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Rio de Janeiro, 7 de dezembro de 2024


Opinião do Professor

Boicotes e adiamentos: a conta do desperdício no Congresso

Luciana Brafman* - aplicativo

29/10/2015

 Davi Raposo

A leitura dos jornais é capaz de sugar, atualmente, toda e qualquer vitalidade do mais saudável cidadão brasileiro. Mas a culpa não é da imprensa. Vampiros se escondem nas páginas que tratam da política nacional, o que torna cansativo acompanhar os acontecimentos de Brasília: a corrupção, as falácias, a defesa do indefensável, a explicação de que “é o que todo mundo faz”, as negociatas, a cara de pau dos que não renunciam nem com batom na cueca, o deboche incessante. E o pior é tentar mensurar o quanto melhoraríamos como sociedade sem esse triste espetáculo, pois é revelador o exercício de calcular o desperdício de recursos, tempo e dinheiro com as farsas cotidianas. Desanima.

Os boicotes e adiamentos de votações do Congresso, como a dos vetos a projetos que elevam o gasto público, por exemplo. Qual o custo de uma sessão parlamentar que não dá em nada? Luz, ar-condicionado, cafezinho, pessoal da limpeza, da tecnologia, da segurança... Tem ainda os salários dos nobres deputados e senadores. E o tempo? Que projetos benéficos à população poderiam avançar em sessões produtivas?

Tic-tac. Enquanto isso, a economia se deteriora. As temidas agências de risco não perdoam: rebaixam, rebaixam, rebaixam. E, só para citar um exemplo do custo de oportunidade, eis que surge uma parceria no Pacífico, a TPP, com mais de uma dezena de países que somam 40% da economia mundial. Ninguém está parado lá fora. Por aqui, as questões inócuas, que nos desviam do rumo, são muitas. Terminam no ralo, como a manobra que o governo fez no STF para tentar postergar a análise das contas de 2014 pelo TCU.

O caso emblemático mais recente talvez seja o da CPI da Petrobras, aquela que teve ratos soltos, desagravo a Eduardo Cunha, pedido de exumação, pagamento milionário a empresa de consultoria, amante de doleiro e, claro, muitos bate-bocas. Divertido como um circo. Suas conclusões foram “econômicas” frente aos gastos e esforços despendidos. Não houve pedidos de indiciamentos de políticos suspeitos. Disponível no site da Câmara dos Deputados, a numeralha do balanço da CPI é assustadora. São listadas, entre outras informações:

— A prorrogação do prazo de 120 dias por duas vezes, de 60 dias cada;

— 56 reuniões ordinárias e uma extraordinária;

— quatro diligências (uma a Londres), um encontro com o juiz Sérgio Moro, duas missões a Curitiba e as audiências públicas;

— 132 pessoas ouvidas, 1.141 requerimentos apresentados;

— 734 ofícios expedidos e 955 correspondências recebidas;

— Colaboraram servidores de TCU, DPF, AGU, CGU e Banco do Brasil. E funcionários de Consultoria Legislativa, Centro de Informática, Departamento de Taquigrafia, Revisão e Redação, Coordenação de Audiovisual, Departamento de Polícia Legislativa e diversos órgãos do Departamento de Comissões da Câmara.

Uau. Tudo isso deu em quê? Quanto a CPI custou realmente? Como os recursos poderiam ter sido melhor utilizados? Não estou defendendo que se abra mão das discussões, dos discursos, dos direitos ou das próprias CPIs. Política e democracia envolvem negociação. Os passos, nos mostra a História, são vagarosos. Mas, para não retrocedermos, há que se distinguir política de politicagem, porque a politicagem barata que hoje tece o Brasil precisa acabar. Em tempos de aperto de cinto, ela é ainda mais cara.

Luciana Brafman é jornalista e professora de Jornalismo na PUC-Rio. Texto publicado no Jornal O Globo em 27/10/2015.