1958, o ano em que fomos modernos
Juliana Branco - Da sala de aula
14/08/2008
No ano de 1958 o Jornal do Brasil começou uma reforma gráfica que mudaria a cara dos jornais brasileiros para sempre. Era o momento em que os jornais entraram numa fase de empreendimento definitivo: o início da indústria cultural no Brasil, muito influenciada por um contexto que buscava o moderno. A década de 50 é a época da construção de Brasília, da arquitetura moderna, da arte concreta, do surgimento da Bossa Nova e do Cinema Novo. O JB estava em crise, o conde Pereira Carneiro, dono da empresa, havia morrido. A condessa Pereira Carneiro assume o comando do jornal com a difícil missão de recuperar o número de leitores.
- O Jornal do Brasil estava em decadência quando começou a reforma gráfica, estava virando um boletim de classificados, a própria primeira página já era cheia de classificados. E a condessa dá carta branca para um grupo de jornalistas brilhantes começarem a modernizar o jornal, afirma a professora de história da imprensa, Carla Siqueira.
Jornalistas como Odylo Costa, filho, Ferreira Gullar, Alberto Dines, Jânio de Freitas e Reynaldo Jardim faziam parte desta equipe e viviam outra reforma. “O Diário Carioca já tinha sido pioneiro na modernização do texto jornalístico, com a entrada do lead, que substituiu o jeito antigo de escrever jornal por um jeito mais objetivo que vinha importado dos Estados Unidos”, diz Carla.
Em 1957, Odylo Costa, filho leva para o JB uma equipe de jovens jornalistas que daria continuidade ao processo de reformulação, entre eles, Amílcar de Castro, um artista plástico ligado ao movimento concretista e à vanguarda artística. Segundo a professora, a partir desse momento a primeira página de um jornal é tratada de forma diferente:
- O Amílcar de Castro tem uma visão gráfica moderna e começa a implementar isso no jornal. Eles começam a limpar a primeira página do jornal que estava cheia de classificados, começam a tratar a capa de uma forma como nenhum outro jornal tinha tratado até então, declara.
O jornalista Ferreira Gullar, um dos integrantes da reforma, ressalta a resistência que havia no jornal diante das mudanças.
- Eu, o Jânio e o Amílcar começamos a fazer paginação diferente na Manchete, em 1955. Para nós, não era mais novidade. Quando colocamos a primeira fotografia na primeira página do Jornal do Brasil houve conflitos e estranheza. O Odylo não deixou que tirássemos os classificados, dizia que era a marca registrada do JB, conta Gullar.
Antigamente, a primeira página do jornal era toda tomada pela íntegra da matéria. O leitor tinha que folhear toda a edição para saber as notícias do dia. Com a reforma do JB, surgem as chamadas, as fotos grandes, e aumenta o espaço do noticiário e o número de páginas.
- Os jornais eram pesados, colocava-se muito texto na primeira página, letras muito pequenas, as colunas eram divididas com uns fios negros. O Amílcar de Castro dizia que fio não se lê, só faz o jornal ficar escuro, pesado, ruim de ler, feio. Resolveu, então, abrir uns espaços em branco para arejar, conta Carla.
Para o jornalista Alexandre Carauta, que trabalhou no JB por 13 anos, a reformulação gráfica facilitou a leitura do jornal:
- O Jornal do Brasil fez com que o conjunto texto e imagem fosse absorvido de uma forma mais confortável. Foi um dos pioneiros nessa reforma em que mudaram a abordagem, criaram uma programação visual mais limpa, contextos mais coloquiais que colaboraram para a comunicação.
Um dos nomes importantes da reforma foi o do genro da condessa Pereira Carneiro, Manuel Francisco do Nascimento Brito. Ele conseguiu trazer equipamentos gráficos mais modernos para o jornal. Considerado o braço direito da condessa, Nascimento Brito fez um curso para editores na Universidade de Columbia, EUA, e esteve à frente da Rádio Jornal do Brasil.
Ferreira Gullar diz que Nascimento Brito foi contra a repaginação do JB no início. “Ele dizia que o papel era muito caro para nós deixarmos em branco”, explica. Com o sucesso do suplemento dominical criado por Reynaldo Jardim, em 1956, Nascimento Brito passa a apoiar a reformulação.
Segundo o jornalista Israel Tabak, que trabalhou no Jornal do Brasil durante 38 anos, Nascimento Brito teve uma grande visão da modernização. “Ele aproveitou a boa situação financeira do jornal. O JB não era um jornal noticioso, só ficou rico por causa dos anúncios. Foi o Nascimento Brito e a condessa que transformaram o JB em um jornal moderno”, afirma.
Durante a ditadura militar, o Jornal do Brasil conviveu com a censura prévia e os censores na redação. Sua sede foi invadida, diretores e editores foram presos. Mesmo assim, o JB se firmou na imprensa nacional. Transformou-se em um veículo formador de opinião e em um parâmetro de modernização gráfica e editorial.
Entre idas e vindas, a jornalista Rose Esquenazi está no JB há quinze anos. Para ela, o jornalismo feito pelo Jornal do Brasil era mais autoral. “O JB sempre teve um texto mais ágil, colunas diferenciadas, fez várias inovações e suplementos. Influenciou não só o comportamento, como a política. Era um jornal nacional”.
A reforma gráfica do JB é tida como a grande modernização visual da imprensa. “O JB conseguiu criar uma cara, que é a cara que os jornais brasileiros têm hoje. As mudanças do JB serviram de exemplo para toda a imprensa brasileira”, afirma Carla Siqueira.