Ligia Lopes - Do Portal
15/05/2012
Levar à reflexão sobre o mundo em que vivemos é a proposta das exposições World Press Photo e A Terra vista do céu, ambas em exibição no Centro do Rio. Trazendo as principais fotos publicadas na imprensa mundial em 2011, a 55ª edição da exposição internacional, na Caixa Cultural, apresenta 170 fotos de 57 profissionais, selecionados entre cerca de cem mil imagens de cinco mil fotógrafos de 24 países. O maior destaque é o registro do espanhol Samuel Aranda durante os confrontos em Sanaa, no Iêmen.
Há mais de dez anos trabalhando no Oriente Médio, o fotógrafo de 33 anos é o vencedor desta edição do WPP. A foto, publicada pelo New York Times, retrata uma mulher coberta por um véu preto abraçando o filho ferido.
| "Mulher segura em seus braços o filho ferido durante protestos contra o presidente Saleh", registro de Samuel Aranda para o The New York Times. Sanaa, Iêmen, 15 de outubro de 2011. |
Ultrapassando as lentes da câmera, Aranda criou laços com a família fotografada. Em entrevista ao Portal, por e-mail, o fotógrafo contou que mantém contato com a mãe, Fatima, e o rapaz, Said, e que ambos estão bem:
– Gosto de passar tempo com as pessoas que fotografo e não construir nenhuma barreira emocional. É um momento de confiança mútua, onde eles confiam em mim e eu confio neles – conta.

A avaliação do júri foi realizada na sede da WPP, em Amsterdã, na Holanda. Segundo a produtora da exposição e representante da WPP no Brasil, Flávia Moretti, a imagem vencedora representa a força das mulheres na guerra, uma coragem muito mais sentimental do que física.
– A foto do Samuel é uma fotografia bíblica. Remete à imagem da Pietá, figura emblemática cristã que significa a piedade de Maria com o menino Jesus. A foto representa, de maneira muito poética, ao mesmo tempo força e carinho. É o lado humano da guerra – afirma Flávia, ressaltando que a mostra não serve apenas como retrospectiva histórica, mas como panorama do que está acontecendo no mundo.
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“Rebeldes em Ras Lanuf”, de Yuri Kozyrev, Rússia, Noor Images para Time. Por semanas, rebeldes resistiram contra o líder líbio Muamar Kadafi na esperança de que o mundo iria ajudá-los. A rebeldia diminuiu quando os aviões e tanques do ditador retomaram o que chamava-se de Líbia Livre. Líbia, 11 de março. - 1º lugar Notícias em Destaque/Categoria Single |
Este, no entanto, não foi o objetivo do fotógrafo. Ele conta que o momento era de muito caos, disparos e bombardeios: “Não tinha tempo de pensar em Michelangelo” (artista que imortalizou Pietá).
– Quando fotografo, minha intenção é conseguir fotos que possam transmitir emoções, e que o público possa se sentir conectado com a imagem – explica Aranda.
Para Flávia, o objetivo da exposição é dar ao público a condição de refletir sobre os principais acontecimentos do mundo, “criando uma massa crítica coletiva”.
– É uma oportunidade de as pessoas tentarem mudar o que acham de errado e refletirem sobre as coisas que não vivenciam no dia a dia, mas que outros vivenciam, como a guerra, a perda, o despejo de uma casa.
Também com a intenção de dar ao público a oportunidade de refletir sobre a transformação do mundo, a exposição ao ar livre A Terra vista do céu, do fotógrafo francês Yann Arthus-Bertrand, chega pela primeira vez ao Brasil depois de ser vista por 120 milhões de pessoas em 110 países. A bordo de helicópteros e balões, o ambientalista fotografou a beleza dos quatro cantos do planeta e sua perceptível degradação ao longo de vinte anos. Das 130 imagens, 11 delas são inéditas e feitas no Rio.
A exposição monumental ocupa a Praça Floriano, a Cinelândia, e já chegou a ter mil visitas por hora, de acordo com a produção. À noite, um sistema de iluminação valoriza ainda mais as imagens, acompanhadas de créditos, como reproduzido aqui.
