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Rio de Janeiro, 15 de janeiro de 2025


País

Rede estadual sofre com exoneração de professores

Thaís Chaves - Do Portal

21/10/2010

  Bruno Alfano

A professora Carla de Medeiros Silva lecionava na rede pública do estado à noite, no Leblon, e na rede municipal durante o dia, em Duque de Caxias, mas deixou de dar aulas no colégio estadual por causa do baixo salário. Carla optou por fazer mestrado e continuar ensinando na rede municipal. Igual a ela, cerca de cinco professores por dia útil deixaram, exonerados, a rede de ensino estadual entre janeiro de 2008 até junho deste ano.

Os principais motivos das exonerações são as condições de trabalho ruins e os baixos salários. Uma pesquisa realizada pelo Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do Rio de Janeiro (Sepe) e divulgada no Diário Oficial do estado calculou um total de aproximadamente 10.470 professores e funcionários exonerados e aposentados no período, o equivalente a 23 por dia útil.

A assessoria de imprensa do Sepe afirmou que a reposição não acompanha a saída dos professores. Em 2010, foram convocados pela Secretaria Estadual de Educação pouco mais de 2 mil professores e só ao longo do ano saíram 1.215, sem contar a evasão dos anos anteriores. Procurada, a assessoria de imprensa do governo estadual não se pronunciou sobre o assunto.

Nesse contexto, professores e funcionários da rede estadual realizaram, no dia 28 de abril deste ano, uma paralisação de 24 horas para exigir melhores condições de trabalho. Os manifestantes reivindicaram um ajuste de 48% para todos os funcionários da categoria, a incorporação imediata da rede estadual no programa Nova Escola – projeto de avaliação institucional das escolas da rede estadual do Rio de Janeiro. Tal avaliação considera o desempenho profissional e gestão escolar e oferece gratificação salarial, de acordo com uma escala de pontuação obtida pela escola. Além disso, demandaram também a entrada dos funcionários administrativos no plano de carreira do magistério público estadual – possibilidade de progressão do profissional de ascender de acordo com o nível de formação, tempo na escola e merecimento.

 Arquivo Pessoal Na opinião da diretora do Departamento de Sociologia e Política da PUC-Rio, Angela Randolpho Paiva, os baixos salários da rede de ensino estadual causam a falta de bons professores nessas escolas. Como os professores têm ensino superior, eles ficam pouquíssimo tempo, dada a ausência de perspectiva de crescimento profissional. Segundo a diretora, mesmo que essas pessoas tenham vocação para serem professores, permanecem pouco tempo na rede de ensino por falta de motivação.

– Não tem como se submeter a um salário desses, além de as condições das escolas serem péssimas – ressaltou.

Para a professora, é uma controvérsia o estado ser rico e, ao mesmo tempo, considerado como o segundo pior do país em educação pública, na frente somente do Piauí, de acordo com pesquisa realizada pelo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). A nota do estado, em 2009, foi de 3,3. No Piauí, o grau obtido foi 3,0. Segundo a diretora, faltam políticas públicas e educacionais no estado.

– Nossos jovens alunos do departamento que vão lecionar na rede de ensino estadual permanecem por no máximo um ano – contou.

 Stéphanie Saramago Segundo a professora do Departamento de Educação da PUC-Rio Cyntia de Carvalho, o problema é uma reação à falta de perspectivas de uma carreira digna de docência na rede estadual. Os baixos salários acrescido das poucas possibilidades de melhora ao longo do tempo e o ambiente de trabalho deteriorado, na maioria das escolas, são alguns dos exemplos citados.

– Os que mais sofrem com isso, sem dúvida, são os alunos. Eles podem passar o ano ou metade do ano sem ter professor de matemática, de química ou geografia, por exemplo. Podemos imaginar que esse aluno continua cursando o colégio sem aquelas disciplinas, ele é aprovado na matéria e passa para a série seguinte sem estudar parte do currículo, às vezes até todo o programa, simplesmente porque não teve professor – argumenta.

Não há soluções na área a curto prazo, segundo a professora Cyntia de Carvalho. Para ela, a resolução total dos problemas demora, no mínimo, uma ou duas gerações. O aumento salarial e a revisão das condições de carreira e da escola são alguns dos passos iniciais.

– Grande parte das escolas estaduais situadas no município do Rio funcionam à noite em prédios municipais que estão disponíveis nesse horário. As consequências são que a escola diminui a oferta para os alunos no horário diurno, prevendo que eles trabalhem de dia, o que nem sempre é verdade. Mesmo para quem trabalha, o próprio horário noturno é complicado. O estudante trabalha o dia inteiro e ainda vai para a escola. A carga horária encurta, não é a mesma dos outros colégios. Uma das melhoras, no entanto, foi a inclusão da refeição, mas só isso não resolve o problema, a evasão continua – afirmou.

 Divulgação A coordenadora do Sepe, Maria Beatriz Lugão, afirmou que o ensino nessas escolas não vai melhorar sem o aumento salarial dos profissionais e o aprimoramento das condições de trabalho na escola, sem “maquiagem”.

– O governo prometeu recuperar o poder de compra com reajuste salarial de mais de 60%, mas só deu 12% de reajuste. O salário vai chegar a quase R$ 1.000 só em 2015. Enquanto a escola não recupera sua dignidade, é muito difícil melhorar – avaliou.

Segundo a coordenadora, o número de aulas dos alunos era de 30 por semana, até 2004. Atualmente, devido à falta de professores, as crianças têm 25 aulas, no mesmo período. O governo, conforme disse Maria Beatriz, deve recompor o quadro pedagógico da escola, porque o professor fica sozinho, sem orientador e nem coordenador.

– As crianças ficam sem aulas. O rodízio de professores é grande e quebra a continuidade do ensino pedagógico – ressaltou.

 Arquivo Pessoal A situação das escolas do município do Rio de Janeiro, segundo a coordenadora, é melhor que as do estado, mas também é muito precária. De acordo com ela, a conservação das escolas e os salários, em geral, dependem do município onde estão situadas.

As escolas estadual Antonio Maria Teixeira Filho e municipal Senador Afonso Arenas, de acordo com a professora Carla de Medeiros Silva, são bastante diferentes. O colégio estadual era organizado, apesar de pequeno, com só dois andares. As aulas são à noite e a maioria dos alunos são adultos. Apesar de os salários serem mais altos nas escolas municipais, elas têm menos infraestrutura. Por exemplo, os professores têm de pagar a xérox para as provas.