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Rio de Janeiro, 25 de abril de 2024


País

"As mídias digitais não chegam a desafiar a televisão"

Stéphanie Saramago - Do Portal

27/09/2010

 Stéphanie Saramago

O Brasil experimentou, nas eleições desse ano, um novo caminho utilizado pelo marketing político. As novas tecnologias digitais foram mais um ponto das campanhas, incluindo no pacote algumas das principais redes sociais, como o Twitter e o YouTube, que foram intensamente usados pelos candidatos.

Às vésperas das eleições, o professor Wilson Gomes, da Universidade Federal da Bahia e um dos principais estudiosos da área de comunicação e política no país, ministrou um curso de curta duração na PUC-Rio abordando os rumos da ciberpolítica e democracia digital. Segundo Gomes, os candidatos à Presidência no Brasil usaram muito os veículos digitais. "Eles se prepararam para isso”, afirma o professor.

Um forte exemplo desse impacto, de acordo com Wilson Gomes, foi a promoção do candidato Plínio de Arruda, do PSOL, através do Twitter. Plínio de Arruda não demonostra força nas pesquisas de intenção de voto, mas sua página no Twitter é uma das mais visualizadas. O professor ressalta que um candidato com menos de 10% das intenções de voto geralmente não é chamado para participar de debates, ir à televisão, mas, segundo ele, para por conta de sua popularidade no microblog, Plínio de Arruda vem sendo convidado. Wilson Gomes também lembrou do uso das redes pelos outros candidatos. Enquanto as postagens de Dilma têm um caráter de assessoria, as de Serra são mais pessoais e os tweets de Marina são "bem desenhados".

Um ponto levantado pelo professor é que, até o momento, as mídias digitais não chegam a desafiar a televisão como um meio de produção de opinião política. Porém contribuem como uma alternativa, já que o eleitor, hoje, pode consultar outras fontes.

 Stéphanie Saramago Portal PUC Rio Digital: O que muda no exercício da democracia e da política a partir das novas tecnologias digitais?

Wilson Gomes: É meio difícil dizer porque a pergunta poderia levar a pensar que havia um mundo sem mídias digitais, que é a democracia do tipo A, e depois das mídias digitais passou para o tipo B. Os recursos das comunicações digitais se integram a um conjunto grande de elementos, que sempre foram utilizados intensamente, de uma maneira a reforçar o déficit da democracia. Então você vê que há uma grande reforma agora fortalecendo a posição do cidadão, que não é mais frágil na democracia liberal. Como é uma época de grandes conexões, todas essas tecnologias, ferramentas e iniciativas relacionadas fazem parte do pacote daquilo que se usa para tentar melhorar ou reformar a democracia liberal. Por isso, acho que uma grande parte da contribuição está relacionada a essa conexão, isso tudo nós chamamos de internet. Essa é uma época muito favorável à democracia.

Portal: Nas últimas eleições presidenciais de outros países, como exemplo os Estados Unidos, a internet foi um veículo fundamental na campanha dos candidatos. Você atribui o sucesso da campanha, como a de Obama, ao uso da internet?

WG: Não, eu acho que faz parte também do conjunto. Certamente há uma tentativa hiperbólica de exagerar, dizer que sem a internet na campanha não haveria Obama. Acho isso um exagero. Há muitos outros fatores pelos quais o Obama foi escolhido. Mas certamente a internet fez parte do pacote. A novidade que permitiu o efeito Obama foi naturalmente a internet. Não a internet inespecificamente, mas, sobretudo as novidades relacionadas ao emprego de mídias sociais, de compartilhadores de conteúdo, de redes de relacionamento, um conjunto grande de ferramentas até de celular, um conjunto de dispositivos empregados enormemente hoje, que não estavam ao alcance das campanhas tradicionais. Essas ferramentas foram empregadas de uma maneira muito eficiente pela campanha de Obama. Soma-se a novidade do conteúdo e do próprio personagem Obama à novidade das ferramentas e a possibilidade que elas têm de atingir grupos normalmente não alcançáveis pela propaganda e pelos meios tradicionais.

 Stéphanie Saramago

 Portal: Como você avalia o uso da internet pelos candidatos à Presidência no Brasil hoje?

WG: O uso tem sido muito interessante. Não vai se repetir nenhum efeito Obama, mas tem coisas muito interessantes acontecendo. O uso intenso do Twitter, um uso muito interessante do YouTube, onde há muitas visualizações. Vídeos positivos e negativos, por exemplo os vídeos de Dilma [Rousseff] com mais de 2 milhões de pessoas que viram, já os vídeos de [José] Serra com um pouco menos de gente. Eles usaram bastante, se preparam para isso. Quanto ao uso do Twitter, o da campanha de Dilma parece muito com o de assessoria, o caráter dos tweets de Serra parece mais pessoal, os de Marina [Silva] são bem desenhados e o Plínio [de Arruda Sampaio] foi a grande estrela. Plínio esteve sempre nos trending topics (mais visitados do Twitter), e graças a isso conseguiu vantagem, foi à televisão, debates online, eventos que um candidato abaixo de 10% das intenções de voto não comparece.

Portal: Como as novas tecnologias digitais podem contribuir com a cidadania e a responsabilidade na hora de votar?

WG: Um sujeito que tem acesso à internet tem outras fontes de produção de informação política, tem alternativas. Ele não precisa se apoiar no jornal simplesmente, ou nos materiais da campanha. Tem à disposição uma série de outras pessoas com opinião, com comentário, com debate, com registro,  que podem ajudar o sujeito a formar sua opinião.