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Grande Fonte Hidrotermal Prismática, parque nacional de Yellowstone, Wyoming,EUA (44°31’ N - 110°50’ O)
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A mostra, iniciativa do Consulado Geral da França no Rio, em parceria com a Prefeitura, e produção da Agência Bonfilm, chega como uma introdução à Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, que será realizada na cidade entre os dias 20 e 22 de junho. Vinte anos após a ECO92, quando teve o insight, o fotógrafo ativista mostra sua proposta de reflexão sobre a evolução do mundo.
Arthus-Bertrand sempre se interessou pelo meio ambiente. Por ter vivido em uma reserva ambiental por três anos, descobriu o gosto por fotografar. Com 35 anos de carreira, o francês já publicou mais de 60 livros com fotos feitas ao redor do mundo.
– Falar de meio ambiente é sempre complicado, porque as pessoas acham os discursos muito pessimistas e cansam de ouvir. A exposição é uma forma de civilizar as pessoas através da arte e de forma lúdica – explica o produtor Christian Boudier.
Desde 2005, Arthus-Bertrand é presidente da Fundação Good Planet, que luta contra as mudanças climáticas do planeta através do programa Action Carbone. Os gases de efeito estufa emitidos com a estrutura da exposição serão compensados com um projeto de reflorestamento no Estado do Rio. O projeto é uma parceria entre a Voltalia Energia do Brasil com a Associação do Mico Leão Dourado.
– De acordo com uma avaliação das emissões de gases, a exposição emitiu 37 toneladas de gás carbônico e calculamos que devemos plantar 246 árvores – explica Etienne Vernet, responsável de qualidade da Voltalia. O plantio será no dia 26 de maio.
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Passarela de Niemeyer - Rocinha, Rio de Janeiro, Brasil A passarela localizada na Avenida Lagoa-Barra, em frente à favela da Rocinha, foi concebida pelo arquiteto Oscar Niemeyer (que acaba de completar 104 anos), mundialmente reconhecido por sua arquitetura moderna, singular e “sinuosa”. De acordo com suas próprias palavras: “ Não é o ângulo reto que me atrai, nem a linha reta, dura, inflexível criada pelo homem. O que me atrai é a curva livre e sensual, a curva que encontro nas montanhas do meu país, no curso sinuoso dos seus rios, nas ondas do mar, nas nuvens do céu, no corpo da mulher amada. De curvas é feito todo o universo. O universo é curvo.” Situada entre os bairros de classe alta da Gávea e de São Conrado, a Rocinha foi povoada devido em grande parte ao êxodo rural do Nordeste brasileiro, intensificado a partir da década de 1950. Trata-se de uma verdadeira cidade dentro da cidade, e sua população é particularmente difícil de ser contabilizada: as estimativas vão de 70.000 a 150.000 habitantes. No início de 2012, a 20ª Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) foi implantada nessa comunidade há muito tempo ocupada por traficantes de drogas bem organizados. Com 60 metros de comprimento, a passarela foi construída em 2010 ao custo de R$ 15 milhões, a fim de facilitar os deslocamentos da comunidade até o Complexo Esportivo da Rocinha, construído no âmbito do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento criado pelo governo brasileiro), e até a escola de samba da comunidade. |
Paralelamente à exposição, Arthus-Bertrand lançou o livro homônimo A Terra vista do céu – 20 anos de retratos do planeta, pela editora Casa da Palavra em coprodução com a Bonfilm. O livro agrupa as imagens expostas na Cinelândia e um DVD do documentário Nosso planeta, nossa casa, de autoria do próprio fotógrafo. A obra custa R$ 90 e pode ser comprada na exposição.
A Terra vista do céu ficará na Cinelândia até o fim de junho. Já a World Press Photo fica na Caixa Cultural até 3 de junho, de terça a domingo, das 10h às 21h. A entrada é franca e a classificação é 16 anos.