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Rio de Janeiro, 26 de abril de 2024


País

Dilma procura afirmação internacional do Brasil

Emylinn Lobo e Gabriel Cariello - Da sala de aula

22/11/2010

 Mauro Pimentel

Quando os brasileiros ouviram Barack Obama chamar Lula de “o cara”, sentiram, enfim, o orgulho do reconhecimento. Era o mundo, na voz de Obama, que reconhecia a Lula e ao Brasil sobre sua importância, ou melhor, seu novo papel no cenário internacional. A admiração do presidente estadunidense pelo brasileiro passou por contestações e aclamações, mas foi repercutida em todo o mundo, e confirmou o país como parte das discussões em nível global.

Lula conseguiu colocar o Brasil na pauta dos interesses internacionais, tanto nas questões climáticas quanto nas discussões financeiras do G20 e na consolidação como futuras potências econômicas dos países do chamado BRIC. Ele expandiu a presença brasileira com a criação de mais de 40 embaixadas, especialmente na Ásia e na África, mas teve também seus momentos contestados, como no caso do Irã, na aproximação com a esquerda radical dos presidentes Hugo Chávez e Evo Morales e até mesmo com Manuel Zelaya, no polêmico incidente de abrigo ao presidente de Honduras na embaixada brasileira.

A “Era Lula” durou oito anos e, agora, o Brasil é parte ativa no cenário internacional. Com tanto destaque recebido, o país não deve retroceder em sua posição, e é provável que o próximo governo encontre dificuldades. Nesta primeira década do século XXI, o Brasil se destacou em diversas questões internacionais. “Crescimento econômico” tornaram-se palavras de ordem, e o país demonstrou sobriedade durante a grande crise que transtornou mercados de todo o mundo. Da alcunha “Terceiro Mundo”, o Brasil passou à emergente e entrou no clube de interlocutores importantes.

Com todo este potencial, o país se afirma como uma das principais forças entre os emergentes. Junto com os outros países dos BRICs (Rússia, Índia e China), o Brasil lidera as apostas para ser uma das maiores economias do planeta e tem tudo para se consolidar como o principal exportador agropecuário e de combustível renovável. Para o professor e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da PUC-Rio Ricardo Ismael, é preciso pensar, porém, que o avanço econômico não se traduz em desenvolvimento.

– Como lembra Celso Furtado [economista brasileiro que expôs a relação entre subdesenvolvimento e doutrinas econômicas], desenvolvimento é quando crescimento econômico se traduz em bem-estar social. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) expressa esse conceito, e nele o Brasil está na 75ª posição. Precisa, portanto, melhorar muito – analisou o professor.

O caso brasileiro não difere dos outros membros dos BRICs: no ranking de 2009, a Rússia aparece em 71º, a China em 92º, e a Índia em 134º.

No campo da política internacional, entretanto, o Brasil avança. O país já se tornou um importante interlocutor no G20. Passou a ser ouvido e pode levar para o fórum mundial pautas que discutem questões climáticas e colocam a importância dos emergentes em foco. Professor de Jornalismo Internacional da PUC-Rio, Arthur Ituassu acredita que essa é uma estratégia do Brasil.

– Ao se colocar como uma liderança entre os emergentes, fortalece sua posição perante o mundo na busca de seus interesses – afirmou Ituassu.

Na América Latiana, os críticos alegam que o governo Lula foi fraco na defesa dos interesses comerciais do país e na afirmação do papel de liderança no continente. Com isso, o desafio de Dilma Rousseff, a próxima presidente, é alçar o Brasil à posição de líder na América Latina, buscando a união da região.

Segundo Ismael, o Brasil tem uma vocação natural para esse papel, por causa da força econômica e da dimensão territorial, mas deve atentar-se também para questões sociais do continente.

– Uma eventual liderança não deve ser voltada apenas para ampliar o comércio regional, mas também para consolidar a democracia e os direitos humanos, e fazer avançar o bem-estar social na América Latina – ressalvou Ismael.

