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Rio de Janeiro, 25 de abril de 2024


Campus

"A PUC era o lugar mais agradável para se estudar"

Juliana Oliveto - Do Portal

10/12/2010

Stéphanie Saramago

Lauro Barbosa da Silva Moreira saiu de Anápolis, Goiás, para passar cinco anos em São Paulo. As atribuições de seu pai, então deputado federal, trouxeram a família para o Rio de Janeiro, onde Moreira passou a estudar no colégio Santo Inácio até, finalmente, ingressar no curso de direito da PUC-Rio, em 1958. Depois da formatura, em 1962, entrou para o Instituto Rio Branco e tornou-se diplomata, chegando até a embaixador.

Mas de volta ao início da história, Moreira relembra que, ao chegar à universidade, uma das primeiras coisas que buscou conhecer foram as atividades ligadas à arte – área com a qual se identificava desde os tempos de escola.

– Na PUC descobri que tinha um rapaz querendo montar um grupo de teatro e descobri porque não dava certo... Ele só queria fazer peças complicadíssimas e cheias de personagens! – contou.

Sem conseguir um grupo para montar peças, Moreira criou o Tepuc – Teatro Experimental da PUC – com o apoio do centro acadêmico de direito. Com o Tepuc, o embaixador montou mais de dez peças e teve seu primeiro contato com as obras de Guimarães Rosa.

– Lembro que fui eleito estudante do ano pelo Diário de Notícias e, logo depois, montamos um grupo chamado Equipe de Teatro do Rio de Janeiro só para fazermos peças do Guimarães Rosa – relembrou.

O fim de sua carreira teatral coincidiu com sua formatura na PUC. Ao longo de 7 anos foram mais de 30 peças, algumas inclusive com ex-alunos da universidade.

 Acervo Pessoal

– Eu e o Pedro Camargo [professor do Departamento de Comunicação Social] fizemos teatro juntos e montamos a primeira peça que Arnaldo Jabor [ex-aluno de direito] escreveu na vida, chamada Bar 50.

Deixando de lado o mundo das artes e relembrando os tempos de aluno de direito, Moreira fala com carinho do professor Jerzy Sbrozek, de Introdução à Ciência do Direito, que costumava dar aulas de segunda a sábado.

– Sbrozek era um polonês, grande autoridade em filosofia, e parece ter sido indicado pelo próprio Papa Pio XII para dar aulas na PUC. Era uma figura única, de sotaque carregado e muito exigente – lembrou.

Segundo Moreira, o professor costumada dizer que estudar de 2 a 3 horas por dia a matéria era o básico para a aprovação no curso. O embaixador disse suspeitar que esse foi o motivo de apenas 15, entre 110 alunos, terem sido aprovados.

– Ele não era um camelô de doutrinas, não procurava facilitar as coisas que são naturalmente difíceis. Não diminuía o nível até o aluno, mas fazia com que o aluno subisse até o nível exigido para a compreensão da questão. Essa figura trouxe para nós uma espinha dorsal, nós éramos invertebrados intelectuais antes dele – confessou.

Além do rígido professor polonês, outra figura marcante na vida do embaixador foi Délio Maranhão, posteriormente ministro do Trabalho. Sendo o oposto de Sbrozek, Maranhão mostrava-se mais aberto, nada dogmático e cético.

 Stéphanie Saramago

– Délio era um sujeito que cultivava a liberdade de pensamento dos alunos, já dava aula no último ano da faculdade, e me marcou muito.

Mesmo com o gosto pelo direito, o embaixador decidiu não seguir carreira na área quando ainda cursava a faculdade. Segundo ele, o motivo da decisão foi um estágio que fez em um escritório de advocacia.

– Quando estava no terceiro ou quarto ano fiz um estágio em um escritório e passei a ter horror da advocacia tal como era praticada no insuportável Fórum do Rio de Janeiro. Era tudo muito confuso e me trouxe um verdadeiro horror – confessou.

