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Rio de Janeiro, 16 de abril de 2024


Campus

"Na PUC, passei a escutar Chico, Milton Nascimento, Gal"

Gabriel Picanço - Do Portal

10/12/2010

 Mauro Pimentel

A história de Jamari França com o rock começou em 1964, quando o garoto de 14 anos entrou em um cinema do Grajaú para assistir ao badalado Os reis do iê-iê-iê. “Entrei na primeira sessão e só saí na última”. Foi a primeira vez que ouviu Beatles. Não parou mais. Ali também começava o caminho rumo ao jornalismo. De química, física e matemática, queria distância. “Se dependesse dessas matérias, estaria fazendo vestibular até hoje”, brinca.

Apesar do pouco afeto pelas ciências exatas, chegou a pensar em ser engenheiro. “Mas tomei pau para todo lado”, conta Jamari, referindo-se particularmente às provas de matemtática. Assim, preveleceram o interesse e a aptidão pela área que escolheria. Tinha boa redação − ganhou concursos no colégio João Alfredo, em Vila Isabel − e devorava os jornais, especialmente as notícias internacionais e de música, é claro.

Quando entrou na PUC, em 1972, a vida do garoto da Zona Norte do Rio começaria a mudar. O contato com colegas de origens e pensamentos diferentes causou, em princípio, certo estranhamento:

− Havia um desnível grande. Eu estava praticamente infiltrado. Não tinha preconceito, mas a realidade era diferente. Mesmo vindo de uma escola boa, não se comparava com as ótimas escolas da Zona Sul, de onde vinha a maioria dos meus colegas.

A pluralidade se transformaria em combustível para o desenvolvimento humano, acadêmico e profissional. Jamari tratou de absorver ao máximo o que o admirável mundo novo lhe oferecia. A biblioteca, o convívio com os professores que também trabalhavam nas redações, as atividades culturais e políticas. Até o gosto musical, antes exclusivamente voltado para o rock, foi influenciado pela vida universitária:

− MPB, eu tomei conhecimento com as pessoas de lá. Passei a escutar Chico Buarque, Milton Nascimento, Gal Costa. Antes, era só Led Zeppelin, Grund Funk Railroad. Até hoje eu sou um pouco radical, mas abri bastante o leque.

 Mauro Pimentel A colega de turma Claudia Chaves, hoje professora da universidade, descreve a "figura sempre envolta por rock e jornalismo":

− Ele inventou o walkman − brinca. − Assistia às aulas ouvindo rádio de pilha, com o chamado egoísta (o fone da época). E andava abraçado àquele monte de jornal.

Também na PUC, Jamari interessou-se pela militância estudantil. Foi presidente do Diretório Acadêmico por dois anos. Conviveu com o clima de medo e resistência que cercava a Vila dos Diretórios e o ambiente universitário do país nos tempos da ditadura militar.

Considerados leitura subversiva e motivo de prisão, jornais de esquerda recebidos clandestinamente e edições portuguesas de obras marxistas eram os prediletos de estudantes como Jamari. Embora ainda se considere de esquerda, não concordava com o discurso exacerbado de alguns colegas. Em sua gestão, juntamento com os outros diretórios, preocupava-se também em promover shows e atividades culturais. 

−  Havia uns grupinhos de esquerda que defendiam a revolução proletária. Eu participei do que eu achava que era certo − lembra.

Em meio a histórias de colegas presos e violentados, um episódio atingiu diretamente Jamari: a reação a publicações no Suíte, jornal do diretório. As entrevistas com personalidades consideradas subversivas, como Dom Helder Câmara, e artigos sobre o golpe militar no Chile renderam, a ele e a outros presidentes de diretórios, um “convite” ao Dops. Lá, receberam a seguinte recomendação: “ É perigoso ficar falando dessas pessoas, que são contra a democracia, que querem implantar o regime comunista”. 

− A gente foi chamado ao Dops para receber uma bronca. O diretório de letras, que se chamava Jackson de Figueiredo [em homenagem ao advogado e jornalista morto em 1928), foi "intimado": “Quem é o Jackson Figueiredo, o dono do diretório?” O nosso, chamado de Tiradentes, pelo menos eles já sabiam quem era. Não intimaram o Tiradentes, só a mim − ironiza.

 Mauro Pimentel As exepriência do mundo universitário ajudaram a formar o tônus profissional. Como jornalista, Jamari trabalhou na extinta revista Manchete e por muitos anos na editoria internacional do Jornal do Brasil. Graças ao envolvimento com o rock, também vislumbrou o renascimento do gênero no país: 

 − Em 1982, reparei que começaram a aparecer, tocando em bares, umas bandas com nomes estranhos: Kid Abelha e os Abóboras Selvagens, Paralamas do Sucesso… E comecei a assistir.

Era o rock brasileiro, adormecido desde os tempos da Jovem Guarda. O trabalho de Jamari nas colunas Rock Clips e Danceteria do Caderno B do Jornal do Brasil contribuiu para a consolidação do gênero. No Globo, a jornalista Ana Maria Baiana seguia caminho semelhante. Shows no Circo Voador e a vitrine da Rádio Fluminense, especializada no gênero, impulsionavam a retomada do rock nacional.

− Aí as gravadoras se ligaram e começaram também a procurar essas bandas. O negócio foi crescendo e eu fui acompanhando − orgulha-se o crítico.