Da nova presidente espera-se, também, uma maior dedicação ao Mercosul, já que o Brasil é o parceiro mais potente do bloco. Especialistas afirmam que a conclusão do acordo entre o Mercosul e a União Europeia, travado desde 2004, será uma das prioridades já em 2011, e pode se tornar uma boa oportunidade de o Brasil assumir a liderança das negociações.

Paralelo ao processo de inserção de novas vozes nos fóruns internacionais, há também a busca por novos parceiros e mercados. Desta maneira, a Ásia e a África surgem como peças importantes para o aumento da participação e influência brasileiras.

A relação com os países africanos se aprofundou ao longo do governo Lula. A forte presença de empresas brasileiras no continente mostra que a África pode tornar-se uma parceira estratégica, apesar de ser, atualmente, o destino de apenas 5% das exportações do Brasil. No entanto, essa aproximação não se resume aos interesses comerciais e atinge também aos políticos e culturais. Para Ismael, a postura do novo governante brasileiro deve ser de “cooperação internacional” diante das dificuldades existentes no continente africano.

– O Brasil pode contribuir para o desenvolvimento dos países da região. Mais do que recursos materiais, possui recursos humanos, tecnológicos e de governança que podem ajudar – afirmou o especialista.

Na Ásia, a participação brasileira ficou marcada pelo fato – isolado – da relação com o Irã. O empenho de Lula em promover o diálogo entre o Irã, europeus e estadunidenses desgastou a ação da política externa brasileira na região, que sofreu com críticas veementes. Mas o Brasil pode tirar uma importante lição deste caso. Segundo Ismael, é preciso perceber que política externa não se resume a interesses econômicos.

– A aproximação com o Oriente Médio deve continuar e até ser aprofundada, procurando ir além dos interesses comerciais, respeitando as diferenças entre os povos, mas sem ter medo de afirmar o sistema de valores do Brasil –concluiu. 

Pela importância no cenário político internacional e o fato de o Brasil possuir grandes reservas mundiais de elementos verdes, e caminhar para o uso de energia limpa e de fontes renováveis, fez com que o país torna-se presença constante nas discussões nas Nações Unidas sobre o clima. Junto aos Estados Unidos, China, Índia, África do Sul e aos países europeus, o país participou ativamente da reunião em Copenhague sobre as mudanças climáticas. Alguns críticos, porém, afirmam que o Brasil não vem alcançando resultados concretos porque as negociações continuam sendo conduzidas pelas grandes potências.

Um bom desempenho em questões ambientais pode ser decisivo para o papel geopolítico do país no cenário mundial. O potencial brasileiro é irrefutável, mas para aproveitá-lo, o próximo governo deve investir na educação científica, para que haja um sistema de inovação tecnológica que adeque a economia e a deixe menos dependente de combustíveis fósseis.

Mas, para Ituassu, a questão ambiental não é prioridade no atual e nem será no futuro governo.

– Há uma procura maior pelo desenvolvimento. A questão verde aparece nesta discussão, mas tende a ser subalterna nos partidos – afirmou Ituassu.

O professor de economia da PUC-Rio Sergio Besserman acredita que o Brasil tem condições de ser um líder nas discussões ambientais, mas está muito distante de seu potencial.

– Falta a consciência necessária para percorrer esse caminho. Se conseguisse transformar sua vantagem comparativa em vantagem competitiva, principalmente por meio da maximização do conhecimento, a vaga no Conselho de Segurança seria certa – afirmou Besserman.

O crescimento do país, por outro lado, chama a atenção do mundo para questões internas ainda mal resolvidas, como a violência e a pobreza. As preparações para a Copa do Mundo de 2014 e para as Olimpíadas de 2016 e, principalmente, a exploração das reservas do pré-sal, completam o quadro de um país que tende a ter cada vez mais a sua imagem exposta na comunidade internacional

Segundo Ituassu, o Brasil é “um ator novo, mas não está levando perspectivas novas ao cenário internacional, apenas reproduzindo práticas antigas”. Defensores da diplomacia brasileira dizem que já não existe questão em que o país não se envolva. O Brasil tem se tornado uma das principais vozes dos emergentes, na busca de uma nova reorganização do sistema internacional.