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Rio de Janeiro, 20 de abril de 2024


Campus

"Vamos intensificar o diálogo entre fé e cultura"

Carina Bacelar - Do Portal

25/04/2011

 Arquivo pessoal

Padre José Maria Fernandes foge aos clichês. Ele já foi publicitário, é artista plástico e arquiteto, e concilia as rotinas de pintor, gestor e religioso. Para o mineiro que se mudou para o Rio apenas uma semana após a ordenação, a maior saudade de Belo Horizonte é uma marca registrada do estado: o pão de queijo. À frente do Centro Loyola desde 2009, ele adianta que pretende intensificar o diálogo entre a fé e a arte. O Mutirão de Comunicação, diz ele, é um exemplo deste avanço. Em entrevista ao Portal PUC-Rio, o padre-artista também contra que programa, para o próximo ano, sessões de cinema seguidas de debates, às tardes de sexta-feira. O diálogo entre fé e cinema terá o tempero da arte culinária: as discussões serão em torno de uma mesa de queijos e vinhos – e, é claro, pão de queijo.

Portal – O senhor é formado em desenho pela Universidade Federal de Minas Gerais. Como surgiu o interesse pelas artes? Quando decidiu que queria ter uma formação nessa área?

Padre Fernandes – Minha mãe era professora de artes. Aos 12 anos, fiz o meu primeiro quadro. De lá para cá, já não sei quantos quadros, quantas exposições e quantos projetos eu fiz. Vem de família, está no sangue.

 O que o senhor pintou nesse primeiro quadro?

– Uma imagem do interior de Minas.

– Como foi sua formação artística?

– Frequentei a Ecola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais. Depois fiz especialização em desenho também lá na UFMG. Aí entrou a história da vida religiosa, mas foi depois. Quando as pessoas perguntam se eu sou padre, eu digo “não, sou artista”. Ser padre veio depois.

– Naquela época o senhor já pensava também em ser padre?

– Não, e eu nem me lembro por que entrei na vida religiosa. São coisas que vão acontecendo na vida. Você vai percebendo aos poucos os caminhos, e hoje estou aqui. Muitas pessoas me perguntam se atrapalhou ou se ajudou. Nada atrapalhou. Seguiu o curso normal. Continuei a ser artista, continuo a ser padre e hoje não vejo conflito nenhum aí.

– Como o senhor alia a carreira de pintor à vida religiosa?

– Eu faço muitos projetos de capelas, então aí vem a dimensão do arquiteto. Tem todo o embelezamento que se faz no espaço litúrgico, aí tem a dimensão das artes. E a própria celebração é a dimensão do sacerdote.

– O senhor já viveu alguma situação, especialmente associada às artes, da qual teve de abdicar por causa da vida religiosa?

– Não. Nunca tive nenhum conflito mais acentuado. Tem de vez em quando um “não gosto disso”, ou “por que você fez isso”, mas nada demais. São coisas da vida.

– Como um mineiro convicto veio parar no Rio?

– Não fui eu quem decidi, foi meu superior. No dia da minha ordenação, ele me deu uma carta fechada, na frente de todo mundo na igreja. Ele disse: “Aqui está a sua destinação. Mas você só vai abrir essa carta amanhã, depois que celebrar a sua primeira missa”. Eu guardei então aquela carta, mas no calor das festividades, celebrei a missa e esqueci da carta. Só no meio da semana a abri, e quando eu vi, estava destinado à PUC-Rio.

– Há alguma coisa de Belo Horizonte que particularmente faz falta aqui no Rio?

– Pão de queijo e tutu de feijão.

– Em relação ao Centro Loyola, quais as principais metas?

– Metas temos muitas. Tem a dimensão dos cursos, das palestras, muitos projetos. Agora, sabemos das dificuldades financeiras de mantermos uma casa nessa proporção aqui.

– O que tem sido feito para reduzir os custos?

– Temos conseguido isso por meio de vários cursos. Estamos usando a “filial” da Rua Bambina, em Botafogo, para onde transferimos vários cursos. Começamos a abrir algumas turmas lá e deu muito certo. A ideia é transformar a casa da Gávea em um centro para conferencias, reuniões, e deixar os cursos lá na Bambina.

O senhor pensa em promover mais atividades que mantenham diálogo entre fé e arte, até por conta da sua afinidade com o ramo artístico?

– Sim. Eu mesmo já dei vários cursos aqui, como “A formação do sagrado”, “A técnica dos ícones”. O sagrado está ligado a várias direções da arte, à música, à escultura, à arquiterura, e a gente tem trabalhado nesse sentido.

Há algum novo projeto nesse sentido?

– Nós temos agora, vindos particularmente do Departamento de Comunicação da PUC, eventos sobre o cinema que têm despertado muito interesse. Um deles será sobre os 44 anos do prêmio Margarida de Prata. Durante uma semana, exibiremos filmes premiados com a Margarida de Prata. Estamos negociando com o professor Miguel Pereira a participação de artistas ou dos diretores para um debate. O outro projeto é o Mutirão de Comunicação (Muticom), no qual eu vou dar a oficina “O sagrado e o profano nas artes”.

Que outras novidades estão porgramadas para esse ano?

– Para esse ano, a programação está praticamente feita. Para o ano que vem, queremos implantar um projeto de, às sextas-feiras, no final da tarde, exibirmos um filme seguido de debates. Só que esse debate terá um pequeno detalhe: será em torno de uma mesa de queijos e vinhos.

Mas sem pão de queijo?

– Ah, o pão de queijo vai entrar...

Qual a importância do Centro Loyola para a comunidade PUC?

– O Centro Loyola, desde a criação, tem como princípio o diálogo entre fé e cultura. Daí sua grande relevância, ainda mais dentro de uma universidade, que é um centro cultural por excelência. As dimensões da fé e da cultura se completam.

O projeto inicial, de 1993, quando o Centro Loyola começou as atividades, era de expandir a fé católica. Essa proposta é cumprida? Tornou-se mais, digamos, flexível?

– O interessante é que temos o curso de teologia para leigos desde de 1993. Hoje a gente está revendo esse processo porque vamos descobrindo, em várias paróquias do Rio de Janeiro, pessoas do curso de teologia daqui que estão ministrando cursos nas paróquias. Nós até comentávamos aqui que o objetivo foi atingido. Hoje, nossos alunos estão assumindo essa missão de divulgar a fé.

Qual é o perfil dos interessados em cursos e palestras?

– A variedade é tão grande que é difícil definir um perfil. Atendemos no dia 9, pela primeira vez, um retiro de preparação para a Páscoa só com crianças. Foram 33 crianças aqui. É uma experiência nova.

O senhor acredita que o diálogo com a fé é mais necessário hoje em dia? 

– Sim. O princípio cristão fundamental está baseado em paz e justiça. Olhando para o mundo de hoje, é  o que mais falta.