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Rio de Janeiro, 27 de julho de 2024


Economia

Modernização da fotografia exige profissional "midiático"

Carolina Bastos - Do Portal

27/05/2011

 Luisa Nolasco

Especialistas apontam a modernização da fotografia como o maior desafio do novo profissional. Entre as principais mudanças técnicas, estão a fusão entre a fotografia e o vídeo e o uso de programas de edição de imagem, como o Adobe Photoshop. Estes foram alguns dos temas abordados pelos palestrantes na I Semana de Fotografia da PUC-Rio. Eles também recomendaram, às novas gerações, o estudo aprofundado do objetvo de um ensaio fotográfico (local, pessoa, comunidade). A iniciativa organizada pelo professor de fotojornalismo Weiler Finamore e pelos estudantes de comunicação social Artur Romeu, Maria Luiza Valois e Stephanie Saramago se encerra hoje com duas atividades: sessão especial de lomografia, às 11h, sob comando do fotógrafo Philippe Machado, dono da loja Lomography Ipanema; e palestra A fotografia e a imagem em movimento, às 13h, com os diretores de fotografia Guy Gonçalves e Gustavo Hadba e o professor de fotografia de cinema Marcelo Taranto. Ambas serão na sala 102-K, no primeiro andar do edifício Kennedy.

Artur Romeu conta que a ideia da Semana de Fotografia nasceu da paixão dos organizadores pela área, somada à percepção de que circulavam pelos pilotis um "número expressivo" de fotógrafos e de interessados no ofício. O resultado correspondeu às expectativas:

 Luisa Nolasco 

– Tivemos cerca de 400 pessoas ao longo da semana assistindo às palestras, incolusive estudantes de outras faculdades, ex-alunos e fotógrafos profissionais (além dos palestrantes) – observa. 

O projeto, que também contou com oficinas de lomografia e tratamento de imagem em RAW, provavelmente ganhará uma segunda edição no próximo ano:

– Planejamos fazer de novo ano que vem, só que melhor: mais oficinas e mais palestras. Faltou dinheiro para caprichar mais dessa primeira vez, mas já nos consideramos vitoriosos – comemora Artur.

Evandro: "Na ditadura, eu dava a minha opinião pelas lentes"

O ex-fotógrafo do Jornal do Brasil Evandro Teixeira, um dos palestrantes convidados, definiu a fotografia como um poema, que exige o "gosto pela prática". Na época da ditadura militar, ele escrevia seus poemas por meio das lentes, e retratava na imagem o que não podia falar:

– Eu era político na imagem. Ela falava por mim. Não podia subir no palanque e dar a minha opinião, então eu fazia isso pelas lentes, pelo meu olhar.

Ele contou que, naqueles anos de chumbo, às vezes era agredido por policiais e tinha seus filmes roubados. Hoje, Evandro enxerga um avanço nos direitos dos fotógrafos, mas ainda vê a necessidade de mudanças. “Ainda sofremos violência. Isso precisa acabar”, opina.

A fotógrafa Kita Pedroza destacou a importância da fotografia em mobilizações sociais. Para ela, os direitos humanos só são atendidos quando a população pede:

– A fotografia fortalece os movimentos populares e ajudam nas transformações da sociedade. Ela já foi usada em processos judiciais, em denúncias de trabalho escravo e em formas de expressão da população em geral – lembrou Kita aos estudantes.

 Carolina Bastos

Para o fotógrafo do Ego e Paparazzo Marcos Serra Lima, a tecnologia digital contribuiu decisivamente para o avanço da atividade. Pois, o equipamento passou a ser acessível a um maior número de pessoas, levando ao que ele chama de “democratização fotográfica:

– Mais pessoas têm acesso, mais pessoas têm o direito de tirar fotos. Esse foi o maior avanço da fotografia.

O eterno desafio de administrar o envolvimento com a realidade fotografada

Durante a ditadura e em outras situações dramáticas – como o funeral do poeta chileno Pablo Neruda – Evandro Teixeira sempre se emocionou. Ele alerta, no entanto, que é importante "manter a racionalidade na hora do trabalho":

– Não somos nunca só espectadores, é impossível não se envolver. Mas principalmente no jornalismo, precisamos estar superiores a isso, ter uma estabilidade emocional para manter o profissionalismo.

