Carina Bacelar e Mariana Broitman - Do Portal
05/10/2010A caligrafia das urnas começa a desenhar os próximos quatro anos do Brasil. Já foram eleitos 17 governadores, inclusive Sérgio Cabral, para o segundo mandato no Rio. Petistas e peemedebistas ampliaram a maioria da base governista num Congresso que terá o palhaço Tiririca e o ex-governador Anthony Garotinho. Tiririca, o anticandidato, cravou o recorde de 1,3 milhão de votos e garantiu a carona para os colegas de ocasião. Garotinho, mais de 600 mil votos, lidera a lista dos eleitos que poderão ser barrados caso o Supremo confirme a vigência da lei da Ficha Limpa para este ano. Em Minas, o tucano Aécio Neves saiu-se duplamente fortalecido. Elegeu-se senador e fez o sucessor, Antônio Anastasia, numa virada eloquente sobre Hélio Costa, do PMDB.
Apesar dessas e outras definições grafadas pelas urnas – algumas, como a votação expressiva de Marina Silva, invisíveis aos institutos de pesquisa –, sobram dúvidas, incertezas, apostas. A começar pela corrida atrás capital político de Marina. Como José Serra e Dilma Rousseff tentarão captar os 20 milhões de votos depositados na candidata do PV à Presidência? Quem larga na frente? Quel peso terá o "fator Aécio" na reta final da corrida ao Planalto? Qual será a feição do "novo" Congresso? O que muda se os fichas-sujas ficarem de fora? Embora as respostas só comecem a se materializar no próximo dia 31, quando os brasileiros retornaremos à votação, analistas políticos, como os professores da PUC-Rio Ricardo Ismael, César Romero Jacob, Arthur Ituassu e Eduardo Raposo, esboçam caminhos indicados pelas pegadas eleitorais. Adiantam, por exemplo, as tendências da "onda verde" de Marina.
Quem herda os 20 milhões de eleitores de Marina Silva
Ricardo Ismael, professor do Departamento de Sociologia e Política, acredita que o eleitorado de Marina Silva está frustrado com a derrota da candidata ainda no primeiro turno, pois grande parte dele não quer ver nem Dilma nem Serra eleitos. Heterogênios (desde as elites culturais aos evangélicos), esses eleitores ainda “vão ter que pensar muito” antes de apoiarem outro candidato. O Sociólogo acredita que muitos deles podem anular o voto.
Quanto à decisão da candidata, Ismael avalia que ultrapassará as questões de seu partido, dividido entre o apoio a Serra e a Dilma, e será uma decisão própria de Marina. Nesse sentido, antecipar qualquer decisão seria precipitado. Pois, se por um lado Dilma e Marina tiveram uma relação desgastada pelos constantes atritos quando ambas estavam no governo, por outro Serra e Marina possuem muitas divergências ideológicas.
O sociólogo observa que dois caminhos podem ser trilhados por Marina a partir de agora. Um deles seria manter a neutralidade vislumbrando preservar a sua imagem, que saiu fortalecida do pleito de domingo. O outro, alinhar-se a um dos candidatos em busca de maior participação do PV no futuro governo, talvez em ministérios de maior relevância que os da Cultura ou do Meio ambiente.
– A Marina sai da eleição como liderança nacional. Poderia ser interessante para ela, de olho em 2014, integrar o novo governo em um cargo importante – pondera o analista.
Já o professor Arthur Ituassu, do Departamento de Comunicação Social, afirma que novas pesquisas indicam quem será o herdeiro de Marina Silva nas urnas: segundo o Datafolha, 30% dos votos da verde irão para Dilma, 50% irão para José Serra e o restante ainda estaria indeciso. Na avaliação de Ituassu, o candidato tucano teria maior liberdade de assumir compromissos com uma agenda ambiental, a fim de atrair votos verdes, do que a candidata petista.
– Já houve um embate do projeto ambientalista com o governo atual. Mas boa parte desses votos não está ligada propriamente à agenda ambiental. Há a classe C e o eleitorado evangélico também – ressalva.
Atrair os votos de Marina, segundo ele, seria uma oportunidade de “reinvenção” da oposição no país. A aliança entre a social democracia e o ambientalismo criaria uma “proposta de vanguarda”. Por outro lado, a neutralidade de Marina pode prejudicá-la.
