Yasmim Rosa - Do Portal
11/11/2009Cirurgias plásticas, tratamentos diversos, exercícios físicos em excesso e uma infinidade de cosméticos. Eles prometem ajudar na ‘busca pela perfeição’ e escravizam milhões de mulheres, jovens e adolescentes todos os dias. Quando isso torna-se uma obsessão, o fim pode ser trágico. Até que ponto a busca pelo corpo perfeito é válida? Joana Vilhena, Coordenadora do Núcleo de Doenças da Beleza do Laboratório Interdisciplinar de Pesquisa e Intervenção Social (LIPIS) da PUC-Rio, acredita que a sociedade atual influencia diretamente nesse comportamento das pessoas.
O caso da dona de casa paulistana de 29 anos que morreu em junho deste ano após ser submetida a uma lipoaspiração em uma clínica de Guarulhos, não é primeiro e não será o último a acontecer. O excesso na busca pela beleza tem se mostrado um vilão para grande parte da população.
O sedutor mercado da beleza atrai, a cada dia, mais pessoas com a promessa de soluções para todo e qualquer deslize da natureza ou castigo do tempo. Além da própria satisfação, elas procuram admiração que, quando acaba, provoca uma nova procura pela reparação de suas características físicas. O processo torna-se um ciclo, uma luta incessante por padrões pré-estabelecidos.
Para a psicóloga Joana Vilhena, autora do livro O intolerável peso da feiúra. Sobre as mulheres e seus corpos, publicado pela Editora PUC-Rio, parte da culpa pelos excessos vem da mídia. Segundo ela, a todo tempo são veiculados na televisão, em jornais e revistas estereótipos e corpos perfeitos, que acabam por impor esses modelos à sociedade.
- Esse corpo magro de hoje vem da mídia, de toda a indústria cultural, que determina padrões de comportamento e estéticos – afirma.
A anorexia e a bulimia também fazem parte da lista das doenças que sofrem influência da "beleza imposta". Em ambas as patologias, o desejo de emagrecer e uma visão distorcida do corpo são características comuns.
Na anorexia, o doente perde muito peso, pois se recusa a comer, a manter o peso médio devido a uma distorção que ele tem da própria imagem, ficando abaixo do indicado pelos médicos. As pessoas anoréxicas apresentam um medo enorme de engordar, mesmo estando extremamente magras. A bulimia tem uma característica diferente. Nela, a pessoa não perde peso. Ela come em demasia, e logo depois utiliza métodos como vômitos auto-induzidos, laxantes e diuréticos e pratica exercícios exaustivamente devido ao medo exagerado de engordar. Mas esse não é o único problema; a falta dos nutrientes causa distúrbios fisiológicos, levando à desnutrição, insuficiência renal e a complicações cardíacas.
Para a psicóloga, todo momento histórico tem suas doenças, seus sintomas sociais. Os transtornos alimentares e o horror à gordura seriam um sintoma do momento atual, uma vez que se vive em uma sociedade do espetáculo, em uma cultura de valorização da imagem. A aparência passa a representar a personalidade, o caráter da pessoa e, por isso, a maioria não quer ser excluída.
- Os julgamentos em torno disso são cada vez mais severos. Tolera-se cada vez menos e isso vem acompanhado de uma avaliação moral muito depreciativa àqueles que não cuidam da própria estética. Moralizar a beleza é dizer que quem não cuida do próprio corpo é desleixado, sem caráter – explica.
Com o desenvolvimento de técnicas de emagrecimento e o aumento do número de cirurgias plásticas, o imediatismo se sobrepôs ao sacrifício e às muitas horas de malhação.
- Antigamente, para ser reconhecido, admirado, você tinha que percorrer um longo caminho. Hoje, você tem como contraponto ao sacrifício a ideia do imediatismo. Então, a pessoa quer emagrecer e ser reconhecida logo, sem pagar o preço desse sacrifício – comenta Joana.
Para Sérgio Levy, cirurgião plástico e presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica Regional do Rio de Janeiro, as pessoas recorrem às cirurgias não só para se sentirem satisfeitas com a própria forma física.
- Elas não querem só estar bem consigo mesmas, acham que a cirurgia pode resolver o problema matrimonial, o problema de emprego – afirma.
Ainda segundo ele, a perfeição não é algo que se possa alcançar em uma mesa de cirurgia.
- Quando a pessoa fica procurando muito a perfeição, o resultado nunca é bom porque ela vai ficar insatisfeita sempre. É muito difícil obter o resultado exato que o paciente quer. O perfeito não existe.
Segundo Joana Vilhena, o Brasil está se transformando em um país de gordos, um país que até pouco tempo era de desnutridos. O paradoxo foi confirmado quando, em suas pesquisas, ela observou que a oferta crescente dos tratamentos estéticos está associada à oferta, na mesma proporção, de alimentos que engordam.
De acordo com a psicóloga, a ditadura estética da magreza é um fenômeno social dentro da cultura do culto ao corpo, sendo um dos elementos da sociedade de consumo. Junto às promessas de belas curvas está o lucro da indústria de beleza, que movimenta bilhões ao ano.
- Essa indústria cosmética é a da perfumaria, do culto ao corpo, que inclui cremes, regimes, produtos light, diets, lipoaspirações, academias de ginástica. É uma indústria pesada que investe na sensação que o sujeito tem de poder saciar ou sancionar o mal estar que ele sente quando não está adequado aos padrões sociais.
Ela também ressalta que hoje os produtos cosméticos não são mais considerados supérfluos, e a beleza é apreciada como um artigo de primeira necessidade.
Essa procura desmedida pelo corpo ideal traz outro problema. Para Levy, as pessoas esquecem que um ter uma silhueta invejável não é necessariamente sinônimo de saúde.
- Devemos nos preocupar em encontrar um equilíbrio. Acredito na busca de um bem estar para o corpo como um todo, não esquecendo da saúde mental. Ser sadio não é simplesmente ter um corpo sem doenças, bem torneado e magro, é sim, uma combinação do sentir-se bem consigo mesmo e com aquilo que faz.
Não é só na vida pessoal que o corpo perfeito influencia. Empresas estão preferindo contratar pessoas magras para que transmitam uma imagem de rapidez e agilidade aos clientes.
- Quando o sujeito é gordo ele já não é bem visto. Se ele é desleixado com o corpo, será assim também no trabalho – comenta Joana.
Levy acredita que parte das pessoas que tornam a beleza um vício precisam de um acompanhamento médico. Segundo ele, elas colocam a culpa da infelicidade nos possíveis defeitos físicos.
- Elas acreditam que sua incompetência em ser feliz é culpa do nariz, que acham grande; ou da gordura, que acham em excesso. Nesses casos, é recomendável encaminhar a paciente a um terapeuta – conclui.
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