combate, disputada em setembro, em Campos do Jordão. Há oito anos, o professor criou a Riobotz e mal poderia imaginar que assim dava o pontapé inicial para uma longa carreira recheada de troféus e intensas disputas em arenas de granito. A equipe é campeã internacional do combate de robôs e uma competidora feroz reconhecida no mundo inteiro. Mas, e fora das arenas? Como um campeão dos ringues torna-se um campeão no mercado de trabalho? O Portal conversou com o professor Meggiolaro, do Departamento de Engenharia Mecânica da PUC-Rio e coordenador do Laboratório de Robótica da universidade. Segundo ele, uma área que vem se expandindo de forma bastante expressiva no Brasil é a robótica móvel.

Portal PUC-Rio Digital - De onde veio a ideia de criar a equipe Riobotz?

Marco Antônio Meggiolaro: No final de 2002, alguns alunos de engenharia vieram conversar comigo. Eles descobriram, na internet, sobre essa competição que havia nos Estados Unidos. Pesquisaram mais um pouco e descobriram que essa competição já era realizada no Brasil desde o ano anterior. Todos ficaram bastante entusiasmados e procuraram o professor Mauro Esperanza, de Controle e Automação, que me indicou. Eu havia concluído meu doutorado em Robótica no Massachusetts Institute of Technology (MIT) dois anos antes, em 2000, e estava de volta à PUC. Gostei bastante da ideia e seguimos em frente, sem qualquer verba, pedindo doação para a Bosch... Foi um começo bem difícil. Os alunos interessados foram assistir a uma dessas competições nacionais e, no ano seguinte, já estávamos competindo.

Portal: Quando você iniciou essa equipe, imaginou que seria tão bem sucedida?

 Isabela Sued MAM: Na verdade, começamos pela curiosidade. Ficamos encantados com a competição. Assim que começamos, a gente não vislumbrava grandes vitórias nem nada do tipo. Só queríamos fazer o melhor robô que podíamos, aprender e nos divertir. Na nossa primeira competição, tínhamos um bom robô, apesar de ele ter alcançado o sexto lugar apenas. Mas acho que foi com essa sexta colocação que sentimos a vontade de ganhar. Descobrimos que havia muito potencial no nosso trabalho e, no ano seguinte, conseguimos o primeiro lugar. No ano em que começamos, somente tínhamos conhecimentos essenciais de robótica para construir um robô. No entanto, eles não eram suficientes para criar robôs de combate. Os robôs que eu aprendi a construir no doutorado eram máquinas que ninguém queria destruir (risos). Eles não tinham a exigência de ser tão robustos ou com uma eletrônica tão avançada. Eram até sofisticados, mas não tão resistentes. Depois disso, decidi comprar todos os livros que existiam sobre robôs de combate. Encomendei na internet todos os livros estrangeiros sobre o assunto, eram uns cinco ou seis na época. Depois de ler todos eles, eu resumi tudo e passei para os alunos, foi quando construímos o Ciclone, nosso campeão nacional. O grande diferencial foram esses livros.

Portal: Quais as dificuldades que vocês enfrentam hoje?

MAM: A maior delas é com relação ao patrocínio, pois os custos dessa atividade são bastante elevados. A PUC tem bancado quase toda verba, mas temos tido ajuda de empresas com serviços, como o de metalurgia. Fizemos uma estimativa de que, se competirmos em todas as competições, sempre com algum robô novo, ficamos na ordem dos R$ 100 mil. É claro que estamos sobrevivendo com bem menos do que isso. Outro problema é o espaço, mas todos os cursos sofrem com isso. Há muitas atividades sendo desenvolvidas aqui na PUC. Nós temos nosso Laboratório de Robótica onde trabalhamos, mas lá temos dezenas de robôs, cada um com centenas de peças, imagina a organização necessária para manter o lugar? Mesmo nos dias mais bagunçados, o que está fora das caixas não é nem 5% do que tem ali dentro. Outro desafio é com relação às oficinas. Não temos muito acesso a oficinas para os alunos trabalharem. Muitas vezes temos que recorrer às oficinas externas, que pegamos emprestado. A transmissão de conhecimento para os novos integrantes da equipe é outro desafio. Volta e meia temos gente que é fundamental para a equipe, que já tem muito conhecimento em determinada área e, de repente, recebe uma oferta muito boa de estágio. Foi por isso que escrevi o livro Tutorial em robôs de combate em 2006. O objetivo foi, justamente, transmitir conhecimento para os novos alunos. Desde 2003, eu já preparava manuscritos e apostilas com o que íamos aprendendo para facilitar o aprendizado desses novatos.

Portal: Mas esse livro foi compartilhado, não foi?