– Não dá para ela ficar neutra por muito tempo. Isso pode enfraquecê-la, pois estará deixando de usar seu capital político, os 20 milhões de votos que obteve – avalia Ituassu.
Para o cientista político César Romero Jacob, professor de Comunicação e Política, mesmo com o apoio de Marina e do PV a um dos candidatos, haverá uma cisão do eleitorado dela:
– O segundo turno é uma nova escolha. Ao longo da história das eleições, o voto nunca foi transferido maciçamente para um dos concorrentes, à exceção do pleito de 1989, quando Lula conquistou quase todos os votos de Brizola – lembra.
O diretor de pós-graduação do Departamento de Sociologia e Política, Eduardo Raposo, também duvida que a entrada de Marina em uma coligação prejudicará a sua imagem, pois ela teria tomado cuidado em não ser agressiva durante a campanha, poupando seus dois principais adversários de críticas contundentes. No entanto, apoiados ou não pela candidata do PV, Dilma e Serra, para Raposo, “sairão do zero”:
– Os votos são meio livres. Um grupo muito grande de jovens votou na Marina e não há certeza ou ascendência direta de para quem vai esse voto. O cenário é relativamente novo.
Sérgio Cabral: projeções para o segundo mandato
O professor César Romero Jacob considera que a reeleição do governador Sérgio Cabral (PMDB), com 66% dos votos, representa um desejo pela continuidade de políticas públicas, principalmente as Unidades de Polícia Pacificadora (UPP’s). Para o especialista, os principais desafios do segundo mandato de abral remetem à ampliação das UPP’s e das parcerias com o governo federal, garantindo os investimentos necessários às grandes competições programadas para o Rio (Copa de 2014 e Olimpíadas de 2016). A maior dor de cabeça do governador insinua-se na prognóstico de uma oposição mais contundente, sustentada na grande popularidade de Anthony Garotinho (PR), eleito deputado federal.
– Sérgio Cabral pode também começar a pensar em assumir visibilidade nacional, sabendo que em 2014 não poderá mais se reeleger no Rio – acrescenta o cientista político.
Nova feição (?) da Câmara, com Tiririca e Garotinho
#Eleições2010:
Ontem, as eleições foram o assunto principal no Twitter.
Sobre a falha nas previsões dos institutos de pesquisa:
@AlonFe :Os institutos de pesquisa perguntam se alguém anotou a placa do caminhão
@tutinhajp: Eu acho que os institutos de pesquisa tem que aumentar a margem de erro pra 50%. Kkk
Sobre o desempenho dos candidatos celebridades:
@DomMalkovich: O Aloysio Nunes já fez algo importante pelo Brasil. Impediu o Netinho de ser eleito #muitoobrigado
@microcontoscos: O Netinho está tiririca da vida.
@jovemnerd:O Tiririca só precisa cumprir uma promessa de campanha agora: Contar pra população o que faz um Deputado Federal.
@o_lino: Por isso eu sou contra o voto obrigatório, se só as pessoas interessadas no futuro do país votassem, duvido que o tiririca seria eleito.¬¬'
Sobre o resultado surpreendente da disputa presidencial:
@roberto_filho18 : Somos Vencedores!!! @Silva_Marina #marina43 #ondaverde
@HumbertoDantas: O culpado pelo segundo turno na presidência não se chama MARINA, SERRA ou ONDA VERDE. Se chama ELEITOR. Ou democracia, se preferir. Simples!
É muito cedo, segundo Ismael, para determinar qual será a cara do novo Congresso, à primeira vista um tanto caricata com integrantes como Tiririca(PR), Romário (PSD), Garotinho (PR). Ele reforça que os candidatos-celebridade, como Tiririca e Romário, foram convidados pelas legendas para “puxar votos”. Segundo ele, a nova feição parlamentar não será, de modo algum, a gaiatice de Tiririca, cujo eleitorado é difuso demais para se anteciparem propostas que os interessem. Já a campanha de Romário não foi “despolitizante”, mas contou com propostas relacionadas à Síndrome de Down e à implantação de quadras poliesportivas em todas as escolas públicas.
