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Rio de Janeiro, 26 de abril de 2024


Cultura

Zizek critica os "rituais obsessivos" da ecologia

Isabela Sued, Bruno Alfano e Pedro Sodré - Do Portal

26/05/2011

Isabela Sued

O Rio de Janeiro recebeu, na terça-feira (24/05), no Cine Odeon, o polêmico filósofo esloveno Slavoj Zizek. Para promover os livros Em defesa das causas perdidas e Primeiro como tragédia, depois como farsa, publicados no Brasil pela Boitempo Editorial, o “Elvis Presley da crítica cultural”, como é conhecido, atacou a forma de se pensar a questão ecológica e o modelo do capitalismo de excesso.

Na análise de Zizek, “a ideia da ecologia está impregnada por ideologia”, pois se tornou mais um estilo de vida do que uma causa efetiva. Para o filósofo, a noção de natureza harmônica está equivocada.

– Não há uma mãe natureza. Nem há um equilíbrio natural – afirmou, na conferência apresentada para cerca de 800 pessoas na Cinelândia.

Segundo o autor, o que o homem faz não é pecado, pois ele também é parte da natureza. Zizek, entretanto, se opõe ao discurso ecologicamente correto individual. Para ele, ao comprar comida orgânica, ecobags ou consumir produtos que supostamente protegem o meio-ambiente, as pessoas acreditam fazer parte de uma grande mudança.

– O homem se sentia mal consumindo, mas o próprio capitalismo transformou essa situação. Agora, pagando um pouco mais, o consumidor se sente contribuindo para a questão ambiental.

Para o filósofo, é o caso da cafeteria Starbucks, por exemplo, que se compromete a doar parte do seu lucro para caridade.

– Como se, ao tomar um café, você estivesse ajudando a salvar o mundo, prevenindo o desmatamento ou ajudando crianças com câncer – afirmou.

Isabela SuedPara ilustrar a situação, Zizek também deu o exemplo do torcedor de futebol que grita em frente à televisão e acredita, como o ecologista contemporâneo, fazer alguma diferença no resultado final. Para o autor, a solução deste e de outros problemas da humanidade está na reelaboração do problema.

– O pensamento livre é uma arma poderosa. Nós, intelectuais, não devemos nos sentir culpados por usá-la – lembrou. – Eu duvido que possamos oferecer soluções, mas podemos e devemos redefinir o problema.

O professor Paulo Durán, do Departamento de Sociologia e Política da PUC-Rio, no entanto, acredita na importância dos “rituais obsessivos” da questão ecológica.

– Eu concordo com ele, mas não no sentido de acabar com esses tipos de prática, porque são importantes para o mundo contemporâneo – ressalvou.

Segundo o sociólogo e professor da UERJ Emir Sader, que compôs a mesa junto com o filósofo e o decano do Centro de Teologia e Ciências da PUC-Rio, Paulo Fernando Carneiro de Andrade, o homem não deve permanecer na condição de vítima da natureza.

– Estou de acordo com o que Zizek fala da ecologia. A humanização da natureza é um objetivo fundamental – ressaltou ao Portal. – A sustentabilidade não pode ser um tema só ecológico, tem que ser social e ecologicamente sustentável.

Isabela SuedPara Sader, o esloveno adquire importância na filosofia contemporânea, pois propõe alternativas ao pensamento crítico.

– A visita é importantíssima pelo caráter iconoclasta de Zizek. De colocar tudo em questão, indo na contramão do pensamento único. Os livros dele são uma fábrica de ideias. Você pode até não estar de acordo, mas é o melhor interlocutor possível para discutir problemas – ressaltou o professor.

Considerado um dos mais importantes pensadores da Europa, Slavoj Zizek é conhecido por escrever numa abordagem lacaniana e marxista sobre temas como a cultura pop e o cinema, o leninismo e também a política e a subjetividade.

– Zizek é uma espécie de grande provocador – afirma o professor Pedro Claudio Cunca, do Departamento de Relações Internacionais da PUC-Rio. – Busca autores como Mao Tse Tung e Lenin para, com seus discursos, desvendar a possibilidade de se pensar de novo o direito de agir, de produzir um outro discurso. 

Segundo o professor, Zizek consegue fazer a crítica da sociedade atual e do capitalismo de excesso. O autor mostra que a atual sociedade, explicou Cunca, faz com que o sujeito acredite que é livre porque faz suas próprias escolhas, mas suas escolhas vão de acordo com o que o capital orienta.

– Zizek traz referências como aquela pergunta do Brecht: "O que é roubar um banco em comparação com fundar um banco?" para nos lembrar da importância de ter uma posição face ao caráter catastrófico desse monstro que o capitalismo se converteu, nessa lógica global devoradora e autoritária – afirmou.

Isabela SuedO convite de Zizek, segundo Cunca, é de não se acomodar.

– Só porque a ideia da revolução se degenerou nessa ou naquela posição, não significa que não tenhamos o direito de pensá-la novamente. Porque o resultado de não pensá-la é terrível – ressaltou.

Para o professor, a proposta zizekiana é a de colocar um pensamento novo em ação e ver as possibilidades de novos acontecimentos.

– É preciso ousar pensar – afirmou.