A comunidade islâmica brasileira torce pela consolidação da democracia e da liberdade nos países árabes, palcos de recentes conflitos políticos. Entretanto, islâmicos nascidos ou radicados no Brasil criticam a cobertura da mídia internacional sobre os últimos acontecimentos na região e veem com desconfiança a intervenção militar estrangeira na Líbia.
A torcida pela democracia é endossada pelo diretor do Departamento Educacional da Sociedade Beneficente Muçulmana do Rio de Janeiro, Sami Isbelle. Após ressaltar a importância da internet como fator que propiciou a organização das revoltas, Isbelle apontou o descaso com o bem-estar da população como traço comum dos governos da região.
– Muitos jovens formados e sem empregos, vivendo em situações precárias. É como uma panela de pressão, que uma hora estoura. Não há como manter essa situação por muito tempo – analisou.
Concorda com Sami Isbelle o presidente da Associação Beneficente Islâmica do Brasil, Bila Jomaa. Jomaa chama a atenção para os conflitos no Bahrein, Iêmen e Arábia Saudita, cujos reis, segundo ele, estão promovendo um grande massacre contra seus próprios súditos.
– A gente quer que todo o povo árabe conquiste a liberdade, que consiga concretizar sua vontade no seu respectivo país – afirmou.
Há 24 anos no Brasil, o líbio Mohammed Elzwei justificou a saída de seu país pela escassez local de emprego, mas declarou ter forte ressentimento do regime do ditador Muammar Kaddafi, há quatro décadas no poder na Líbia. No começo dos anos 1990, o governo Kaddafi obrigou-o, via telegrama, a trabalhar na embaixada do país em Brasília: este foi o preço a ser pago em troca da integridade de seus familiares, que permaneceram na Líbia. Caso contrário, poderiam ter sido presos ou até mortos.
– Lá, o jovem ou está na cadeia ou tem que obedecer a tudo o que o governo manda. Por isso, o povo saiu na rua querendo liberdade, querendo a democracia – disse Elzwei, que se mostrou favorável à intervenção militar estrangeira na Líbia.
– Que sejam bem-vindas essas potências que entraram. Elas estão lá para proteger os líbios – afirmou.
Porém, a atuação das potências ocidentais é vista com apreensão por parte dos árabes brasileiros. Para o presidente da Associação Beneficente Islâmica do Brasil, Bila Jomaa, a ajuda ideal consistiria num mero fornecimento de armas aos rebeldes líbios. Segundo ele, americanos e europeus estão de fato interessados no petróleo do país (9º maior produtor do mundo) e o apoio militar dos Estados Unidos está sendo feito de maneira imprudente.
– Agradecemos a quem está derrubando os aviões de Kaddafi, mas não a quem também está atingindo cidadãos inocentes com isso – ponderou. – Os Estados Unidos parecem ser especialistas em matar civis.
A preocupação de Bila Joma é compartilhada por Sami Isbelle. Segundo ele, que é um dos diretores da Sociedade Beneficente Muçulmana do Rio de Janeiro, “sempre que EUA e Europa interveem, há um objetivo por trás”.
– Há vários outros países com problemas de injustiça social e opressão política, que são simplesmente ignorados por essas potências – afirmou. – Não somos ingênuos a ponto de pensar que estejam fazendo isso pelo bem da humanidade ou pelo povo líbio.
Bahrein, Iêmen e Arábia Saudita estão entre as nações que também estão submetidas a regimes ditatoriais opressores, segundo Bila Jomaa. O presidente da Associação Beneficente Islâmica do Brasil criticou a cobertura da mídia internacional que, para ele, deu as costas aos massacres que vêm ocorrendo nesses países.
– A mídia não fala sobre a omissão americana [em relação aos conflitos no Bahrein, Iêmen e Arábia Saudia] porque são nações aliadas justamente aos Estados Unidos – acusa.
Parte da comunidade árabe também criticou a posição neutra que o Brasil adotou em relação à intervenção militar na Líbia. Para Mohammed Elzwei, o motivo seria evidente: Brasília tem interesses econômicos na região, principalmente nos setores de energia e construção civil. É numa empresa desta área que trabalha o marido de Caroline Mohamed, que voltou ao Brasil com os seis filhos após o começo dos conflitos em Benghazi.
– Meu marido precisa permanecer lá, pois sempre atuou como ponte entre as filiais daqui e as da Líbia – justifica Caroline, que também torce pela consolidação da democracia nos países árabes em conflito. – Hoje em dia, viver sob uma ditadura é inaceitável. O desejo das pessoas pela democracia pode superar até os interesses de outros países.
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