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Rio de Janeiro, 13 de outubro de 2024


Economia

Economistas: rebaixamentos exigem reformas

Bárbara Tavares e Lucas Paes - aplicativo - Do Portal

02/03/2016

 Agência Brasil

Os novos rebaixamentos da nota de crédito da dívida brasileira pelas agências de classificação de risco Standard & Poor’s (S&P) e Moody’s reforçam a instabilidade econômica instalada há aproximadamente dois anos no país. A perda do selo de bom pagador ao mesmo tempo reflete e soma-se a fatores recessivos crônicos, espelhados na projeção de um recuo, neste ano, de 3,7% do Produto Interno Bruto (PIB, soma dos bens e serviços produzidos no país). Fatores que, segundo os analistas, decorrem da crise política e da falta de deveres de casa como o saneamento das contas públicas. Sem tais antídotos, eles acreditam que os juros e a inflação continuarão aumentando, com prejuízos na geração de renda e empregos. Afirmam ainda que o processo de recuperação será longo e exigirá medidas como a reforma da Previdência e a facilitação do acesso ao empreendedorismo. Para o economista Carlos Heitor Campani, professor do Instituto Coppead de Administração, o esforço será grande:

 A reforma previdenciária, o enxugamento da máquina político-governamental, uma gestão pública eficiente, um melhor sistema de educação e a criação de uma mentalidade produtiva e eficiente em nosso país são algumas das alternativas para que a situação de recessão e seus respectivos impactos sejam progressivamente combatidos.

A dívida pública brasileira corresponde a 67% do PIB nacional, patamar considerado alto por dez entre dez analistas econômicos. Na visão do também economista e professor Luiz Roberto Cunha, decano do Centro de Ciências Sociais da PUC-Rio, o Brasil repele os investidores estrangeiros por conta da possibilidade de calote, ou seja, de não quitar as dívidas internacionais. Para recobrar a credibilidade consequência, o diretor do Departamento de Economia da UFF, Ruy Santacruz, sugere que a reforma na estrutura econômica leve em conta não apenas motivações imediatas:

– Medidas como a reforma da Previdência e o corte de custos devem ter uma meta maior do que fazer com que o Brasil se recupere economicamente: a de proporcionar a reconquista da credibilidade nacional junto aos investidores estrangeiros. É preciso que o governo e os empresários acenem ao mundo dizendo que o país é capaz de, ao menos, não viver um agravamento constante da crise instalada. 

Agência Brasil   As avaliações de Cunha e Santacruz são acompanhadas pela economista Margarida Gutierrez, professora do Instituto Coppead de Administração. Na avaliação da especialista, o Brasil "não pode se preocupar exclusivamente com rebaixamentos ou quedas do PIB". O cenário, observa ela, é bem mais amplo e complexo:

 O risco-país (indicador da instabilidade econômica da nação) aumentou. Ou seja, a capacidade do Brasil de atrair investimentos internacionais diminui. Consequentemente, o desemprego cresce, os salários caem e o poder de compra do cidadão também diminui, prejudicando a economia.

Economistas: reformas esbarram na paralisia do governo

Dos deveres de casa para recolocar a economia nos trilhos e recuperar a credibilidade dos investidores, sobretudo internacionais, a Reforma da Previdência, ou pelo menos parte dela, insinua-se mais próxima de sair do papel. Discutido no Congresso, o projeto terá, assim como outras medidas associadas ao ajuste fiscal e ao reequilíbrio das contas pública, de desatar os nós parlamentares impostos pela crise política retitente. Para o professor de Ciências Sociais da PUC-Rio Eduardo Raposo, as mudanças precisam adaptar o fator previdenciário "aos aspectos da modernidade", como o aumento da longevidade do cidadão brasileiro. A medida auxiliaria na contenção das despesas públicas. As novas regras para a obtenção da aposentadoria prolongariam a vida economicamente ativa e impediriam uma explosão do número de beneficiados, ressalta Raposo.

