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Rio de Janeiro, 19 de abril de 2024


Ciência e Tecnologia

Departamento de Química da PUC-Rio oferece esperança ao tratamento de câncer

Mariana Casagrande - aplicativo - Do Portal

26/04/2016

 Reprodução/Pixabay

A luta pelo câncer é um tema extremamente difundido pela mídia por conta da incidência de casos da doença nos centros urbanos nas últimas décadas. De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), a cada ano, mais de 12 milhões de pessoas no mundo são diagnosticadas com câncer e cerca de oito milhões morrem vítimas dessa doença. No Brasil, somente em 2016, são esperados 580 mil novos casos, que não só afetam emocionalmente os pacientes e seus familiares, mas também é um peso financeiro para os Estados, visto que o custo da patologia à economia global é estimado em US$ 1 trilhão por ano, pouco mais da metade do PIB brasileiro em 2015, de acordo com o Fundo Monetário Nacional (FMI). Pesquisadores do Departamento de Química da PUC-Rio vêm tentando encontrar a solução para esse problema típico do século XXI a partir de estudos das células alcaloides.

Há oito anos, Camilla Buarque, professora do Departamento de Química da PUC-Rio, começou a pesquisar as alcaloides – substâncias encontradas na natureza derivadas de plantas e animais –, mais precisamente as moléculas isoflavonas concebidas a partir de moléculas chamadas LQB-223. Hoje, a partir dessas pesquisas, obtém resultados esperançosos. Ainda que a pesquisa esteja em fase inicial, sua equipe cresce para acelerar os resultados. Camilla conta com o aluno Jhony Mauricio Cifuentes, que pesquisa as células responsáveis pela leucemia, uma aluna de doutorado, Joseana Alves Mendes, envolvida nas pesquisas de câncer de mama, e o professor da PUC Paulo Costa, pesquisador da área biológica, além de cinco membros do Inca. 

Portal: O que essas substâncias alcaloides representam para a evolução dos estudos de câncer?
Camilla Buarque:
Já descobrimos que as células alcaloides inibem a proliferação da célula cancerígena, ou seja, a célula basicamente para de crescer e morre, sem matar nossas células sadias. Resumidamente, a novidade da nossa pesquisa foi descobrir uma substância que supera o mecanismo de resistência das células cancerígenas sem agredir o organismo, como os tratamentos de câncer feitos atualmente agridem. A quimioterapia e a radioterapia são um arsenal terapêutico que mata muitas células, inclusive as sadias, provocando diversos efeitos colaterais, como queda de cabelo, anemia, náuseas, entre outros. O que tentamos buscar, então, são tratamentos menos danosos que não criem um problema para curarem outro. E isso pode ser feito, por exemplo, através de terapias e fármacos via genes.

Portal: Foi aprovado pelo governo o uso da fosfoetanolamina sintética, que sinalizaria as células cancerígenas para a remoção pelo sistema imunológico. Ela já foi testada por pacientes terminais e, segundo os responsáveis e pacientes, deu resultados positivos. Na PUC, vocês já tiveram contato com a fosfoetanolamina?
Camilla:
 Não tivemos contato, essa pesquisa é deles e não podemos opinar. O que posso ressaltar é a importância de avaliarem se a substância é tóxica ou não para o organismo; não adianta ser ativo e muito tóxico ao mesmo tempo. As pessoas estão tomando, faz efeito, mas não sabemos se haverá reações em longo prazo. Mesmo assim, uma coisa não exclui a outra. A fosfoetanolamina pode ser efetiva para determinadas células de câncer, e não ser tão boa para outras. O trabalho com as alcaloides seria complementar a esse. As duas substâncias poderiam estar juntas no mercado, sem dúvida, já que é grande a probabilidade de uma ser melhor para certos tipos de câncer em que a outra não apresenta resultados positivos.

 Arquivo Pessoal

Portal: As células alcaloides representam maior eficiência para câncer de mama e leucemia. Por que o efeito ativo das substâncias só reage em tipos seletos de câncer?
Camilla:
Isso acontece por conta da ação das células receptoras, que funcionam como um modelo chave-fechadura – a molécula é a chave, e a nossa célula, a fechadura – em que, para a reação acontecer, um encaixe perfeito deve ser formado. Dependendo da substância que a gente coloca, o encaixe é melhor num lugar, pior no outro. Já fizemos testes em outros tipos de câncer, como cérebro e melanoma, mas leucemia e mama são onde a porta se abre.

Portal: E quais outros testes são necessários para a confirmação da eficácia da molécula alcaloide?
Camilla:
Ainda temos muita coisa, como os testes biológicos de mecanismo de ação molecular pra descobrirmos com qual enzima essas moléculas interagem, mas basicamente têm que ser feitor testes em seres vivos, em camundongos, antes de passarmos para os pacientes. O problema, no entanto, é a falta do depósito dos recursos.

Portal: De onde vêm os recursos para a pesquisa?
Camilla:
Os recursos podem vir por iniciativa pública ou privada. No caso do investimento governamental, os recursos são disponibilizados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Nós nos submetemos a diferentes editais e se esses órgãos se interessarem pela pesquisa, recebemos o patrocínio. Mas, o fato é que mesmo ganhando, não estão depositando o dinheiro. Além disso, a iniciativa privada também não oferece muitas esperanças, pois as indústrias não trabalham muito com desenvolvimento – as poucas que trabalham têm seus interesses financeiros próprios e só acolhem pesquisas que desenvolvem síntese barata e são promissoras para gerarem altos lucros. Então dependemos muito do governo, que tem pouco dinheiro e que o divide em muitas equipes.

Portal: Quanto é necessário?
Camilla:
Para a molécula virar remédio ainda precisamos de milhões. Não estamos deixando a pesquisa parada, estamos sintetizando outros compostos, testando células in vitro, publicando, mas de fato gostaríamos de ter uma patente licenciada pela indústria, mas a realidade brasileira dificulta esse patrocínio. Para a fase de síntese, posso adiantar que se não depositarem já, vou ter que parar o processo em até um ano e nem sei o que fazer.

Portal: Quais as principais demandas do mercado de química nesse momento e como a PUC está tentando seguir essas necessidades nas pesquisas atuais?
Camilla:
Medicamentos sempre são a demanda principal, mas a indústria, hoje, está fortemente atrás de soluções para os vírus da Zika e da dengue através do desenvolvimento de repelentes e vacinas. Além disso, o interesse das indústrias farmacêuticas está sempre onde há dinheiro, comercializando estimulantes sexuais e cosméticos, por exemplo. Na PUC, há pesquisas na área médica com dosagem de metástase, liberação controlada de fármacos, evoluções no mal de Alzheimer, além da nossa pesquisa do câncer. Na área ambiental, há pesquisas sobre contaminantes da Baía de Guanabara, entre outros.