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Rio de Janeiro, 23 de abril de 2024


Saúde

Estresse no dia a dia reproduz riscos de tensão extrema

Carina Bacelar - Do Portal

26/10/2010

Mauro Pimentel

Depois de o mundo ter parado, no dia 13 de outubro, para acompanhar o resgate dos 33 mineiros chilenos presos a 700 metros de profundidade durante 69 dias, as dúvidas voltam-se para as sequelas psicológicas. Especialistas esclarecem que não só em casos extremos a saúde mental fica abalada. A tensão no dia a dia já representa uma ameaça. O psicólogo e professor da PUC-Rio Alberto Filgueiras alerta que profissões submetidas a estresse frequente podem provocar traumas semelhantes ao confinamento. Segundo Elizabeth Ribeiro dos Santos, também do Departamento de Psicologia, cuidados com a alimentação, atividades físicas e lazer no tempo livre ajudam a prevenir e a contornar transtornos do gênero.

O estresse em excesso, traço recorrente do mundo contemporâneao, está associado a uma série de razões. De acordo com Filgueiras, é causado, por exemplo, por situações que aumentam simultaneamente a atividade fisiológica, a atenção e a concentração; por comportamentos agressivos; e até por concentração extrema. Seus sintomas vêm da liberação de hormônios corticosteróides na corrente sanguínea.

Algumas atividades mostram-se mais sujeitas a essas situações. No “grupo de risco” estão, por exemplo, controladores de voo, pilotos, motoristas, profissionais do mercado financeiro, médicos, bombeiros, mergulhadores, operadores de caixas, pedreiros e operadores de máquinas pesadas.

Teste: Você sofre de estresse no trabalho?

O psicólogo Alberto Filgueiras propõe um teste simples para  verificar se o estresse sequestrou o cotidiano. No período de um mês, você:

1-Apresenta elevados índices de ansiedade diante de coisas simples do dia a dia, como ir ao trabalho ou sair de casa?

2-Sente apatia, perda de memória e desprendimento emocional diante situações que normalmente lhe despertavam reações emocionais?

3-Tem revivido constantemente um evento traumático recente?

4-Passa a evitar situações que estejam envolvidas com as atividades que o estressam?

5-Fica nervoso ou irritado com facilidade, ou sente-se incapacitado para atividades cotidianas além do habitual?

Se respondeu SIM para três ou mais perguntas, o conselho do especialista é “mudar hábitos”. Atividades físicas regulares, como caminhadas em parques, e meditação são boas opções. Em casos mais graves, é recomendado buscar orientação de um psicólogo ou psiquiatra.

 – Praticamente todas as profissões têm uma parcela grande de estresse contínuo. Qualquer pessoa muito preocupada com o trabalho pode ser considerada em estresse agudo. Até mães que se preocupam demais com os filhos apresentam níveis de estresse elevados – observa Filgueiras.

O psicólogo explica que pessoas assim podem desenvolver sintomas simples, como ansiedade constante, apatia pela rotina, irritabilidade, pequenos lapsos de memória e baixo rendimento nas atividades cotidianas, em casa ou no trabalho. O estresse pode evoluir, no entanto, para um trauma mais grave. Nesses casos, o hormônio Cortisol, liberado em níveis elevados no sangue, causa desde tonturas ocasionais, elevação da pressão arterial e formigamento nas extremidades do corpo até complicações cardíacas, lesões cerebrais e paralisia parcial do corpo.

– Estresse demais pode matar – alerta o especialista.

Quem sofre com o problema muitas vezes não percebe o risco embutido em comportamente diários próprias – supostamente inofensivos, mas suficientes para potencializar os efeitos da tensão frequente. A deterioração das relações pessoais pode ser um sinal do poder corrosivo do estresse. Segundo o psicólogo, a separação entre vida pessoal e trabalho, como muitos acreditam, revela-se um equívoco:

– Um pai que se preocupa e briga demais com seu filho, acaba carregando esta agressividade para o trabalho, tanto quanto um policial que carrega para casa a agressividade gerada pelo enfrentamento com marginais. O estresse causa um desprendimento principalmente das relações emocionais.

Maria Elizabeth Ribeiro dos Santos, diretora do Departamento de Psicologia da PUC-Rio, ressalta que o estresse no trabalho traz sintomas psíquicos e físicos, como tonturas, distúrbios do sono, dificuldade de concentração e problemas digestivos.  Quando o alto nível de estresse perdura, pode-se desenvolver um conjunto de sintomas conhecido como Síndrome de Burnout ou Síndrome de Esgotamento Profissional.

Elisabeth sugere algumas medidas relativamente simples para aliviar a ansiedade da rotina de trabalho: alimentação equilibrada, com baixa ingestão de açúcar e de gorduras nocivas; programa regular de atividades físicas; tempo para o lazer. Ela esclarece que não há receitas para uma atividade ser considerada “relaxante”, pois “aquilo que satisfaz um indivíduo pode não ter apelo algum para outra pessoa”.

No Procon, racionalidade é a receita para manter a calma

Em alguns casos, o estresse frequenta no trabalho vem de fora. No posto do Procon na PUC-Rio, em funcionamento no escritório modelo de advocacia da universidade, os atendentes (estudantes de direito) administram conflitos com consumidores não raramente indignados com supostas perdas ou impasses.

João Paulo Brum, no órgão há um ano, explica que as reclamações contra grandes empresas transformam-se, com mais frenquência, em conflitos mais intensos. Segundo ele, o cliente mal informado muitas vezes perde o controle ao tomar conhecimento de que não tem os direitos que pensava. Nesses casos, a consulta, ou a reclamação, costuma pender para o lado emocional, embora o direito seja baseado em critérios racionais.

Para Luciana Kalil, outra prestadora de serviços do posto, os profissionais de direito do consumidor devem ter a consciência e o preparo emocional necessário à atividade. Ela garante que, na maioria das vezes, é fácil de manter o equilíbrio diante da tensão dos clientes. Desde que o profissional tenha condicionamento técnico:

– É tudo baseado no uso de uma técnica. Outros profissionais, como juízes e psicólogos, também precisam assumir uma postura de neutralidade para o bom exercício de seus ofícios.

João Paulo e Luciana reconhecem, no entanto, que os ânimos às vezes ficam “exaltados” no escritório modelo. Admitem tammém que raramente se desconectam dos problemas do trabalho, mesmo nas horas vagas:

– Vamos para bares, saímos e nos divertimos, mas nunca conseguimos nos desligar totalmente da profissão – diz João – Sem contar que há sempre algum amigo pedindo um esclarecimento ou algum conselho jurídico.