Uma reforma fiscal mais ampla, para reduzir a evasão e a sonegação impostos, também é estudada. Entres os planos, estão mudanças que imporiam limites e metas para o gasto público. Por outro lado, o governo mantém aceso o espectro da criação de novos impostos, como a polêmica volta da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).

Imposto sobre transações bancárias criado durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e extinto em 2007, a CPMF se tornaria uma espécie de bala de prata do Planalto para reequilibrar as contas públicas. Incrementaria a arrecadação, que caiu 6,71% em janeiro. A proposta, no entanto, encontra resistência entre opositores do governo no Congresso, representantes da sociedade civil e analistas:

– A (volta da) CPMF é baseada na ideia de cobrar da sociedade os erros cometidos pelo governo. Tem um estatuto diferente da reforma previdenciária. Não seria naturalmente necessária  compara Raposo.

Travado desde o ano passado pela instabilidade política refletida numa corrosão da base de apoio do governo no Congresso, o pacote de ajustes para sanear as contas públicas, restituir a credibilidade dos investidores e dissipar o horizonte recessivo projetado até 2017 corre contra o tempo. A urgência é exposta por sucessivos indicadores de um buraco que se aprofunda. A escalada de inflação e do desemprego talvez sejam os mais drásticos à vida dos brasileiros. Cerca de 2,5 milhões perderam o emprego nos últimos 12 meses. Para Campani, uma dos caminhos contra a perda de vagas de trabalhos é “a facilitação do acesso ao empreendedorismo, o que permitiria a criação de novos empregos”. A taxa de desempregados alcançou 7,6% nas seis maiores regiões metropolitanas do país em janeiro, maior índice para o mês desde 2009, constata o IBGE.

Correções dependem de arrefecimento da crise política, argumenta analista

A recuperação econômica, ponderam os analistas econômicos, exige não só reformas essenciais, como a previdenciária e a fiscal, mas um empenho conjunto para dirimir a crise política insuflada pela Operação Lava-Jato, que investiga desvio de dinheiro público por integrantes da máquina partidária do governo. Na avaliação de Ruy Santacruz, a reestruturação do país começa por um pacto pela estabilização do governo e pelo alinhamento entre os dicursos oficiais e a prática. Sem tais condições, argumenta ele, as correções do rumo econômico seguirão inviáveis: 

 A falta de previsibilidade é o maior problema do Brasil. Será que tudo o que o governo diz é realmente verdadeiro? Será que há planos sólidos para curto e longo prazo? Até o que parece solução não ganha status de unanimidade. Há quem diga, por exemplo, que um ajuste fiscal mal formulado pode apenas intensificar a recessão. É por isso que a chave para o governo é apresentar estabilidade. Estabilidade que vem sendo impedida pela crise política, com o choque de grupos antagônicos do meio político nacional.

Campani lembra que os resultados da Lava-Jato se mostram também decisivos para o esboço de uma recuperação da confiança e da econonomia. As denúncias de uma corrupção institucionalizada também minam a credibilidade verde-amarela, destaca o analista:

 Essa questão, que tem ganhado grande visibilidade ao longo dos anos, é um dos motivos que induzem os investidores internacionais a não apostarem em nosso país.

A variação das notas de crédito ao longo dos anos

· O “selo de bom pagador” das agências Fitch Ratings e Standard & Poor’s foi conquistado pelo Brasil em 2008.
· Em 2009, o país conquistou o grau de investimento da Moody’s.
· A nota de crédito brasileira começou a derrocada em setembro de 2015, quando a Standard & Poor’s retirou o selo de bom pagador. Após três meses, a Fitch rebaixou o Brasil para BB+. Em fevereiro de 2016, a Moody’s retirou o grau de investimento do país, colocando-o duas posições abaixo da anterior.
· Depois de 10 anos, o grau de investimento do Brasil foi novamente classificado pela S&P como BB. Já a Fitch, não rotulava o país como BB+ desde 2006.