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Rio de Janeiro, 20 de abril de 2024


País

"Estas eleições são um momento de elevação cívica"

Thaís Chaves - Do Portal

23/09/2010

 Stéphanie Saramago

Reformas trabalhistas, educação pública, desenvolvimento sustentável, diretrizes da política externa, economia. Os temas relacionados às questões macrossociais brasileiras e mundiais e à sustentabilidade são para o coordenador de pós-graduação do Departamento de Sociologia e Política da PUC-Rio, Eduardo Raposo, fundamentais para a agenda do Brasil nos próximos anos. Na segunda entrevista da série com professores da universidade sobre as eleições 2010 do Portal PUC-Rio Digital, o coordenador afirma seu credo na continuidade do desenvolvimento do país, seja qual for o candidato eleito.

Eduardo Raposo avalia também os benefícios do debate para a população, a relevância da polarização política na democracia e a falta de projeto nas campanhas dos candidatos. Segundo ele, de qualquer forma, “vivemos uma época para deixarmos nossas pequenas preocupações rotineiras e cuidarmos do país”.

Portal PUC-Rio: A campanha é um momento de se definir a agenda política do país nos próximos anos. Como o senhor avalia essa agenda que está sendo criada, do ponto de vista da política?

  Stéphanie Saramago Eduardo Raposo: Do ponto de vista da política, quem arrumou o país foi o governo Fernando Henrique Cardoso, o governo Lula aprofundou algumas questões sociais, como o bolsa-família. Com esses elementos e ele como um líder popular muito bem sucedido está fazendo quase uma sucessão imperial. Lula mobiliza todos os seus recursos e seu capital político para sua candidata. Os três presidenciáveis com mais perspectiva de serem votados são a Dilma, candidata do Lula que tem um índice de aceitação extraordinário, o Serra e a Marina, com uma identidade muito grande com questões de desenvolvimento sustentável. Em detrimento de a Marina ganhar ou não, acho que ela está levantando uma pauta importante para este boom que está surgindo. Seja qual for o candidato eleito, vamos passar por um momento de desenvolvimento em que a administração pública está ajustada fiscalmente. O Brasil está com as suas contas em dia. Então, essa agenda é baseada, sobretudo, em relação a esse momento, que vai ser um momento desenvolvimentista, como foi o segundo governo Lula. Temas como sustentabilidade e as questões sociais não podem deixar de estar presentes, mas a pauta está montada em relação às circunstâncias macrossociais brasileiras e mundiais.

Portal PUC-Rio: Os candidatos estão focalizando as questões principais a serem enfrentadas no Brasil em suas campanhas?

ER: Nesse momento de eleição, os candidatos dependem das pesquisas, porque a partir delas é possível ver o que é melhor para os seus discursos. Na minha opinião, eles ficam bastante amordaçados ou engessados. Existe muito pouco projeto. O da Dilma é continuar. O do Serra é fazer mais. São slogans para transmitir a uma sociedade de massa. Então, os candidatos têm de trabalhar muito com frases que sintetizem as suas ideias nas eleições majoritárias.

Portal PUC-Rio: Em sua opinião, quais os temas importantes que os candidatos estão deixando de abordar?

ER: Vários temas importantes não estão sendo debatidos, mas são temas que exigem uma reflexão técnica e que são, de certa maneira, inapropriados a uma campanha majoritária para presidente da República. Logicamente: infraestrutura sanitária, estradas e saúde. Ao aprofundar essa questão pode-se perceber diferentes nuances que deveriam ser ditas. Mas os candidatos comentam as questões tradicionais. Quais são as questões tradicionais? Educação, saúde, emprego e segurança.

 Stéphanie Saramago Portal PUC-Rio: Qual a área que mereceria maior atenção no próximo governo?

ER: A área econômica nunca pode ser desprezada. A área social, em um país como o Brasil, também não pode ser esquecida. A segurança se tornou uma questão fundamental. Como vamos, então, produzir políticas eficientes de segurança? A segurança está interligada à questão social. Essas separações, na verdade, são bastante artificiais, analíticas e estão todas ligadas umas às outras.

Portal PUC-Rio: Em sua análise, qual o benefício do debate dos candidatos para a população?

ER: É um momento de reflexão, de aprendizado, de civismo e de se interessar pela coisa pública. São aspectos muito importantes. É uma época para deixarmos nossas pequenas preocupações rotineiras para cuidarmos do país e da sociedade como um todo. É um momento, portanto, de elevação cívica. 

Portal PUC-Rio: Há 16 anos, desde o governo de Fernando Henrique, verifica-se uma polarização entre o PT e o PSDB na Presidência. Em sua análise, essa polarização vai permanecer?

ER: As pautas elaboradas por ambos os partidos não são tão divergentes. A política econômica do governo Lula, por exemplo, foi parecida com a do governo FHC. As preocupações sociais do governo de Fernando Henrique Cardoso foram mais desenvolvidas na administração de Lula. As disputas, então, são mais políticas do que programáticas. O problema do PSDB é que o partido se afastou dos movimentos sociais e o do PT é que, se não tomar cuidado, pode ficar prisioneiro desses movimentos. Mas, sem as manifestações sociais, é difícil governar um país como o Brasil. Historicamente, a Revolução de 1930 foi um movimento contra São Paulo. O estado tinha indicado pela segunda vez consecutiva um candidato à Presidência da República [Júlio Prestes foi eleito, em 1930, mas não chegou a tomar posse. Antes fora Washington Luís, entre 1926 e 1930]. Houve uma reação que desencadeou a Revolução de 1930. No ciclo de desenvolvimento varguista, São Paulo teve uma importância muito pequena. Com o fim desse ciclo iniciado na Revolução de 1930 e que foi até os anos 1970, 1980, São Paulo voltou a ter enorme importância. Tanto o PT quanto o PSDB são partidos essencialmente paulistas. Os dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso somado aos dois de Lula contabilizam 16 anos de hegemonia paulista.

  Stéphanie Saramago

Portal PUC-Rio: Quais os fatores positivos e negativos dessa polarização

ER: Política é polarização, concorrência e competição, esses são os fatores positivos. Se não existisse polarização teríamos uma ditadura. Deve haver competição e divisão para a sociedade escolher os melhores candidatos. Do ponto de vista negativo, pode-se esperar que essa polarização mobilize recursos não aceitos de dossiês, de baixarias e de hipocrisias.

Portal PUC-Rio: Como o senhor analisa o voto obrigatório? É importante para a sociedade ou o voto facultativo é melhor?

ER: Sou a favor do voto obrigatório. É uma contrapartida que se exige do cidadão para que ele vá às urnas no dia e faça obrigatoriamente a escolha do candidato que julgue melhor para administrar, dirigir e governar o país.