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Rio de Janeiro, 7 de novembro de 2024


Mundo

Islândia debate lei de imprensa ultramoderna

Yasmim Rosa - Do Portal

10/03/2010

Camila Monteiro/Arte

O Parlamento islandês vem debatendo desde fevereiro uma lei de imprensa única no planeta. Na busca por um regulamento praticamente sem restrições, 17 parlamentares da Islândia estão propondo tornar o país um “paraíso jornalístico”. A Iniciativa Islandesa para uma Mídia Moderna, que será votada até maio deste ano, consiste em uma reunião de experiências legislativas de vários países que garantem e consolidam a liberdade de imprensa na era digital. A proposta prevê a criação de um ambiente jurídico que atraia grupos de internet e entidades de defesa dos direitos humanos que enfrentam barreiras em outras nações.

A proposta vai além de uma lei favorável aos jornalistas. O país, que vive um momento de crise econômica desde 2008, acredita que a legislação pode ser uma possível saída para a atual conjuntura. Ao se tornar um paraíso jornalístico, a Islândia ficaria conhecida como um ambiente ideal para empresas de comunicação, centros de dados,  organizações de direitos humanos e firmas que trabalhem diretamente com publicações na internet. O país já oferece uma ampla rede de cabos de fibra óptica e energia barata e ecológica, o que poderia alavancar a economia a partir da criação de novas oportunidades de emprego.

Para dar visibilidade a iniciativa, os parlamentares criaram o Prêmio Islandês de Liberdade de Expressão. Além da premiação, outras sugestões fazem parte do projeto, como a proteção de fontes e de intermediários, respeito às leis dos demais países e a redução da possibilidade de censura prévia, exceto para a pornografia infantil e combate à pirataria.

Para o coordenador de jornalismo do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio, professor Leonel Aguiar, a proposta islandesa, se aprovada, pode servir como modelo para as demais nações.

– A Islândia pode ser um laboratório para o resto do mundo. Enquanto uma experiência de liberdade de imprensa, esse é um exemplo de luta da sociedade que pode contribuir para a ampliação da liberdade de expressão em outros países – afirma.

No entanto, para Aguiar, é preciso estar atento para as diferenças nacionais. O professor afirma que no Brasil a liberdade de imprensa enfrenta ainda um problema interno. O monopólio dos veículos de comunicação é uma realidade no país e diminui as possibilidades de fonte de informação.

– Há um conflito entre a liberdade de imprensa e a liberdade de empresas jornalísticas. Essas últimas têm interesses políticos e econômicos, o que interfere no meio jornalístico. Por isso, essas empresas dizem que ainda não há liberdade de imprensa no país, mas isso não é verdade. O que não há, hoje, é uma pluralidade de vozes. Nossos jornais são todos de um único dono, é um verdadeiro monopólio – afirma.

No Brasil, a questão da liberdade de imprensa passa por um novo momento. O governo federal anunciou, em dezembro do ano passado, a criação do terceiro Plano Nacional de Direitos Humanos. O projeto é uma ampla carta de propostas que inclui medidas sobre temas que vão desde programas para o fortalecimento da agricultura familiar até ações relativas à saúde. No campo da comunicação, uma das sugestões é garantir a possibilidade de fiscalização da programação das emissoras de rádio e televisão, com o objetivo de assegurar o controle social sobre os meios de comunicação, e penalizar, na forma da lei, as empresas de telecomunicação que veicularem programação ou publicidade que vão de encontro aos direitos humanos. Criticado por grande parte da mídia, o plano é acusado de restringir e censurar a liberdade de expressão das empresas.

Para o professor e jornalista Arthur Dapieve, a liberdade de imprensa no Brasil se solidifica desde o fim da ditadura militar (1964-1985) e, por já estar sujeito a leis, o setor não deveria ser alvo de um novo regulamento.

– A liberdade tem de ser absoluta, porém sujeita à lei e a critérios éticos. Não temos porque discuti-la. Essa é uma questão já tratada, que não deve ser questionada de forma alguma. Porém, ela ainda é mal compreendida por partidos como o PT e PSDB. Dentro do atual governo, há setores que querem restringir a atuação da mídia – comenta.

Ainda segundo ele, é a falta de uma experiência democrática que leva ao planejamento de propostas para cercear a liberdade de expressão.

– Sempre há uma lei que, às vezes, não faz parte de uma discussão sobre comunicação, como é o caso desse Plano Nacional, que tenta limitar a liberdade de imprensa. Isso é totalmente incoerente – afirma Dapieve.

O professor Fernando Antônio Ferreira da Silva compartilha a ideia de que o plano é inconsistente. Para ele, uma nova regulamentação representará uma censura oculta à imprensa brasileira.

– Acho esse PNDH 3 um horror. Coibir a livre manifestação é um ato que a própria Constituição brasileira proíbe. Esse plano está propondo uma censura disfarçada. Não será possível viver sob uma nova regulação da imprensa – avalia o professor.

Ferreira acredita que o país vive um momento de liberdade de expressão, mas a situação censora de outros países da América Latina, como Venezuela e Colômbia, pode influenciar no futuro da imprensa brasileira.

– Espero que o Brasil não siga esse modelo de repressão à liberdade de expressão que Hugo Chávez está impondo na Venezuela. O governo tem sido hábil para não cair na sedução da censura, ainda que alguns setores do governo acreditem na força desse tipo de imposição. Mas não interessa ao Brasil ter uma imagem de país controlador. Internacionalmente isso não seria bem visto – afirma.

Lançado pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República, o documento PNDH 3 é a terceira versão de um programa de direitos humanos do governo federal, sendo precedido pelo PNDH-I, de 1996, e o PNDH-II de 2002, ambos publicados durante os mandatos de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). O PNDH 3 foi assinado pelo presidente Luis Inácio Lula da Silva em dezembro do ano passado, mas espera aprovação no Congresso ainda sem data definida.