Projeto Comunicar
PUC-Rio

  • Facebook
  • Twitter
  • Instagram

Rio de Janeiro, 15 de janeiro de 2025


País

"O Brasil precisa de política nacional de comunicação"

Gabriel Picanço - Do Portal

26/01/2011

Mauro Pimentel

O novo Ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, reacendeu o embate que empresas de comunicação travam desde o ano passado sobre a participação de recursos externos na internet brasileira (veja o quadro abaixo do texto). Ao assumir o posto, o ex-titular do Planejamento reiterou que a limitação de 30% de capital estrangeiro nas organizações de mídia também deve valer para os sítios e portais da internet, como defendem as associações empresariais de rádio, televisão e jornais. Paulo Bernardo elegeu como prioridade a realização do Plano Nacional da Banda Larga, para "universalizar o acesso à internet" e contribuir para o crescimento econômico do setor online. Enquanto isso, empresas de mídia tradicionais apontam irregularidades na composição acionaria de sítios e portais brasileiros, com capital estrangeiro acima dos 30% exigidos pelo artigo 222 da Constituição Brasileira. A disputa abre espaços para outras discussões, como o relecionado à categoria de determinados sítios, que não produzem só conteúdo jornalístico. Para a jornalista Patrícia Mauricio, professora de comunicação social da PUC-Rio, sítios e portais devem responder às mesmas regras que gerem os veículos tradicionais:

– A internet é, sim, um veiculo de comunicação social. Não é simplesmente a questão do jornalismo. A televisão não é só jornalismo, e não pode ter mais de 30 por cento de capital estrangeiro.

Segundo o também jornalista Leonel Aguiar, coordenador do curso jornalismo da PUC-Rio, acima das disputas empresariais, deve haver a preocupação com a criação de uma política nacional de comunicação com regras claras, que evitariam disputas empresarias na área:

– É preciso pensar essa questão dos 30% e outros assuntos dentro de um projeto maior, que é a regulação da mídia como um todo no Brasil. Se a gente não tem políticas públicas de comunicação definidas, não dá para discutir esses pontos no varejo. Se não, não se anda. Quem grita mais alto ganha. Nessas brigas, a sociedade não ganha nada e o setor empresarial não avança

Uma das principais dificuldades, observa Leonel Aguiar, remete à identificação do que são capital nacional e capital estrangeiro no contexto da economia globalizada. Isso se torna ainda mais intenso na internet, uma plataforma que já nasceu para ser mundial:

– Nas sociedades globalizadas não se pensa mais a produção de modo local.  Fica difícil definir o que é capital nacional ou internacional nesse momento em que se fala de capitalismo mundial integrado – pondera.

Segundo o sítio www.alexa.com, que faz o ranking das páginas mais visitadas em todo mundo, o UOL é quinto site mais acessado no país, com 29% de capital português. O G1, portal das Organizações Globo, é o sétimo. O Terra, controlado pelo grupo espanhol Telefônica, aparece em 11º. O portal R7, da Record, está na 37ª posição. Para a advogada e jornalista Leise taveira, professora de comunicação da PUC-Rio, as empresas brasileiras estão buscando uma reserva de mercado de olho no crescimento da plataforma, e se sentem ameaçadas pela concorrência dos grandes portais:

– Os veículos defendem uma reserva de mercado, não querem concorrência, porque esse setor é de alta rentabilidade. Eu acho que não tem absolutamente como fazer esse controle. Só a China tenta fazer isso, e ainda assim é driblada.

A origem da restrição à participação estrangeira nas empresas de comunicação no Brasil vem de outro artigo da Constituição, o 221, que trata do conteúdo desses veículos. Determina, entre outras coisas, a “preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas” e a “promoção da cultura nacional e regional”. Até 2002, era vedada qualquer participação de fora na comunicação social brasileira. A Emenda Constitucional 36 atualizou o artigo 222 e passou a permitir a participação estrangeira, porém restrita a 30% do capital.  Para Patrícia Mauricio, a reserva de mercado tem uma base sólida para a defesa tanto do setor empresarial quanto da sociedade:

– Se esse mercado não for reservado, a internet pode estar totalmente na mão de estrangeiro. Como aconteceu com as telefônicas, desde que esse mercado foi aberto. É um mercado que perdemos, um dinheiro que não fica no país. E as estrangeiras não vão ter o compromisso com o país que esperamos que as brasileiras tenham.

 

Em maio do ano passado a Associação Nacional de Jornais (ANJ) e a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) enviaram à Procuradoria Geral da União uma representação acusando empresas de internet de estarem desrespeitando o artigo 222 da Constituição. As associações apontavam o descumprimento na web da determinação segundo a qual “pelo menos setenta por cento do capital total e do capital votante das empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens deverá pertencer, direta ou indiretamente, a brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, que exercerão obrigatoriamente a gestão das atividades e estabelecerão o conteúdo da programação”. Essa representação fazia referência a venda do grupo O Dia para uma empresa portuguesa, a Ongoing. 

Em resposta à pressão das associações jornalísticas, a Advocacia Geral da União deu parecer favorável à aplicação da "regra dos 30%" aos sítios e portais da internet. A advogada e jornalista Leise Taveira, professora da PUC-Rio,  esclarece que a Advocacia Geral da União "não decide, faz um parecer, faz estudos, é um órgão consultivo, de defesa dos interesses da união; decisão é só de juiz". A palavra final caberá ao Congresso.

Representantes das empresas jornalísticas associadas à ANJ e Aberj e dos veículos da internet reuníranm-se em audiências públicas na Comissão de Ciência Tecnologia Comunicação e Informática da Câmara. Mas ainda não se chegou a uma conclusão. “Essa questão ainda vai render muito. Qualquer mudança tem que ser por meio de emenda constitucional, que é algo que demora”, explica Leise.