 Luisa Nolasco 

Por outro lado, envolvimento significa conhecimento. O fotógrafo Marcos Andre Pinto contou aos estudantes que o trabalho de fotografia desenvolvido na Cruzada, no Leblon, tornou mais nítida a visão sobre aquela comunidade:

– A fotografia tem o papel de registrar o momento para depois você observar os detalhes que na hora não foi possível perceber. As pessoas de quem eu tirei foto moram lá, são importantes para aquela comunidade, elas vivem democraticamente. Sem a fotografia, talvez eu não enxergasse isso.

Kita Pedroza lermbra que o envolvimento se desdobra no olhar de quem vê a imagem retratada:

– Ele (o observador da foto) traz a sua bagagem histórica e analisa aquela imagem de acordo com suas experiências. Não há como separar.

Os requisitos básicos para o sucesso no ramo fotográfico

O fotógrafo Felipe Fittipaldi trabalhou em quase todos os segmentos da fotografia, como gastronomia, arquitetura, paisagem, cinema, moda. Ele confirma que a versatilidade se revela essencial à  formação:

– É importante, para o profissional, que ele aprenda a parte técnica de diferentes segmentos, além de adquirir mais conhecimento e cultura.

 Carolina Bastos 

Fittipaldi lembra que perseverança e dedicação são igualmente “cruciais“. Segundo ele, “estudar o que você vai fotografar sempre traz um resultado melhor ao seu projeto final”. Teixeira reforça que esse estudo ajuda a “focar no que é mais importante“. O fotógrafo da agência Reuters Sergio Moraes concorda e recomenda um contato prévio com o local da foto.

Custódio Coimbra, do jornal O Globo, diz que também é necessário sair de trás das lentes para olhar o mundo. Ele destacou, em uma das palestras, as crescentes exigências do mercado apontam para um profissional multimídia. “O fotógrafo não pode ser mais só um fotógrafo”, sintetizou.

O fotógrafo Marcos Lima lembrou aos estudantes que nem sempre se começa na função desejada. Ele iniciou a carreira como assistente de fotografia na revista Quem. Servia café e carregava equipamento, mas considera essa etapa como uma das mais importantes para o profissional:

– Todo fotógrafo precisa lidar com o meio antes de entrar nele totalmente.

Marcos ainda lembrou que, para se destacar, o fotógrafo precisa arriscar:

– Precisa tentar coisas inéditas. Às vezes, o erro e o sucesso podem estar juntos.

 Luisa Nolasco

Custódio: “Nessa era da interatividade, a fotografia não estará mais sozinha”

A maioria dos palestrantes reforçou a importância do domínio das novas técnicas e tecnologias incorporadas à profissão. Custódio acredita no fim do papel. “A fotografia vai para as paredes, os vídeos agora são mais importantes”, argumentou. Ele destaca o poder de síntese do fotógrafo como sua principal característica, e acredita na sua adaptação para o meio audiovisual:

– Essa capacidade de síntese facilita a produção de um vídeo. Você ganha o áudio e a possibilidade de parar aquelas imagens na hora que quiser. Nessa era da interatividade, a tendência é o movimento, algo mais ágil. A fotografia não vai mais estar sozinha.

Sergio Moraes também acredita na fusão, mas confia na sobrevivência da “fotografia autêntica”:

– A fotografia tem o poder histórico de ser armazenada, de ser um documento com um valor histórico de um momento exato.

Custódio ressalvou que o vídeo peca em um quesito: “não tem a essência do momento decisivo que a fotografia tem. O profissional pode perder a unicidade do momento”. Já o fotógrafo de publicidade Aderi Costa alertou que, com o advento da tecnologia de edição de imagem, as interferências tendem a se intensificar:

– Não é uma boa foto se não está editada. O programa Adobe Photoshop agora é necessário em todas as fotos. O mercado – especialmente publicitário – exige hoje montagens diferentes para que a foto seja mais atrativa ao espectador.

