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Rio de Janeiro, 25 de abril de 2024


Variedades

"Conquistei tudo que tenho com o futebol de botão"

Bruno Alfano - Do Portal

19/05/2011

Mauro Pimentel

No Baixo Gávea, a Praça Santos Dumont vira um Maracanã a cada domingo. Pelas manhãs, cerca de 20 amigos se reúnem em torno das mesas de futebol de botão para duelarem, em um campeonato por fim de semana. A organização do torneio fica a cargo de uma celebridade da brincadeira: Hamilton Neto, um dos maiores colecionadores do Brasil com 30 mil unidades, dono de uma fábrica e de uma loja de botões. 

Quando tinha oito anos, Hamilton Neto começou a jogar futebol de botão. Introspectivo, não tinha adversários. “Era uma brincadeira sozinha”, lembra. Campeonatos inteiros dele contra ele mesmo. Com o tempo, a paixão e a coleção foram crescendo. Em 1994, a brincadeira passou a ser trabalho quando Hamilton, com 30 anos, conheceu um dono de fábrica de botões e, a partir dali, o menino introspectivo que jogava sozinho começou a caminhada para se tornar uma das referências dos botonistas, como são chamados os jogadores. 

– Em 2001, comprei a fábrica e passei a produzir os botões. Eu os faço sob demanda – conta Hamilton. – Hoje, tenho um apartamento em Jacarepaguá só para guardar a minha coleção e já a expus no Museu do Futebol de São Paulo e no Museu da Inconfidência Mineira.

 Mauro Pimentel Para participar do campeonato da feira de antiguidades, os interessados só precisam ir à Praça Santos Dumont, na Gávea, em qualquer domingo, às 9h. Hamilton empresta times para quem não os tem. A inscrição custa R$ 5. O clima no campeonato é de total brincadeira. Campeão carioca de 2001, o colecionador afirma que não gosta da profissionalização do futebol de botão e que, depois do começo solitário, descobriu como as mesas são capazes de formar amigos. 

– Eu fiz muitas amizades em volta de uma mesa de botão. Lá na praça, se juntam pessoas de profissões diversas: de advogado famoso até atendente de telemarketing. Tem um rapaz que vai com o pai e o avô. Ali virou uma tribo – afirma Hamilton.

 Mauro Pimentel “Atleta” a mais de 30 anos, Carlos Alberto dos Santos é um dos que passam as manhãs de domingo no campeonato da praça. Morador de Del Castilho, Suda, como é conhecido, trabalha no Jóquei e por isso joga na Gávea. O mais velho do grupo, com 69 anos, afirma que o botão é só uma forma de brincar.

– Não gosto quando fica sério demais. Fica chato. Por isso não participo de campeonatos federados. Aqui é brincadeira. A gente joga para fazer amizades – conta.

Para Hamilton, a brincadeira virou negócio. Dono de uma loja e de uma fábrica de botões, não revela o faturamento com a empreitada, mas garante que todo patrimônio conquistado até hoje foi graças à brincadeira.

– Conquistei tudo o que eu tenho por causa dos botões. É meu trabalho. Vivo disso há muitos anos. Tenho loja desde 2001. Trabalho com botão direto desde 1994. Eu tenho meu apartamento, meu carro, minha vida toda por causa dessa paixão – afirmou Hamilton.

 Mauro Pimentel Segundo o empresário, a maior demanda é por botões únicos e raros. Os botões do começo da década de 1950 são mais macios, pois possuem composição química diferente dos modernos e, por isso, são supervalorizados. Além disso, muitas peças foram produzidas em pequenas escalas e a raridade agrega mais valor ainda. Quando todas essas variáveis se juntam com componentes emocionais, o preço de apenas um botão pode chegar a casa dos milhares.

– Eu já vendi um botão por R$6 mil reais. Era o meu segundo botão mais antigo, ele tinha uns 60 anos. Mas eu trabalho com isso. Então, tenho é que fazer dinheiro. Vendo qualquer botão se pagarem o preço que eu pedir. Nesse mês mesmo, um cara queria comprar meu botão mais antigo e eu cobrei R$10 mil reais, mas ele não teve peito – afirma o colecionador.

Como comprador, Hamilton é mais racional do que um apaixonado por botão. O máximo que já pagou foi R$500 por um botão, mas, segundo ele, foi para repor um outro “jogador” do seu time que foi vendido por R$1,5 mil.

– Eu lucrei mil reais nessa. Não dou ponto sem nó – diverte-se Hamilton.

Quem não tem dinheiro faz o que pode para conseguir melhores jogadores. Segundo Hamilton, há quem faça loucuras para conseguir reforçar seus times.

 Mauro Pimentel – Eu já vi trocarem botão por geladeira e até botão por uma moto usada – lembra.

A tradição dos botonistas se renova. No campeonato do Baixo Gávea, Tomaz Rego, de apenas 18 anos, já joga ali há dois. O estudante de Botafogo, depois de conhecer o encontro, levou o pai e o avô, que faleceu logo depois.

– Eu descobri esse torneio do Hamilton porque jogava com amigos no meu condomínio e um deles já tinha vindo. Já estou há dois anos aqui, é divertido – afirma o caçula do grupo e quarto colocado do ranking geral.

O jogo, segundo Hamilton, é baseado em técnica e observação do adversário. Além disso, a sorte é outro componente da brincadeira.

– O jogo de botão é bem estratégico. Você tem que ver como o adversário joga. E tem que ter um pouco de sorte também. Eu  Mauro Pimentel vejo o futebol de botão como o futebol de verdade. Às vezes o cara erra o chute e faz o gol. No botão é a mesma coisa: às vezes você mira num canto e acerta no outro – compara Hamilton.

Para quem ainda não começou a jogar, Hamilton afirma que é só praticar para se tornar um bom jogador. Segundo o especialista, não há um tipo de botão específico para os iniciantes.

– Podem ser os botões de galalite, de baquelite ou o perolado antigo. Não importa. Tudo depende do peso da mão do cara. O jeito é experimentar – aconselha.

* Acesse aqui a galeria de fotos feita pelo fotógrafo Mauro Pimentel