– Se eles vão conseguir contemplar o eleitorado que votou neles, ainda não sabemos. Eles devem aprender ainda o vocabulário e o jogo políticos para se tornarem parlamentares relevantes na Casa e não terem suas propostas deixadas de lado – observa Ismael.
Na avaliação de Eduardo Raposo, o sucesso de uma campanha como a de Tiririca na maior cidade do país é "lastimável". Segundo o professor, agora essa é uma "questão que a ser enfrentada pela Justiça", referindo-se ao uso de candidato-celebridade para carrear votos.
PT e PMDB, os donos do Senado
Com a maioria alcançada nas bancadas do Senado e da Câmara pelo PT e pelo PMDB, a base aliada do governo atual foi ampliada. Ricardo Ismael explica que, se Dilmar ganhar, nada mudará. A maioria governista no Legislativo garantirá uma confortável margem de manobra à sucessora do presidente Lula. Se Serra levar a melhor, a governabilidade em princípio mais sujeita a concessões poderá ser facilitada pelo comportamento nômade do PMDB:
– Se Serra ganhar, o PMDB e os outros partidos menores, que só conseguem sobreviver do lado do governo, podem aliar-se ao PSDB. Isso é relativamente comum no Brasil.
César Romero concorda que há a possibilidade de o PMDB “mudar de lado” com uma eventual vitória do candidato do PSDB. Mas o peso das bancadas só dos partidos de esquerda imporia dificuldades a Serra, se eleito presidente. A vitória petista, porém, asseguraria um Congresso “amigável” se Dilma Rousseff for eleita.
Ficha Limpa
A lei da Ficha Limpa ainda pode mudar a “cara nova” do Congresso, observa Ricardo Ismael. Caso o Supremo confirme a vigência já para estas eleições, a configuração das bancadas será alterada. A do PR, por exemplo, deverá perder seis deputados eleitos graças à votação expressiva de Antony Garotinho, que ficaria impedido de assumir o mandato.
A vitória tripla de Aécio Neves
Eleito senador pelo estado de Minas, Aécio Neves, assim como Marina, saiu fortalecido das eleições. Ricardo Ismael acredita que Aécio já seja uma figura de influência nacional. Embora possa aumentar o fôlego de Serra na reta final, o apoio mais incisivo do líder mineiro terá de ser submetido às próprias ambições de Aécio para a disputa presidencial em 2014:
– O que é melhor para o projeto "Aécio presidente"? Dilma ou Serra? Pode ser que Aécio deixe o acordo com o Serra mais evidente, já que o candidato à Presidência declarou em Minas que não pretende tentar substituir a emenda da reeleição pelo mandato de cinco anos. Por outro lado, uma vitória de Dilma poderia trazer de volta um adversário de peso para Aécio em 2014: o presidente Lula – avalia.
Na visão de César Romero, Aécio enfraqueceu duas lideranças nacionais ao mesmo tempo: Lula e Serra. O presidente, porque assegurou a vitória de Anastasia sobre o petista Hélio Costa em Minas. Quanto a Serra, ficou atrás de Dilma nas urnas mineiras. Com isso, Aécio se afirmou diante de ambos.
– Aécio saiu muito fortalecido, e com cacife para negociar com o PSDB seu apoio maior no segundo turno – analisa.
Institutos de pesquisa
Os especialistas divergiram sobre a eficácia dos institutos de pesquisa. Ismael considerou “fora da normalidade” a diferença entre as projeções apontadas e o resultado nas urnas. Para ele, houve “propaganda” a favor de Dilma Rousseff por parte de alguns institutos, que consideraram “definitiva” a vitória no primeiro turno da candidata do PT, a 15 dias das eleições.
– Muita coisa não pode ser prevista. Deveríamos resgatar um hábito antigo de não confiar tanto nas pesquisas – propõe.
Já Arthur Ituassu afirma que a disparidade entre alguns resultado e as respectivas projeções ficou "dentro da normalidade". A maior surpresa, para ele, remeteu à votação da candidata do PT abaixo das previsões.
– Houve uma mudança muito rápida na última semana de campanha. Ela se deveu, principalmente, à queda da Dilma na classe C, por causa das polêmicas envolvendo a questão do aborto e ao crescimento de Serra em São Paulo e entre representantes do agronegócio, no Centro Oeste, decorrente da valorização do câmbio – acredita.
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