Fittipaldi: “Imediatismo é uma ameaça”

Ainda em relação aos desafios da carreira fotográfica, Fittipaldi lembrou que não acreditava que “poderia ganhar dinheiro com algo tão bom”. Com o tempo, o fotógrafo formado em jornalismo pela PUC-Rio viu que não era fácil assim, mas começou a enxergar melhor os obstáculos profissionais:

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– A interatividade reduziu o trabalho do fotógrafo – avalia.

Fittipaldi apontou também o imediatismo como ameaça, pois induz o “fotógrafo e o repórter a perderem o foco e fazerem tudo de forma mais ágil e com menos qualidade“:

– Com pouco tempo, o fotógrafo não consegue pensar na melhor foto, no melhor ângulo, e o repórter apenas joga a informação. O jornal deveria ser formador de opinião, e não só dizer o que aconteceu.

Sergio Moraes e Evandro Teixeira lamentam que o mercado seja maior em São Paulo e orientam “que o espaço maior é para aquele que produz para depois oferecer“.

– Projetos autorais são a solução. É importante acreditar e buscar, produzir o material – aconselha Evandro. 

Uma esperança através das lentes a fotografia para todos

Kita buscou alternativas fora das grandes redações. Ela é editora de fotografia do Viva Favela, um projeto jornalístico no qual os produtores de notícias são os próprios moradores de comunidades carentes. Segundo a fotógrafa, a intenção é “enxergar a favela com outros olhos”:

– Geralmente, fotos e reportagens sobre favelas têm um olhar externo, de quem não vive lá. A ideia é entender como as pessoas que estão lá dentro lidam com a aquela realidade, com um viés jornalístico.

 Luisa Nolasco

Kita também também coordena o projeto Imagens do Povo, da ONG Observatório de Favelas. O objetivo é oferecer aprendizado da linguagem fotográfica, “difundindo diferentes visões dos espaços populares”. Os fotógrafos Fabio Caffé e Francisco César fazem parte da iniciativa. Dão aulas de fotografia em diferentes comunidades carentes do Rio. Alguns de seus ex-alunos se tornaram profissionais, como autônomos ou funcionários de empresas de comunicação. Para Fabio, esse tipo de ação “pode despertar no participante uma paixão desconhecida”:

– Ele (o aluno) às vezes nem sabe que gostava daquilo. Mas, ao fazer a aula, percebe que tem um olhar para a fotografia. As aulas para crianças podem ajudar a trilhar caminhos melhores em suas vidas – destaca.

Características de alguns segmentos da fotografia

Durante a semana, as fotografias de publicidade, natureza e celebridades se destacaram por suas especificidades e por reunirem diferentes visões profissionais. O fotógrafo Marcos Serra Lima trabalha com celebridades “só para pagar as contas”. Já o fotógrafo Matthew Shirts, editor da National Geographic Brasil, acredita no potencial da fotografia de natureza como um alerta a toda sociedade. Abaixo, as principais curiosidades sobre cada área, segundo os especialistas:

Fotografia Publicitária:

  • Manipulação de imagens;
  • Utilização de programas de edição de imagem, como Adobe Photoshop;
  • Divisão de tarefas;
  • Planejamento de todas as etapas da fotografia em equipe;
  • Liberdade na modificação da foto;
  • Elaboração de imagens persuasivas;
  • Cuidados com a veracidade da informação do produto;
  • Perda da essência da fotografia “limpa”.

Fotografia de celebridades:

  • Utilização – às vezes – de programas de edição de imagem, como Adobe Photoshop;
  • Imediatismo, que leva aos cuidados com o equipamento em horas de correria;
  • Violência contra o fotógrafo;
  • Sem horário fixo;
  • Hierarquização no meio fotográfico;
  • Relação mais estreita com celebridades e seus egos;
  • Procurar fotos inéditas e atrativas;

Fotografia de natureza:

  • Dependência de fatores externos;
  • Comunicação direta da preservação do meio ambiente para a sobrevivência humana;
  • Passa mais informação aos leigos do que um texto;
  • Valorização das cores (pouca utilização de preto e branco);
  • Planejamento e execução em longo prazo;
  • Papel social da fotografia. Ex.: 18 parques nacionais foram criados na África depois que o fotógrafo Steve McCurry da National Geographic percorreu o território.