Do final da faculdade para o ingresso no Instituto Rio Branco, a história durou sete meses. Moreira conta que perto da conclusão do curso precisou decidir o que fazer do futuro. Um amigo apresentou o projeto de criação de uma escola de teatro fora do estado, onde dariam aulas e montariam peças, mas isso não o animou.

Depois de desistir de vez da carreira teatral, o embaixador encontrou um amigo que estava tentando concurso para o Instituto Rio Branco e lhe recomendou que fizesse a mesma coisa.

 Stéphanie Saramago

– Embora eu tenha pensado no assunto quando entrei na faculdade, a ideia não me passava mais pela cabeça, especialmente porque as provas eram famosas por serem meio loucas, com perguntar como “Para onde está virado o bico do pelicano na capa de Os Lusíadas?” – contou.

Depois de se deixar convencer a fazer o concurso do final do ano, Moreira começou a estudar em setembro. Mesmo com pouco tempo até a prova, o embaixador conseguiu ser aprovado no exame preliminar e em todas as etapas até a final, em março.

– Não tive tanta dificuldade pois sempre fui bom aluno, desde os tempos da escola. Fomos 13 aprovados e me lembro bem de uma figura da minha turma, o Celso Amorim. Ele tá quase batendo o recorde do Barão de Rio Branco no Itamaraty – brincou.

Mesmo com a carreira artística deixada de lado, Lauro Moreira aproveitou sua paixão pela cultura para divulgar o Brasil ao redor do mundo. Entusiasta de Machado de Assis, enquanto embaixador em Portugal realizou diversas conferências para divulgar as obras do autor.

Na formatura de sua turma do Itamaraty, que coincidiu com o ano do golpe militar, o embaixador foi eleito o orador da turma, mas não pôde discursar. Recusando-se a falar outra coisa que não o que havia escrito, Moreira datilografou o discurso e distribuiu entre os colegas.

 Stéphanie Saramago

– Meu discurso foi dedicado a Délio Maranhão, mestre e amigo, e foi meu escolhido porque apesar de grande parte do que aprendi ter sido com Sbrozek, ali falava de algo mais solto, avançado, de esquerda... – revelou.

De acordo com o próprio Moreira, sua vida tem muito a ver com a universidade. Colegas, professores, realizações culturais e o ensino foram marcantes mesmo depois de encerrado seu tempo nos Pilotis.

Ainda aluno da universidade e ensaiando uma peça na Maison de France, Moreira reparou em uma menina na plateia. Perguntando aos amigos, descobriu que a moça em questão era Marly de Oliveira, poetisa e também aluna da PUC.

– Lembro que fui para casa depois de vê-la e saber quem ela era e encontrei na estante um livro dela. Não sei como, não me lembro de ter comprado o livro, mas ele estava lá... Marly foi a aluna mais brilhante que a PUC já teve na área de letras. Nos casamos dois anos depois da formatura e ficamos juntos por 17 – contou.

O embaixador relembrou que naqueles tempos o Rio de Janeiro era outro e a universidade também – não ficava apenas cercada de árvores por todos os lados, mas o próprio local onde estava instalada era algo diferente. Para ele, na época, você poderia estar no Rio de Janeiro, mas retirado dentro da PUC.

– A PUC era o lugar mais agradável do Rio de Janeiro para se estudar. O local era ótimo, as salas amplas e claras, você estudava com todo aquele verde ao redor... Fora as meninas bonitas dos Pilotis – comentou.

 Stéphanie Saramago

Do direito ao teatro, passando pelo casamento e culminando na carreira diplomática, Lauro Moreira diz que leva tudo o que viveu na PUC com carinho.

– Muitos momentos da minha vida estão ligados à PUC e o tempo que passei lá foi marcante, fiz teatro, conheci minha esposa, fiz amigos que encontro até hoje... A universidade me trouxe muita coisa boa.