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Rio de Janeiro, 4 de dezembro de 2024


Crítica de Cinema

Filme extrai pérolas humanistas no horror da guerra

Miguel Pereira* - Do Portal

04/06/2012

 Divulgação

Narrado através do ponto de vista de uma sobrevivente do massacre que vitimou milhares de pessoas, na tomada de Nanquim, pelas tropas japonesas, em 1937, o último filme de Zang Yimou parece destoar de seu estilo suave e contemplativo de fazer cinema. Na realidade, esse trágico episódio continua causando espanto e exigindo explicações para tamanha barbárie. Fala-se em mais de 200 mil mortos em poucos dias de cerco e tomada da antiga capital chinesa. Zang Yimou, no entanto, não pretende chegar a esses objetivos explicativos da história com Flores do Oriente. Não se furta, porém, a pensar e pintar a guerra como um cenário infernal e dantesco. Usa o máximo de realismo possível no som e na imagem para construir um espetáculo horripilante e de imediata rejeição por parte do espectador. O incômodo é evidente nas cadeiras do cinema.

As cenas de heroísmo de um soldado chinês que sozinho enfrenta os japoneses têm as características narrativas do cinema sensitivo hollywoodiano. No entanto, seu efeito é oposto. Ele é mais um sacrificado voluntário do que um herói. O mesmo se pode falar das prostitutas heroínas que também se sacrificam pelas jovens do colégio católico de Nanquim.

Percebe-se, facilmente, que, apesar do aparato de uma superprodução, Flores do Oriente segue uma outra cartilha. Zang Yimou conta a história pelo sentimento e o olhar de uma memória que não é dele. Sente-se à vontade para construir um relato quase pueril no que diz respeito ao grupo de jovens escolares na flor da idade. Interagindo com esse universo juvenil, aposta na figura de um agente funerário ocidental cínico que só se interessa pelas possíveis vantagens da situação. A mudança que se opera nele ao longo do relato também não o torna herói. Na realidade, Zang Yimou dá a cada um o que lhe é devido numa situação radical e extrema como a do filme. Quer entender o que essa história representa.

Os pequenos e os grandes gestos se equivalem num mundo convulsionado pela guerra e pela barbárie. Os dois conjuntos femininos se completam, assim como os soldados, o agente funerário, o gentil oficial japonês e os seres fantasmagóricos de um cenário de destruição total. Pequenos fragmentos de ação, como a busca de coisas perdidas nas ruinas da cidade por parte de duas jovens prostitutas, numa aventura arriscada, pontuam a narrativa de Zang Yimou como pequenas pérolas de humanidade pura. Esse tratamento é do estilo do cineasta chinês e dá a seu filme uma dimensão humanista e redentora.

Flores do Oriente é, assim, uma obra que nos leva ao horror das guerras para nos dizer que devem ser evitadas e ao mesmo tempo nos mostrar que, mesmo nesse estado bárbaro, o ser humano pode fazer de sua vida algo que valha a pena.

* Miguel Pereira é professor da PUC-Rio e crítico de cinema.