 Isabela Sued MAM: Sim, resolvemos partilhar esse conhecimento com outras equipes. Na época, já ganhávamos muitos campeonatos, então foi uma maneira justa de elevar o nível deles. Esse tipo de atitude não é nenhuma novidade nos Estados Unidos. Várias equipes também fazem isso e contam 99% dos segredos de seus robôs em seus sites. Na própria competição você vê as equipes sempre se ajudando, ninguém ali quer ganhar por W.O., estamos todos querendo competir. Esse manual ajudou bastante nesse aprendizado. Este ano houve o primeiro processo de seleção com uma prova baseada nos conceitos apresentados nesse livro. Os alunos candidatos tinham que estudar esse livro para fazer uma prova e isso obrigou muitos deles a lê-lo, pois sem essa avaliação muitos não liam. É natural, claro, os alunos têm tantas atividades para realizar que o caminho mais fácil é justamente o percorrido. Além desses, há vários outros desafios menores: lidar com uma equipe de 15 a 20 alunos definindo cada função ou lembrar sempre que eles não podem se dedicar exclusivamente à equipe, afinal trata-se de uma atividade complementar.

Portal: No site da Robocore, que administra as competições entre robôs no Brasil, há um fórum de discussão. Há uma participação ativa da equipe nessa comunidade?

MAM: Há muita participação. Vários atuais moderadores do fórum [usuários que regulam o fórum] foram membros da Riobotz. A principal atividade dos membros da equipe, no fórum, era justamente responder a perguntas. Naquele espaço tem de tudo, tanto tópicos de dúvidas técnicas até discussões e conversas sobre as competições. Mas nós participamos bastante do fórum, até estimulamos os novos alunos a entrar lá, pois eles ainda não absorveram toda a cultura que existe em volta da equipe.

Portal: Como você vê o mercado brasileiro de robótica? A tecnologia envolvida nessa competição está sendo usada?

 Isabela Sued MAM: A robótica é uma área com muitas aplicações. Principalmente a robótica móvel – veículos robóticos, veículos de inspeção, com esteiras ou rodas – está em expansão aqui no Brasil. É uma tecnologia que tem um valor agregado muito alto, os equipamentos estrangeiros são muito caros. Tecnicamente é bem complexo, embora não tanto quanto um braço robótico, por exemplo. Um veículo, do ponto de vista mecânico, é mais viável construir do que comprar de fora. Com isso, várias empresas já estão investindo e desenvolvendo robôs de inspeção. Aqui mesmo, na PUC, temos projetos junto com a FINEP e com a Eletronuclear, onde construímos robôs com essa finalidade para serem usados nas usinas em Angra dos Reis. E a Petrobrás também tem a necessidade de robôs que realizem tarefas em tanques de combustível. Nós temos uma grande interação com a indústria, que se dá tanto ao longo da graduação quanto da pós-graduação.

Portal: Na ficção, vemos muitos casos de robôs domésticos. Existe um campo de pesquisa no sentido de trazer esses robôs para o nosso cotidiano?

MAM: Essa é uma das principais vertentes, atualmente. São chamados de robôs de serviço ou robôs pessoais. Seriam os robôs para uso doméstico. O Japão tem desenvolvido muito nessa área. O maior desafio deles é reduzir os custos. Nós veremos, cada vez mais, eletrodomésticos automatizados. Você nem percebe que é um robô, mas eles já existem. Por exemplo, um aspirador de pó robótico, que é um veículo que se movimenta pela casa e vai limpando. Já surgem diversos sistemas como esse. Robôs específicos para aspirar, limpar a piscina, cortar grama etc. E a tendência é que alcancemos os robôs mais avançados, com aspecto humano, capazes de executar várias tarefas. Isso ainda é muito caro, mas a tecnologia já está aí.

Portal: Como é ver os alunos que passaram pela equipe sendo bem sucedidos no mercado?

Isabela Sued MAM: É muito compensador. O objetivo de um professor é formar um aluno até ele ficar bom, daí ele vai embora (risos). É um pouco triste, mas é o melhor que podemos fazer. Então fiquei bastante feliz de saber que eles são absorvidos pelo mercado quando se formam. A Riobotz é conhecida no Brasil todo. Tive alunos que já vieram falar comigo e me disseram que os entrevistadores, quando descobriam que o aluno havia participado da Riobotz, já faziam várias perguntas, praticamente oferecendo o emprego para eles. Eu sinto que existe um reconhecimento do nome da equipe e da prática que o aluno recebe aqui dentro. Os alunos que entram nas empresas mostram que têm um conhecimento prático já avançado, além do teórico que receberam em sala de aula. Eles já tem a prática nos laboratórios, mas a adquirida nas competições é ainda mais profunda. Aqui o aluno aprende o “know why” (saber por que), na competição ele aprende o “know how” (saber como). Há todo um conjunto de detalhes necessários para aperfeiçoar um projeto que um aluno não consegue aprender na carga horária de um laboratório, por exemplo. Essa atividade complementa o engenheiro.